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Brasil

‘Ele saiu para comprar pão’, diz mulher cujo marido foi morto no Jacarezinho

Morador do Jacarezinho, Jorge Jonas era pai de uma criança de 7 anos e de um bebê de um mês

Redação Jornal de Brasília

07/05/2021 17h26

Ação policial no Jacarezinho deixa rastro de sangue. Foto: Mauro Pimentel/ AFP

Igor Soares e Júlia Barbon
Rio de Janeiro, RJ

A mulher de um dos 25 mortos nesta quinta-feira (6) na operação mais letal do Rio de Janeiro, na comunidade do Jacarezinho, na zona norte carioca, afirma que seu marido havia saído para comprar pão quando foi baleado e, depois, morto.

A esposa de Jorge Jonas do Carmo do Santos, 31, que pediu para não ser identificada por medo de represálias, estava no IML (Instituto Médico Legal) na manhã desta sexta (7) para identificar o corpo. Segundo ela, moradores viram ele sendo alvejado.

“Ele saiu para comprar pão. Os vizinhos viram ele no beco com um tiro na perna e gritando ‘ai, ai’, quando os policiais chegaram perto e atiraram nele outra vez”, disse ela à Folha.

Morador do Jacarezinho, Jorge Jonas era pai de uma criança de 7 anos e de um bebê de um mês. Sua mulher diz que ele cumpria pena, sem especificar por que, e estava respondendo em liberdade —por isso usava uma tornozeleira eletrônica, que afirma ter sumido quando viu o corpo no hospital.

Ele ficou preso por três anos e, atualmente, trabalhava como assistente de pedreiro, cumprindo a obrigação de ir à Justiça todo mês. Ele não está entre os 21 suspeitos que constam na investigação e na denúncia que motivaram a operação.

“Meu marido estava consertando a casa em que nós morávamos para podermos alugar”, conta a mulher, que ressalta que Jonas era querido na favela: “Todo mundo gostava do meu marido. Ele era um bom pai, uma pessoa maravilhosa”. Próximo ao Dia das Mães, ela diz que será uma data triste. “Eu estava agradecendo a Deus pela família que o Senhor me deu.”

Moradores dizem que pode haver mais do que as 24 mortes de civis contabilizadas oficialmente. Os corpos só terminaram de chegar ao IML na tarde desta sexta. A Comissão de Direitos Humanos da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) divulgou uma lista com 16 nomes, com idades de 18 a 43 anos.

Questionada sobre as identidades, a Polícia Civil afirmou apenas que o laudo da inteligência “indica que os 18 primeiros mortos identificados tinham antecedentes criminais. A ficha e as identificações de cada um serão apresentadas após exames de perícia e necropsia”.

Entre as outras famílias que aguardavam a liberação estava Taynara Paes, 22, mulher de Rômulo Oliveira Lucio, 29. Ela afirmou que o marido estava em uma casa com ela quando a polícia chegou, e que ele não reagiu e foi morto a facadas.

“Ele estava em casa comigo, a moradora abriu a porta, ele se rendeu. A polícia entrou, pegou ele e rodou com ele no morro. Ele foi estraçalhado a facadas, com faca na cara. Se é operação, eles tinham que levar ele preso. Ninguém merecia isso”, disse ela.

Taynara contou que Rômulo também ia ao fórum todo mês porque cumpria pena. “Moro no Jacaré há quatro anos. Eles nunca vêm para prender. Eles mataram mais de 25 pessoas”, criticou.

Rômulo é alvo da denúncia do Ministério Público como “soldado” do tráfico e aparece armado em fotos publicadas nas redes sociais em outubro e novembro de 2020. A denúncia que motivou os mandados de prisão a serem cumpridos na operação não menciona homicídios, aliciamento de menores e sequestros de trens, conforme divulgado pela polícia.

Abalada, a mãe de Marlon Santana, 23, outro jovem morto, também afirmou que o filho havia se rendido: “Nenhuma mãe cria filho para ser bandido. Quando meu filho foi se entregar, eles mataram ele no Beco do Caboclo. Isso não foi operação, foi assassinato. Operação não é assim. Podiam ter levado preso.”

A mulher, que não quis se identificar, diz ter ouvido dos policiais que o número de mortos ainda era pouco. “Ia ter mais mãe chorando ainda. Tinha quatro coagidos, eu fiquei esperando no beco o meu filho sair e ele não saiu. Essas mães todas chorando aqui… vai ficar impune?”, questionou. “Tiraram um pedaço da gente. O Dia das Mães acabou.”

A Polícia Civil negou, em entrevista coletiva nesta quinta, que tenha havido execuções e disse que a operação aconteceu dentro da legalidade, mas não esclareceu a dinâmica das mortes. A Defensoria Pública e a Comissão de Direitos Humanos da OAB dizem que locais onde as mortes ocorreram foram desfeitos antes da realização da perícia.

As informações são da FolhaPress

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