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Política & Poder

Número de negros em assembleias legislativas aumenta; dados oficiais são contestados

Na eleição de 2022, o Rio Grande do Sul foi o que mais avançou proporcionalmente, quintuplicando o número de um para cinco

FolhaPress

06/10/2022 13h52

Tayguara Ribeiro, Júlia Barbon e Cristiano Martins
Rio de Janeiro, RJ e São Paulo, SP

As Assembleias Legislativas do país terão o maior número de deputados que se autodeclaram negros.
Foram eleitos neste pleito 376 candidatos que afirmam ser pardos (315) ou pretos (61). O número é superior aos 305 da eleição passada e aos 281 de 2014, quando a declaração racial passou a ser coletada.

Entretanto, como a identificação racial ocorre por autodeclaração e muitas vezes ela é feita pelo partido, sem a atuação direta do candidato, os dados oficiais deixam margem para erros e irregularidades. Houve casos de contestações de rivais e eleitores ao longo da disputa.
“A questão da autodeclaração racial acaba sendo um ponto importante, dado que, com os incentivos institucionais adotados para dar mais competitividade às candidaturas de negros, pode ter aumentado o já alto número de mudanças na autodeclaração”, afirma Antônio Fernandes, mestre em ciência política pela Universidade Federal de Pernambuco.

“Pode ser um aumento bem menor do que parece.”

Para o cálculo, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) considera candidaturas negras aquelas registradas pelos postulantes autodeclarados como pretos ou pardos.

Parte dos eleitos teve sua declaração racial contestada por rivais e eleitores. A avaliação é que eles teriam dificuldade de passar por uma banca de heteroidentificação, como as que avaliam se uma pessoa pode se inscrever como cotista num vestibular.

Em 2014, quando o dado passou a ser computado, essa fatia conquistou 27% das cadeiras em disputa. O índice subiu para 29% em 2018 e saltou para 36% agora, quando passaram a valer as ações afirmativas.

Uma emenda à Constituição determinou que, até 2030, os votos dados a pessoas negras na disputa para a Câmara Federal deverão ser contados em dobro para a distribuição dos fundos partidário e eleitoral.
Em agosto, reportagem da Folha mostrou que 42 deputados federais eleitos como brancos em 2018 mudaram o registro para preto ou pardo antes das eleições. Destes, 19 conseguiram se reeleger, aumentando a conta de parlamentares autodeclarados negros no Legislativo.

Mesmo considerando o número provavelmente inflado, a representatividade segue baixa, já que pessoas negras são mais da metade da população brasileira (56%), segundo o IBGE. Só dois indígenas e um amarelo foram escolhidos em todo o país. Os outros 679 deputados estaduais são brancos.

“A continuidade de uma baixa presença da população negra na política evidencia os limites da democracia eleitoral brasileira. No entanto, existem limites para a interpretação desses dados devido à autodeclaração racial”, diz Carlos Machado, professor do Instituto de Ciência Política da UnB (Universidade de Brasília).

Considerando os dados oficiais, há diversidade maior nas Assembleias Legislativas do que no Congresso, no qual apenas 26% dos 513 deputados e 22% dos senadores eleitos neste ano se declaram negros.

Os partidos que elegeram mais candidatos não brancos nos estados, em números absolutos, foram PT (45), PL (43) e União Brasil (40). Proporcionalmente, porém, passam na frente PC do B, PMB, PSOL e Avante, com mais da metade de suas novas bancadas pardas ou pretas.

O mais votado, considerando o ranking nacional, foi a candidatura coletiva Bancada Feminista (PSOL), que recebeu 259.771 votos contabilizados no nome de Paula Nunes em São Paulo.

Em seguida aparece o também paulista Milton Leite Filho (União Brasil), filho do atual presidente da Câmara de Vereadores da capital paulista, com 198.429 votos. Depois, o pastor Júnior Tércio (PP-PE).

Os dados apontam ainda uma relação entre gênero e cor: 36% dos candidatos autodeclarados negros eleitos são mulheres, acima dos 18% de mulheres entre todos os eleitos no país. Nove dos 27 estados terão em 2023 a maioria ou a metade de suas cadeiras preenchida por pardos ou pretos, todos no Norte ou no Nordeste -em 2018 foram cinco. Destacam-se Tocantins, Piauí, Acre e Amazonas, acima dos 60%.

Em seguida vem a Bahia, com a maior ampliação em números absolutos, de 28 para 39 do total de 63 deputados. Por outro lado, os três estados do Sul ocupam o final do ranking, com menos de 10% de suas Casas compostas por não brancos. Santa Catarina é o único que não terá nenhum negro em seu plenário.

Na última eleição elegeu apenas um, de acordo com os dados oficiais. Entretanto, reportagem da Folha de S.Paulo publicada em julho revelou que esse único deputado estadual registrado como negro na assembleia catarinense, em 2018, é, na verdade, branco, como admite o próprio parlamentar.

Na eleição de 2022, o Rio Grande do Sul foi o que mais avançou proporcionalmente, quintuplicando o número de um para cinco. Depois, vêm Pernambuco, que passou de 7 para 17, e São Paulo, de 10 para 18.

No outro extremo, os que registram as maiores quedas foram, além do cenário em Santa Catarina, Mato Grosso do Sul, com diminuição de 5 para 3, e Sergipe, de 12 para 10.

Carlos Machado avalia que, apesar da importância de pensar mecanismos para a representação da população não branca, é crucial focar esforços para aprimorar o que já existe. “A anistia dada a si mesmos pelos partidos quanto ao não cumprimento da distribuição de recursos por recorte racial é absurda.”

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