José Marques
O ministro André Mendonça, do STF (Supremo Tribunal Federal), interrompeu nesta quarta-feira (6) o julgamento de duas ações da chamada “pauta ambiental” que questionavam omissões do governo Jair Bolsonaro (PL) no combate ao desmatamento da Amazônia.
Mendonça é ex-AGU (advogado-geral da União) e ex-ministro da Justiça de Bolsonaro e foi indicado pelo presidente para a corte no ano passado.
Desde a semana passada, o tribunal julga 2 das 7 ações da chamada “pauta ambiental”, vista como uma reação do Supremo ao que especialistas apontam como um desmonte de políticas públicas na gestão Jair Bolsonaro, em especial as relacionadas à Amazônia.
Após um longo voto da relatora dos processos, a ministra Cármen Lúcia, que tomou quase duas sessões do STF, Mendonça, que daria o voto seguinte, pediu vista (mais tempo para análise) e interrompeu o julgamento das ações.
Cármen Lúcia havia votado por determinar ao governo federal que apresentasse em 60 dias um plano de execução “efetiva e satisfatória” para a redução do desmatamento na Amazônia e o resguardo do direito dos indígenas que vivem na região.
Ela disse que o governo não tem praticado políticas públicas de fiscalização na Amazônia e que nas operações feitas não há “lavratura de autos, não há referência a áreas que precisam ser embargadas e não há bens apreendidos, se for o caso” –o que ela chamou de “engodo administrativo”.
O julgamento se iniciou no último dia 30 e continuou no dia 31, mas Cármen Lúcia terminou o seu voto apenas nesta quarta-feira.
A ministra afirmou que há um “estado de coisas inconstitucional” na política ambiental do país, instituto que permitiria ao Poder Judiciário estipular e acompanhar medidas aos demais Poderes em relação ao tema.
O estado de coisas inconstitucional já foi reconhecido pelo Supremo em uma ação julgada em 2015 que tratava da condição do sistema carcerário brasileiro. É um instituto no qual se reconhece, segundo o próprio STF, “uma situação de violação massiva e generalizada de direitos fundamentais que afeta um número amplo de pessoas”.
Em suas declarações em plenário nas sessões de julgamento, Cármen Lúcia fez seguidas críticas à condução da política ambiental pelo governo.
Chegou a mencionar uma fala do ministro Paulo Guedes (Economia) de que o Brasil é um “pequeno transgressor” ambiental e que “de vez em quando tem uma floresta que queima aqui e ali”. “A transgressão está confessada. A meu ver não tem muito o que discutir sobre esse tema”, afirmou a ministra do STF.
Também disse que o Brasil tem sofrido um quadro de “cupinização institucional”, que seria uma espécie de corrosão interna e invisível das instituições, sobretudo das que tratam do meio ambiente.
“O que são esses cupins? O cupim do autoritarismo, o cupim do populismo, o cupim de interesses pessoais, o cupim da ineficiência administrativa. Tudo isso ajuda a construir um quadro que faz com que não se tenha cumprimento objetivo garantido, de conteúdo, da matéria constitucional devidamente assegurada”, afirmou a ministra.
A pauta ambiental do STF sofreu resistência da Procuradoria-Geral da República. O procurador-geral Augusto Aras se manifestou de forma contrária a todos os processos -inclusive a um deles apresentado pela própria Procuradoria-Geral da República. A ministra disse que ficou surpresa com essa manifestação.
Uma das duas ações julgadas pelo Supremo pede que o governo federal execute fiscalização e controle ambiental “em níveis suficientes para o combate efetivo do desmatamento na Amazônia Legal e o consequente atingimento das metas climáticas brasileiras assumidas perante a comunidade global”.
Os autores também pedem que a União “efetive o plano específico de fortalecimento institucional do Ibama, do ICMBio e da Funai e outros a serem eventualmente indicados pelo Poder Executivo federal”. Essa foi apresentada por PDT, PT, PV, PSB, PC do B, Rede e PSOL.
Foi posta em julgamento, de forma simultânea, uma ação apresentada pela Rede que pede que seja declarada omissão inconstitucional de Bolsonaro.
Ainda solicita que seja executado integralmente o orçamento dos órgãos ambientais e a contratação de pessoal para fiscalização ambiental na Amazônia, além de apresentação de um plano de contingenciamento para reduzir o desmatamento aos níveis encontrados em 2011 ou menores.