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O inferno russo vivido por uma enfermeira ucraniana, cuja filha ‘seria enviada para um orfanato’

A jovem contou sua difícil experiência na infame prisão de Olevnika, localizada no território separatista pró-Rússia ao leste da Ucrânia

Redação Jornal de Brasília

25/10/2022 15h41

Foto: AFP

A enfermeira ucraniana Viktoria Obidina passou cinco meses em cativeiro, obrigada a beber água não potável enquanto suportava fome e espancamentos. Entretanto, seu maior tormento era não saber o que aconteceria com sua filha de quatro anos.

“Nos traziam água de um lago, às vezes com peixes. Em agosto, quando o lago começava a florescer, a água tinha gosto de algas”, conta Viktoria, que retornou em meados de outubro à Ucrânia por conta de uma recente troca de prisioneiros.

Em uma entrevista à AFP na segunda-feira (24), a jovem de 26 anos contou sua difícil experiência na infame prisão de Olevnika, localizada no território separatista pró-Rússia ao leste da Ucrânia.

Quando a Rússia começou a ofensiva no dia 24 de fevereiro, a enfermeira militar Viktoria foi enviada de Mariupol para Azovstal, um enorme complexo industrial onde centenas de soldados ucranianos resistiam ao cerco subterrâneo.

A filha de Viktoria, Alissa, ficou no apartamento da família com uma babá. Mas, quando os suprimentos de comida começaram a acabar e os bombardeios russos se tornaram constantes, decidiu levá-la para Azovstal. 

No subsolo, a menina ajudava sua mãe. “Era tão madura! Ela sabia muito bem que eu não deveria me distrair. Me ajudava, dava os remédios. Eu a dizia quais e para quem”, disse Viktoria.

“Eu entendi muito bem: se não estivéssemos lá, quem atenderia os feridos?”, completa a enfermeira. 

Também houveram momentos de desespero. “Me perguntava: ‘mamãe, é nosso último dia?’. Eu lhe dizia que claro que não, que íamos viver, que tudo ficaria bem. Mas os bombardeios eram constantes, estávamos aterrorizadas”.

Foi em um desses momentos que um soldado de Azovstal gravou um curto vídeo em que Alissa se esconde no bunker e pede para voltar para casa, com um livro nas mãos.

O vídeo deu a volta ao mundo e ajudou a pressionar os russos para que evacuassem os civis da siderúrgica. Todavia, também selou o destino de Viktoria.

“Ela está esperando para me ver”

Em maio, Viktoria e sua filha saíram de Azovstal com outros civis graças à uma evacuação da ONU. No entanto, as forças russas reconheceram as duas devido ao vídeo e a mãe foi detida. Antes de ser levada, ela conseguiu deixar Alissa com outro evacuado.

“Me disseram que ela seria enviada para um orfanato e que eu era prisioneira”, lembra a mãe, que acusa os investigadores russos de agressão e de tê-la forçado a revelar informações sobre o exército ucraniano.

Na prisão de Olevnika, ela foi trancada com cerca de vinte pessoas em uma cela feita para seis. Durante todo o tempo presa, não teve nenhuma notícia de sua filha nem ideia do que iria acontecer com ela.

Viktoria e outras prisioneiras foram transferidas em outubro para a cidade russa de Tanganrog, onde pensou que iria para outra prisão. Com mãos atadas e olhos vendados, foram colocadas em um avião.

Finalmente, foram levadas de ônibus para o território ucraniano e Viktoria entendeu que se tratava de uma troca de prisioneiros. Ela também sabia que sua filha estava salva.

Com ajuda de familiares e voluntários, Alissa, que completou cinco anos este mês, conseguiu se encontrar com a avó na Polônia.

A prisioneira perdeu 10 quilos durante o confinamento e está sendo tratada em uma clínica de reabilitação psicológica em Dnipro, centro da Ucrânia. Ela planeja deixar o exército e se dedicar à filha.

Na Polônia, Alissa frequenta o jardim de infância e aprende polonês. Mãe e filha conseguiram se falar por ligação.

“Ela cresceu tanto”, disse Viktoria. “Disse que sentiu muito a minha falta e que ela está esperando para me ver”.

© Agence France-Presse

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