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Brasília

Território sem lei: ciclistas temem pela vida na BR-251/DF

Atletas apontam o excesso de velocidade e ultrapassagens agressivas como potenciais causas de tragédia iminente

Redação Jornal de Brasília

06/03/2023 15h41

Foto: Divulgação

Afonso Ventania
[email protected]

O trânsito no DF não é amigo do ciclista. Quem revela essa trágica realidade não é apenas quem pedala pelas vias da capital federal, mas as estatísticas. Só em 2022, de acordo com números divulgados pelo Departamento de Trânsito (Detran/DF), 20 ciclistas foram atropelados e mortos. A esmagadora maioria das vítimas era do sexo masculino.

Assustados com esse cenário, ciclistas e triatletas que pedalam na BR-251/DF (que liga a Epia Sul à DF 001, no trecho próximo à Penitenciária da Papuda), recém revitalizada, denunciam negligência por parte do Estado em relação à segurança de quem usa a rodovia para treinamentos. A rodovia, conhecida como “área alfa” fica em uma área militar, da Marinha do Brasil, e está sob a jurisdição do Departamento Nacional de Infraestrutura e Transporte (DNIT), órgão federal responsável pela manutenção, ampliação, construção, fiscalização e elaboração de estudos técnicos nos modais rodoviário, ferroviário e hidroviário.

De acordo com os atletas, o asfalto novo é de excelente qualidade e privilegia a prática do ciclismo, mas também atrai maior tráfego de veículos pesados e convida o motorista “a pisar no acelerador sem dó”. Segundo eles, o agravante é que não há qualquer placa de sinalização vertical ao longo de toda a rodovia, muito menos de radares e mobiliário viário (como sonorizadores) para garantir a manutenção da velocidade regulamentada. Aliás, nem sequer há placas mostrando aos motoristas o limite de velocidade permitido! Ou seja, a rodovia se tornou um “autorama” a céu aberto, um território sem lei.

O bikerrepórter do Jornal de Brasília, Afonso Ventania, acompanhou o treinamento dos ciclistas e registrou cenas que comprovam as reclamações.

Luciano Linhares participa de competições locais e nacionais de ciclismo há 25 anos e gravou o momento em que quase foi atropelado na semana passada por um caminhão enquanto treinava na BR 251/DF. “Em um dos trechos sem acostamento, o caminhão passou muito perto. Tive sorte. Tinha espaço para o motorista manter uma distância segura de mim, mas fez questão de tirar uma fina”, conta.

O excesso de velocidade é a maior causa de óbitos nas vias e rodovias que cortam o DF. Logo em seguida aparecem a alcoolemia (direção sob efeito de álcool) e o uso de celular, apontam os órgãos de trânsito. O Código de Trânsito Brasileiro (CTB) considera a bicicleta como um veículo, igual ao carro, caminhão, motocicleta e ônibus. E, conforme a lei federal, o dever do maior é cuidar do menor. Mas, na prática, não é o que se vê ao transitar na BR-251/DF.

Em muitos trechos, o acostamento acaba e a rodovia se torna mão única. Logo mais à frente, ganha mais uma faixa. Depois, volta a ser mão única. E nada disso é avisado ao motorista ou ao ciclista porque não há qualquer tipo de sinalização vertical. Os condutores de veículos motorizados ficam confusos e, sem orientação, ou fiscalização, ameaçam a vida dos ciclistas.

O campeão mundial de Triathlon Militar, Ivan Lugon, costuma usar a rodovia para os seus treinos pelo menos três vezes na semana, apesar dos riscos. “O asfalto ficou bom, mas o pessoal não tá respeitando o ciclista. Frequentemente os caminhões tiram fina e carros buzinam quando estão muito próximos. É assustador”, lamenta o bombeiro militar.

Para a nutricionista Adriana Passos, que pedala na região apenas aos finais de semana, é imprescindível a instalação de placas indicando a presença de ciclistas ao longo de toda a estrada. “A alta velocidade também coloca a nossa segurança em risco”, completa.

Em nota, o DNIT informa que, em 2021, “contratou empresa para executar revitalização do pavimento em duas etapas, das quais a segunda foi concluída no final de 2022. A autarquia privilegiou a utilização do pavimento com faixa adicional em 4 quilômetros da rodovia para facilitar ultrapassagens e reduzir riscos de colisões frontais”.

O órgão acrescenta que já contratou empresa “para efetuar melhorias na sinalização vertical (placas e pórtico) da BR-251/DF, serviços que serão efetuados até o final do primeiro semestre de 2023”. Ou seja, o Estado poderá ser responsabilizado se acontecer uma tragédia no local até a instalação das placas de sinalização?

Presidente do Instituto de Segurança no Trânsito (IST), David Duarte Lima, destaca que o Art. 88 do CTB é taxativo ao determinar que “nenhuma via pavimentada poderá ser entregue após sua construção, ou reaberta ao trânsito após a realização de obras ou de manutenção, enquanto não estiver devidamente sinalizada, vertical e horizontalmente, de forma a garantir as condições adequadas de segurança na circulação”.

Um dos maiores especialistas do mundo em trânsito e mobilidade urbana , o professor David Duarte lamenta que “o Estado faz a lei e ele próprio desobedece”.

“Uma via sem sinalização tem dois grandes problemas; o primeiro é que os condutores não sabem a velocidade de segurança a ser praticada, onde há situações de maior ou menor risco, onde é permitido virar á esquerda ou à direita. O segundo ponto é que se o condutor é mal informado ele fica muito mais sujeito a se envolver em colisões e outros sinistros de trânsito”, completa.

Indagado pela reportagem sobre se há algum planejamento para a construção de ciclovia ao longo da estrada para atender moradores dos condomínios da região, ou a instalação de radares e outros equipamentos viários para a redução da velocidade, o DNIT não respondeu à essas questões.

Infrações e regras

· É infração de trânsito gravíssima dirigir ameaçando veículos como bicicletas. O condutor está sujeito a multa, suspensão do direito de dirigir, retenção do veículo e recolhimento do documento de habilitação (art. 170 do CTB).

· É infração grave deixar de reduzir a velocidade do veículo de forma compatível com a segurança do trânsito ao ultrapassar ciclistas (art. 220, inciso XII, do CTB)

· É infração média deixar de guardar distância lateral de um metro e meio (1,5m) ao ultrapassar a bicicleta (art. 201 do CTB).

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