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Fala, Torcida
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Medida Provisória das apostas esportivas é ineficaz

Fazenda proibiu pessoas com qualquer influência em jogos de apostarem. Toda fraude recente, no entanto, não foi exclusivamente arquitetada por jogadores. Ou seja, nada muda

Thiago Henrique de Morais

28/07/2023 5h00

Semanas atrás, trouxe um posicionamento sobre as apostas esportivas de que era necessário retirar alguns mercados das casas de apostas, como os escanteios e cartões, principais alvos da operação Penalidade Máxima, deflagrada pelo Ministério Público de Goiás. Mas após me inteirar sobre o assunto, mudei de opinião. Não é tão simples assim, pois isso poderia abrir precedentes para outros tipos de fraudes, como àqueles da Máfia da Loterias Esportivas, da década de 1980.

Naquela ocasião, houve um grande escândalo que envolveu 125 pessoas, entre árbitros, dirigentes esportivos e jogadores, entre eles os campeões mundiais pela seleção brasileira Amarildo e Marco Antônio. É bem verdade que apenas 20 deles foram indiciados, em função da dificuldade da época em encontrar provas. Se em 1982 era fácil aliciar os membros do desporto imagine agora, em que a comunicação está muito mais avançada?! Manipular resultados na atual conjuntura é muito mais simples.

Aproveitando essa onda da Operação Penalidade Máxima, o Ministério da Fazenda achou que deu o primeiro passo para buscar evitar manipulações. Na última terça-feira (25), a pasta editou uma Medida Provisória (MP) com algumas proibições, como a de impedir que pessoas que possam ter qualquer tipo de influência nos resultados dos jogos seja proibido de se cadastrar em casas de apostas, assim como seus cônjuges, companheiros e familiares. Acontece que o Executivo se esqueceu que toda a fraude recente não foi feita exclusivamente pelos jogadores, mas por aliciadores, que contratavam os atletas para manipular os cartões. Ou seja: não vai mudar em nada.

Algumas normas trazidas no texto, que ainda será apreciado pelo Congresso Nacional, são mais categóricas contra as casas de apostas em si do que necessariamente contra aqueles que fazem a sua “fezinha”. As “bets” serão taxadas em 18% sobre a receita de todos os jogos após o pagamento dos prêmios aos jogadores e o imposto de renda sobre a premiação, o que pode gerar ao Tesouro até R$ 12 bilhões a longo prazo. O único “prejuízo” ao apostador é de que se ele não tirar o prêmio ganho em até 90 dias, ele será revertido para o Financiamento Estudantil (Fies), até 2028, sendo transferidos, após esse prazo, para o Tesouro Nacional. Isto é, mais uma forma de arrecadação; nada que impeça a manipulação de resultados.

É provável que a ideia do Executivo seja mitigar a entrada de casas de apostas em solo brasileiro ou coibir de que empresas nacionais tenham o direito de criar as suas próprias “bets”. Mas vale lembrar que boa parte dessas casas de apostas possuem o seu escritório físico em Gibraltar, Malta, Curaçao, Grécia… o que talvez possa ser realizado é impedir que os brasileiros acessem esse tipo de conteúdo de forma direta. Mas quem tem um conhecimento razoável de internet sabe burlar esse tipo de entrada, através de uma Rede Privada Virtual (a famosa VPN), por exemplo.

Outra hipótese é diminuir a ilusão ao cidadão de que ele vai conseguir dinheiro de forma fácil e rápida – outro ponto trazido pela própria MP, que obriga as empresas a conscientizarem os apostadores sobre os riscos de perdas, que são muito maiores do que se imagina. Se for analisar friamente, este é o único ponto positivo da Medida Provisória editada pelo Executivo Federal.

É sempre bom lembrar que, sim, algumas pessoas lucram no ramo de apostas esportivas, usando o que eles chamam de gestão de banca: eles não apostam em qualquer jogo e sempre buscam em seus trabalhos um método de análise. Um modo conhecido é o punter, em que as apostas são feitas antes da partida inicial, não fazendo qualquer movimentação durante o jogo. Outra técnica é a trade, parecida com o que é feito com nas bolsas de valores, onde o apostador analisa o mercado e faz suas movimentações no momento dos jogos.

São poucos que possuem métodos, é verdade. Alguns agem de maneira correta, fazendo os seus saques de forma constante em função dos ganhos. Outros, entretanto, usam esses próprios lucros para ampliar a banca em questão. Ou seja, ter de sacar o valor conquistado dentro de 90 dias pode causar um prejuízo – ainda que o apostador faça um novo depósito com o mesmo valor depois, “burlando” esse sistema criado pela MP.

A Medida Provisória, da forma que foi apresentada ao Congresso Nacional, não impedirá, em nada, futuras manipulações de resultado. Foi apenas um oportunismo por parte do Governo Federal para taxar as empresas. Além disso, os poucos cidadãos que lucram entre as milhões de contas cadastradas nas casas de apostas também ficaram ao léu, sem saber qual a forma correta de se pagar o imposto sobre os seus ganhos. Veremos as cenas dos próximos capítulos após o recesso parlamentar. Há muito a ser feito, pois do jeito que está, pouco mudará.

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