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Torcida

Cabeça erguida; Brasil no topo

Jesus provou que o time que treina, realmente, não abaixa a cabeça nem encosta a bunda na parede para enfrentar os melhores do mundo

Petronilo Santa Cruz de Oliveira Neto

23/12/2019 14h55

Entrelinhas 

Por Olavo David Neto e Petronilo Oliveira 

Na penúltima coluna de 2019, como não falar de quem dominou o ano? Numa final digna da disputa de 1981, o Flamengo sucumbiu ao poderio inglês no início da prorrogação. Apesar de perder o título, ganhou moral internacional. Ridicularizado por afirmar, há meses, que o plantel rubro-negro disputaria bem uma Liga Inglesa, Jesus provou que o time que treina, realmente, não abaixa a cabeça nem encosta a bunda na parede para enfrentar os melhores do mundo. Nas águas, destaque para o potiguar Ítalo Ferreira, campeão de surfe.

Glória na derrota

Houve, claro, muita repercussão após a vitória do Liverpool sobre o Flamengo no último sábado (21). Com gol de brasileiro na prorrogação, os reds ergueram a primeira taça mundial de sua bela história, depois de três tentativas fracassadas e duas desistências. E não veio fácil, viu? Quem esperava um baile europeu viu um rubro-negro aguerrido, que se propôs a propor jogo, mesmo sabendo da imensa qualidade adversária. De igual para igual, o Urubu conquistou mais que um vice: caiu de cabeça erguida, altivo, com a consciência de quem foi melhor na partida e perdeu o título num detalhe. Mofar do rival é normal no futebol, mas todos os secadores sentiram um certo frio na barriga com a postura flamenguista. 

Escolhas óbvias…

Bob Firmino foi eleito pela Fifa o Melhor Jogador da Final do Mundial de Clubes. Além de comprovar alguns argumentos de que esses prêmios se guiam pelo resultado, por bola na rede, foi uma baita injustiça com um atleta que merecia demais o troféu. Quieto, sem holofotes a não ser a basta cabeleira, Willian Arão dominou a meia cancha e foi o principal responsável pela gloriosa partida disputada pelo rubro-negro – talvez a melhor, justo na mais exigente da temporada. Sereno, desarmou seguidas vezes a constelação vermelha e ligava o ataque com precisão. Às costas, o 5 quase se desgrudou, pois Arão jogou como 8, que no futebol atual é quase um 10. 

…Ou por merecimento 

É muito bonito ver o desenvolvimento profissional do atleta. Surgido para o futebol brasileiro em 2015, pelo rival Botafogo, Arão disputou a Série B do Campeonato Brasileiro. Marcou sete gols em 58 jogos na temporada e virou referência do time de Renê Simões. No ano seguinte, seduziu-se pela proposta flamenguista num momento em que o clube montava esse elenco campeão de (quase, por pouco) tudo em 2019. Diego, por exemplo, chegou à Gávea na mesma leva, que também trouxe Cuéllar. Visto como “roceiro” e “bronco”, Arão conquistou espaço com o jeito que o fez vencer o prêmio de Melhor em Campo da Final do Mundial de Clubes da Entrelinhas. A menção honrosa é de Bruno Henrique, que infernizou o Liverpool pelos cantos do campo e por pouco não complicou a vida dos ingleses. 

Sem comparação

Carioca, Brasileiro e Libertadores. Se forçar, ainda entra uma Florida Cup – a Copa Mickey – na pré-temporada. Não existe ano semelhante na história do Flamengo (e, se bobear, de nenhum outro clube). Primeiro time a vencer o campeonato nacional e a Libertadores simultaneamente – pior que no caso do Flamengo foi quase ao mesmo tempo – desde o Santos de Pelé em 1962/62, o rubro-negro fez uma temporada digna de maratona em séries. Com um enredo maluco, que começou com um protagonista e, de repente, ganhou outro, que era quase um antagonista, ou vice-versa, e que virou a grande estrela da produção. Agora, cabe à direção fazer mais escolhas como a de Jorge Jesus para o comando do futebol. 

Rotatividade

Apesar de ter encontrado seu messias, o Flamengo apresentou um rotatividade na posição de comando do plantel. Foram 20 mudanças de técnico de 2013, ano do início da reconstrução do clube, até o final de 2019, numa média de 2,85 comandantes por temporada, conforme relação abaixo. Não há quem se sustente assim. Em 2015, foram cinco mudanças. Luxemburgo começou o ano no cargo, deixou a peteca com o auxiliar Deivid, que saiu para o outro auxiliar Jayme de Almeida, que foi substituído por Oswaldo de Oliveira. Para uma comparação justa, pegaremos o Grêmio de Renato, último brasileiro campeão da América antes do Fla e de a quem o rubro-negro destronou como melhor futebol do país. O treinador chegou ao tricolor em setembro de 2016 e assumiu o cargo de Roger Machado, que lá estava desde o início do ano. Desde então, renovações sucessivas com o ídolo gremista. 

2013 Dorival, Jorginho, Jayme e Mano

2014 Jayme, Ney e Luxa

2015 Luxa, Deivid, Jayme (2x), Cristóvão, Oswaldo

2016 Muricy e Zé Ricardo

2017 Zé Ricardo, Jayme e Rueda

2018 Paulo César Carpegiani, Barbieri e Dorival 

2019 Abel e Jesus. 

Olhar

O que mais surpreende na temporada do Flamengo são os estilos completamente diferentes de treinadores contratados. Já com um plantel recheado nas mãos, o clube contratou Abel Braga com pompa no início do ano, e já no final do semestre queria se ver livre do veterano. De um treinador voltado a resultado, pragmático, mais no estilo “pai”, o clube pulou para Jorge Jesus, de certa inclinação a manager, afeto do futebol-total. Caso se confirmem os rumores e o messias deixe a Gávea, é ainda mais preocupante pensar no sucessor. 

Falando em comandante

Numa dança das cadeiras, Abelão assumiu o Vasco, que não conseguiu segurar Luxa, pescado pelo Palmeiras, que tentou Sampaoli, dissidente do Santos. Logo na sequência, o Peixe seguiu a migração flamenguista e negocia com o português Mircea Lucescu, tricampeão português com o Porto na última década. O Galo, sem Vagner Mancini desde o final do Brasileirão, tentou contato com o argentino, mas não chegou a um acerto e segue sem treinador para 2020. A corrida, por enquanto, será essa. No inflacionado mercado brasileiro, ganha quem conseguir tirar coelhos da cartola. 

Na crista

Bicampeão do mundo, Gabriel Medina vem perdendo espaço no imaginário brasileiro quando se trata de surfe. Primeiro, o atleta paulista “furou” uma onda na lendária Pipeline – e com instrução do padrasto para tal. Ficou feio, mas mesmo com a manobra desonesta ele avançou à final. Lá, porém, havia um potiguar sangue quente. Aos 25 anos, Ítalo Ferreira desbancou o favoritismo do adversário e faturou seu primeiro título mundial no esporte. Para mim, Olavo David Neto, é um orgulho da peste escrever sobre um conterrâneo que pôs o mundo sob os pés. Parabéns, boy!

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