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Política & Poder

Uso eleitoral da Lava Jato no 2º turno cria onda de autocrítica no Judiciário e no MP

A presença do ex-juiz Sérgio Moro na comitiva de Jair Bolsonaro (PL) levou ao estúdio da Band representou a volta do uso da Lava Jato

Redação Jornal de Brasília

25/10/2022 11h55

Foto: Agência Brasil

A presença do ex-juiz Sérgio Moro na comitiva que o presidente Jair Bolsonaro (PL) levou ao estúdio da Band no primeiro debate presidencial do 2º turno representou a volta do uso da Operação Lava Jato nas eleições, novamente contra o petista Luiz Inácio Lula da Silva. O movimento do ex-juiz, antes rompido com Bolsonaro, desencadeou insatisfação entre juízes e procuradores.

As críticas não ficaram restritas a alas garantistas e antigos críticos da Lava Jato, como se viu no passado. Nem aos apoiadores de Lula e do PT. Trata-se de uma onda de autocrítica entre membros da magistratura e do Ministério Público Federal que apoiaram a operação, e até mesmo atuaram em casos a ela conexos. Antigos colegas de Moro e Deltan Dallagnol passaram a defender quarentena para integrantes das carreiras jurídicas e até pedido de desculpas formal a Lula, em entrevista ao Estadão.

Eles não questionam a robustez das provas colhidas pela investigação do petrolão, que envolveu a devolução de bilhões por delatores e empresas. Estão insatisfeitos com os efeitos que a politização de agentes como Sérgio Moro e o ex-procurador Dallagnol, também eleito a deputado federal, podem ter nos autos de processos que deixaram para trás ao usar politicamente as investigações. A Lava Jato enfrenta uma série de anulações impostas pelo STF. O medo desse grupo é que esta atuação política provoque um estrago ainda maior e dê ensejo a questionamentos dos investigados.

Um deles é Anselmo Cordeiro Lopes, ex-coordenador da extinta força-tarefa Greenfield, que mirou escândalos de corrupção e desvios em fundos de pensão e na Caixa Econômica. Trata-se do último procurador a sustentar uma denúncia criminal contra Lula. Ela está na Operação Zelotes, em que o petista e seu filho são acusados de tráfico de influência e lavagem de dinheiro na operação de caças suecos. A ação está suspensa, e os outros dois procuradores que assinaram a denúncia foram declarados suspeitos pelo STF. A ação também está suspensa, mas não foi arquivada e permanece pendente de julgamento.

Ao contrário de Moro e Deltan, Anselmo não quer falar sobre os autos de seus processos. E afirma que o uso eleitoral das investigações é “inapropriado” e que a “falta de imparcialidade de Moro” acabou com a Lava Jato. “Quando Moro jogou a imagem de imparcialidade às favas, a credibilidade da Lava Jato e das instituições federais de combate à corrupção ruiu de forma irreversível – o dano ao legado da Lava Jato é permanente”, diz.

O procurador vai além: defende inclusive um pedido de desculpas da Justiça e do MPF. “Eu, se representasse a instituição, pediria desculpas sim, não só a Lula mas principalmente à população brasileira, em razão da influência política indevida gerada”. Anselmo entende que a Lava Jato de Curitiba cometeu excessos, em especial contra o ex-presidente, e diz agora acreditar que a atuação de Moro “hoje dá a impressão de que pode ter havido, por parte de alguns, o objetivo de excluir Lula das eleições de 2018?.

Ao Estadão, Anselmo afirma que, se Bolsonaro não for reeleito, não acredita que sofrerá os mesmos excessos caso investigado, porque entende que as instituições passaram por um aprendizado e vão agir com mais “prudência”. Sobre a situação atual de Lula, ele resume, em um trecho de João 8:10-11, que sua avó Lourdite sempre citava: “Mulher, onde estão aqueles teus acusadores? Ninguém te condenou? Nem eu te condeno; vai-te, e não peques mais”.

Paira no Ministério Público Federal, em especial, o descontentamento com o apoio aberto de Moro a Bolsonaro. A força-tarefa Operação Greenfield, conduzida por Anselmo, assim como a Lava Jato, foi extinta pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, indicado pelo presidente no fim de 2020. No lugar destes grupos, foram criados Gaecos do MPF, que não têm a mesma estrutura de servidores e procuradores, nem conferem aos seus integrantes atribuição exclusiva para conduzir grandes investigações. Anselmo prefere não comentar questões do MPF.

Fora deste movimento mais crítico a Moro, o procurador Regional da República Bruno Calabrich ressalta ao Estadão que a herança da Lava Jato não depende apenas do ex-juiz. E que a operação contou com centenas de servidores, técnicos, e outros procuradores, além de auditores da Receita Federal e da CGU.

Questionado novamente pelo Estadão sobre sua aliança com Bolsonaro, a quem acusou de interferir na PF, Moro diz “manter as divergências” com o presidente. “Serei um senador independente e defenderei medidas que ampliem a eficiência da Justiça e a autonomia dos órgãos de controle”.

“Por exemplo, um mandato fixo para o Diretor geral da PF para que só possa ser demitido em caso de má conduta. Para PGR, defendo que se siga a lista tríplice e assim me posicionarei em eventual sabatina no Senado de alguém indicado pelo Presidente”, afirma

Moro ainda diz que, quando juiz, “aplicou a lei”. “Desmantelamos o maior escândalo de corrupção da história. As decisões de anulações são erros judiciários e quem deve ser cobrado são as pessoas que as proferiram. Agora, como Senador eleito, me posiciono contra Lula e seu projeto de poder corrupto. São momentos históricos diferentes”.

Procurado, o ex-procurador Deltan Dallagnol não se manifestou.

Estadão Conteúdo

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