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Política & Poder

Prévias dão visibilidade ao PSDB, mas partido pode sair fraturado

Um projeto presidencial encabeçado pelo PSDB não conta com ampla concordância na sigla. Em parte por causa de profundas rixas internas

Redação Jornal de Brasília

19/11/2021 6h21

Em sua reta final, as primeiras prévias nacionais da história do PSDB para a escolha do seu candidato ao Palácio do Planalto cumpriram a missão de dar visibilidade ao partido no debate sobre a construção de uma terceira via na disputa presidencial em 2022, mas o processo interno ajudou também a esgarçar o ambiente já bastante tensionado da sigla. No radar de importantes líderes tucanos está o temor de que o partido saia fraturado da votação marcada para o próximo domingo.

Um projeto presidencial encabeçado pelo PSDB não conta com ampla concordância na sigla. Em parte por causa de profundas rixas internas e em parte por uma disputa por recursos para as futuras campanhas eleitorais.

Durante a última semana antes da votação, os governadores João Doria (SP) e Eduardo Leite (RS) se esforçaram para transparecer um clima de entendimento. Tomaram chimarrão no Palácio Piratini, em Porto Alegre, e foram mais cordiais durante o debate realizado pela CNN Brasil.

Nesta quinta-feira, 18, porém, Leite jogou farpas no correligionário paulista em uma entrevista convocada para negar que tenha pedido a Doria o adiamento do início da campanha da vacinação, em janeiro.

Os governadores paulista e gaúcho concorrem de fato à vaga de presidenciável tucano – Arthur Virgílio (AM), o outro nome na disputa, não tem chances. O vencedor das prévias terá de se deparar com uma questão central: a possibilidade de uma debandada de parlamentares tucanos, o que pode encolher a bancada federal do partido. Em conversas reservadas, quadros do PSDB calculam que até 15 dos 34 deputados federais podem deixar a legenda na janela de transferência partidária do ano que vem, período em que é permitido mudar de agremiação sem perder o mandato.

Esse processo é motivado por uma mistura de cálculos e predileções eleitorais locais, briga por recursos e ressentimentos políticos. Em Estados onde o bolsonarismo tem mais força, como Acre, Rondônia e Mato do Grosso do Sul, os tucanos locais teriam dificuldade em se eleger no campo da oposição. Mas há também o caso do grupo liderado pelos deputados mineiros Aécio Neves e Paulo Abi Ackel. Ambos são desafetos declarados de Doria e dificilmente ficarão no PSDB no caso de vitória do governador paulista.

“Eu não convoquei uma confraria, mas uma eleição. E eleição é disputa e passionalidade. Isso deixa marcas que levam tempo e exigem maturidade para que se reconfigure um processo de unidade plena. Vai depender da absoluta capacidade do líder escolhido no domingo de construir pontes. Não precisa ser do dia para a noite e nem numa semana. Há tempo”, disse ao Estadão o presidente nacional do PSDB, Bruno Araújo.

Questionado sobre uma possível debandada, Abi Ackel foi enigmático. “Ninguém sabe qual será o resultado das prévias e como o vencedor vai se posicionar. As prévias devem ser instrumento de inclusão e não de exclusão. Não faz sentido o partido sair menor desse processo.”

Os dois lados da disputa interna estão cientes dos possíveis efeitos. Na última terça-feira, o coordenador da pré-campanha de Doria, Wilson Pedroso, viajou a Porto Alegre para organizar a visita do governador paulista ao Rio Grande do Sul e aproveitou para tomar um café com o deputado federal Lucas Redecker (RS), que comanda a campanha de Eduardo Leite.

Na conversa, eles concordaram que é preciso fazer um gesto para unificar o partido depois das prévias. Combinaram um encontro de aproximação com a bancada com a presença dos dois governadores, independente de quem for o vencedor do pleito interno. A leitura de ambos é que será preciso recuperar o eleitor tucano que migrou para o bolsonarismo após as eleições de 2018, quando o PSDB registrou o pior resultado de sua história em uma eleição presidencial. “Apesar das caneladas, a gente criou relações com as prévias. Em São Paulo tivemos caneladas nas prévias (em 2016 e 2018), mas todo mundo saiu unido”, disse Pedroso.

O senador José Aníbal, que integra a comissão organizadora do processo, recorre uma frase do ex-vice-presidente da República Marco Maciel ao falar sobre a possibilidade de um racha pós-prévias: “As consequências vêm depois”, disse. “Seria um anticlímax se não houvesse unidade no dia seguinte.”

Contra o anticlímax, Virgílio aposta no fair play dos caciques tucanos. Para o ex-prefeito de Manaus, a maior parte da bancada federal começou a votar com o governo de Jair Bolsonaro porque não tinha perspectiva em relação ao próprio partido. “Espero que não tenha debandada. Tem que ser um compromisso de honra apoiar o perdedor”, afirmou.

Com apenas 44,7 mil tucanos aptos a votar no domingo em um universo de 1,3 milhão de filiados, o PSDB montou uma operação para sanar eventuais problemas com o aplicativo criado para a votação nas prévias. A executiva nacional montou um call center no diretório em Brasília com mais de 20 atendentes disponíveis para ajudar os tucanos que tiverem dificuldades com o aparato, que exige, entre outras coisas, uma dupla identificação facial.

O sistema, que é inédito no Brasil, foi motivo de polêmica e suspeitas nos bastidores da campanha. Há o temor de que o processo possa ser prejudicado pelo eventual mau funcionamento do aplicativo que foi criado pelo PSDB para que os filiados votem remotamente.

Após passar por diversas etapas de aperfeiçoamento, segundo a comissão de prévias, e até mesmo de uma simulação do processo de votação ontem, o app ainda desperta desconfiança em relação ao seu funcionamento e segurança. Diretórios mais organizados do partido tanto ligados a Leite quanto a Doria também vão oferecer suporte técnico.

O sistema é de difícil manuseio, o que, de acordo com a região do País, ainda pode ser intensificado pelo baixo sinal de internet. Na capital paulista, base de Doria, o diretório municipal montou 40 postos avançados onde os filiados terão acesso a tablets e internet.

A tecnologia não poderá resolver o atual ponto nevrálgico do PSDB. O partido que ganhou a fama de se acomodar no equilíbrio do muro acumulou ao longo dos anos significativas divisões internas. Qual será o papel das primárias num processo de conciliação ou ruptura é o que se verá nos próximos dias.

Estadão Conteúdo

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