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Política & Poder

Corregedor vira peça-chave na eleição e garante maioria em grupo de Moraes no TSE

Corregedor-geral da Justiça Eleitoral, o ministro Benedito Gonçalves, 68, se tornou peça-chave da eleição em decisões

FolhaPress

24/10/2022 9h03

Foto: Rafael Luz/STJ

JOSÉ MARQUES E MATEUS VARGAS
BRASÍLIA, DF

Corregedor-geral da Justiça Eleitoral, o ministro Benedito Gonçalves, 68, se tornou peça-chave da eleição por decisões que atingiram suposta rede de desinformação ligada ao presidente Jair Bolsonaro (PL) e limitaram ganhos políticos do chefe do Executivo com o uso da máquina pública.

Ele também compõe o grupo de quatro ministros, liderados pelo presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Alexandre de Moraes, que tem votado com mais frequência para derrubar fake news.

Gonçalves chegou a Brasília em 2008 por indicação do então presidente e agora candidato, Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O nome do corregedor foi indicado em 2003 pelo ministro da Justiça à época, Márcio Thomaz Bastos (morto em 2014), inicialmente para uma vaga aberta no STF (Supremo Tribunal Federal).

O atual corregedor do TSE era desembargador do TRF-2 (Tribunal Regional Federal da 2ª Região), do Rio de Janeiro. A intenção de Lula era indicar uma pessoa negra ao Supremo. A sugestão de Bastos foi preterida em benefício de Joaquim Barbosa, mas Gonçalves acabaria indicado ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) por Lula anos mais tarde. Em uma série de outras vezes voltou a figurar como candidato a uma vaga no Supremo.

No TSE, Gonçalves é tido como um nome definidor nas eleições deste ano ao derrubar uma série de conteúdos que, na leitura da corte, poderiam beneficiar principalmente e de forma irregular a campanha de Bolsonaro na disputa contra Lula.

Em um dos casos mais recentes, o corregedor mandou desmonetizar páginas do YouTube, além de vetar o lançamento antes das eleições de um documentário da produtora Brasil Paralelo. O vídeo levantaria tese distinta daquela encontrada pela PF (Polícia Federal) sobre a facada sofrida pelo chefe do Executivo.

O ministro disse que o “tema reiteradamente explorado” por Bolsonaro poderia “receber exponencial alcance sob roupagem de documentário”. A decisão de impedir o lançamento foi dada em ação apresentada pela coligação de Lula para desarticular suposta rede de fake news ligada a Bolsonaro.

Também foi de responsabilidade de Gonçalves a decisão de proibir o presidente de usar na sua propaganda eleitoral, em todos os meios, imagens feitas durante os eventos oficiais de 7 de Setembro.

Ele estabeleceu pena diária de R$ 10 mil em caso de descumprimento e a exclusão de trechos da transmissão na TV Brasil.

“O que se quer inibir ou mitigar é a produção de dividendos eleitorais decorrentes da exploração das comemorações oficiais do bicentenário da Independência pela campanha”, afirmou o corregedor nessa decisão.

Gonçalves ocupa desde setembro o cargo de corregedor-geral eleitoral, que tem entre as responsabilidades conduzir as chamadas Aijes (Ações de Investigação Judicial Eleitoral). Esses procedimentos apuram e punem atos que possam afetar a igualdade dos candidatos em uma eleição, como aqueles que envolvem o abuso de poder político e econômico.

Essas ações têm poder de cassar candidaturas e diplomas dos eleitos, quando há comprovado abuso de poder na eleição. Mas a tramitação é lenta, por isso os efeitos mais imediatos ocorrem nas decisões de interferir na propaganda eleitoral e nas redes sociais, por exemplo, para manter o equilíbrio do pleito.

O corregedor-geral ainda proibiu que a campanha à reeleição do presidente use em suas propagandas imagens captadas durante o discurso do mandatário na abertura da Assembleia-Geral da ONU.

Determinou, além disso, que Bolsonaro deixe de gravar e transmitir lives de cunho eleitoral no Palácio da Alvorada, sua residência oficial, e no Palácio do Planalto, sede do governo federal.

A decisão irritou Bolsonaro. “É quase um desrespeito com o chefe do Executivo, porque aqui é minha casa, enquanto for presidente da República”, disse ele, no último dia 9.

Na ação apresentada pela campanha de Lula sobre a suposta rede de fake news bolsonarista, o corregedor ainda intimou o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) a se manifestar sobre as acusações.

Em outro caso, o corregedor aceitou pedido da campanha de Bolsonaro para passar a investigar se o deputado federal André Janones (Avante-MG), um dos articuladores da campanha de Lula nas redes sociais.

“Sem perder de vista as condições de exercício legítimo da liberdade de opinião no contexto do pleito de 2022, é premente, em defesa na normalidade eleitoral, firmar balizas para o uso da internet por candidatos e apoiadores com vistas à redução da ‘desordem informacional’ nas eleições”, escreveu Gonçalves no despacho.

Gonçalves ocupa o grupo de ministros que forma maioria e tem vencido as discussões no TSE por 4 a 3. Além dele e de Moraes, os ministros Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia têm votado em conjunto nas ações sobre fake news.

Os ministros de posições opostas, que têm sido derrotados nos casos em que há divergência, têm explicitado que acabam tomando decisões seguindo esse entendimento mais duro formado pelo colegiado.

Com posição oposta, a ministra Maria Claudia Bucchianeri, por exemplo, tem repetido em votos que o plenário da corte firmou orientação de “atuação profilática da Justiça Eleitoral”, especialmente sobre qualquer tipo de comportamento “passível de ser enquadrado como desinformativo” e “flagrantemente ofensivo”.

O corregedor ainda cobrou explicações do ministro da Justiça, Anderson Torres, e do presidente Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), Alexandre Cordeiro, por causa de pedidos de investigações de instituto de pesquisas.

Em outro caso, Gonçalves afirmou que a auditoria divulgada pelo PL, partido de Bolsonaro, com questionamentos às urnas foge da fiscalização permitida do pleito, cita narrativas já derrotadas e tenta desacreditar o sistema eleitoral.

Ele acionou o MPE (Ministério Público Eleitoral) para avaliar se foram divulgadas informações sabidamente falsas para atingir o sistema eletrônico de votação. Ainda ressaltou no mesmo despacho que o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, também é responsável pelo documento.

Ao longo de sua carreira como ministro do STJ, Gonçalves passou por alguns desgastes. Para chegar ao tribunal, além do apoio de Thomaz Bastos, recebeu aval da bancada parlamentar do Rio de Janeiro e do então governador Sérgio Cabral, que mais tarde virou um dos principais alvos da Lava Jato e foi condenado em mais de 20 ações.

Em 2017, a Folha de S.Paulo mostrou que, na negociação de seu acordo de colaboração premiada, o ex-presidente da OAS Léo Pinheiro negociou mencionar dois ministros do STJ, entre eles Gonçalves.

Na fase de negociação do acordo, ele apontou o ministro como beneficiário de recursos. Gonçalves sempre negou as acusações.

O ministro apareceu ainda em um relatório da Polícia Federal devido à proximidade com Léo Pinheiro e são apontadas trocas de mensagens entre os dois.

A reportagem procurou o TSE e o STJ na manhã desta sexta-feira (21) para comentar o teor dessa reportagem, mas não recebeu resposta.

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