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Política & Poder

Bolsonaro diz que agiu para tirar vice da Câmara e reclama de interferência no Legislativo

Conforme revelou a Folha de S.Paulo no domingo (8), o PL pressionou o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), a retirar o amazonense

FolhaPress

12/05/2022 22h27

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Danielle Brant
Brasília, DF

O presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou nesta quinta-feira (12) que pediu a Valdemar Costa Neto, que comanda o PL, para retirar o deputado opositor Marcelo Ramos (PSD-AM) do cargo de vice-presidente da Câmara.

Conforme revelou a Folha de S.Paulo no domingo (8), o PL pressionou o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), a retirar o amazonense da vice-presidência da Casa e tentar emplacar um deputado da legenda no posto.

“Uma vez mudando de partido, tá no regimento interno que ele tem que sair da vice-presidência porque aquele cargo pertence ao partido. O deputado que saiu [Ramos] entrou na Justiça e caiu na mão de quem? Alexandre de Moraes”, continuou.

“Eu nunca vi uma interferência dessa forma junto ao Legislativo, um absurdo. Uma questão ‘interna corporis’. Não tem nada a ver com Justiça. O cidadão deputado deixou a Mesa [Diretora], foi para outro partido, ele perde a vaga na Mesa.”

Ramos trocou o PL pelo PSD depois de Bolsonaro entrar no partido comandado por Valdemar.

Desde abril, o PL articula para retirar Ramos da vice-presidência da Câmara. A pressão foi intensificada após as fortes críticas dele à edição de decretos que reduzem o IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) e afetam a zona franca de Manaus.

Ramos recorreu ao TSE (Tribunal Superior) eleitoral e conseguiu uma decisão favorável de Moraes. O ministro, considerado pelo Planalto um adversário, determinou que Lira deve se abster de acatar qualquer deliberação do PL que implique o afastamento ou substituição do deputado do Amazonas da Mesa Diretora.

Um recurso foi apresentado para tentar reverter a determinação.

O fato de Ramos ter levado a disputa pela vice da Câmara para o TSE, no entanto, praticamente enterrou as chances de uma saída negociada para a crise, na avaliação é de líderes partidários ouvidos pela Folha.
Lira estava tentando negociar uma solução para por fim ao impasse, consultando líderes partidários sobre o caso, de acordo com parlamentares que acompanharam essas gestões.

Segundo eles, foi aventado um acordo que envolveria uma nova composição na Mesa Diretora –Ramos ocuparia outro cargo e o PL ficaria com a vice. Além do amazonense, outras duas deputadas estão na mesma situação: Marília Arraes (PE), que trocou o PT pelo Solidariedade, e Rose Modesto (MS), que saiu do PSDB para a União Brasil.

Reservadamente, um dos líderes consultados criticou o recurso à Justiça e afirmou que Ramos tenta permanecer no cargo por meio de uma decisão judicial, colocando a Câmara em uma situação desconfortável.

Ao levar o caso à corte, Ramos, na avaliação desse líder, deu margem para uma interferência do Judiciário no Legislativo. O novo atrito potencial se dá em um contexto em que as relações entre o Legislativo e o Judiciário estão estremecidas com o episódio do bolsonarista Daniel Silveira (PTB-RJ) -o STF (Supremo Tribunal Federal) determinou a perda de mandato do deputado, mas Lira recorreu pedindo que a palavra final sobre cassações de parlamentares seja do Congresso.

Líderes da base endossam a argumentação de Lira sobre episódios do tipo: a questão é “interna corporis”, ou seja, deve ser resolvida pela própria Câmara. Conforme essa visão, o vice deveria ter negociado a solução internamente em vez de ter recorrido ao TSE.

Uma vez que isso ocorreu, a chance de diálogo acabou. A expectativa é de que Lira aplique o regimento interno da Câmara, que determina que, em caso de mudança de legenda partidária, o integrante da Mesa Diretora perde automaticamente o cargo que ocupa e a vaga é preenchida após nova eleição.

Isso representaria uma mudança em relação às regras adotadas atualmente pela Casa Legislativa. Em 2016, o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PTB-SP, na época MDB-RJ), em resposta a um questionamento sobre o tema, decidiu que o termo “legenda partidária” poderia ser interpretado de modo amplo como “partido ou bloco parlamentar”.

Ou seja, uma mudança de partido dentro de um mesmo bloco parlamentar não alteraria a representação proporcional da Mesa Diretora. Nesse sentido, como o PSD fazia parte do bloco de Lira, Ramos não seria afetado pela regra regimental.

A situação muda caso Lira adote novo entendimento e derrube a decisão tomada por Cunha em 2016.
Apesar desse cenário, há ainda quem avalie como baixa a possibilidade de troca na Mesa Diretora. Uma das razões apontadas é que, segundo Ramos e deputados aliados do amazonense, o PL havia renunciado ao cargo como parte do acordo envolvendo a desfiliação por justa causa do parlamentar.

Na carta de anuência enviada a Ramos em dezembro, uma semana depois de Bolsonaro se filiar ao PL, a legenda afirma ter decidido não utilizar as prerrogativas do artigo 26 da lei dos partidos. O dispositivo diz que “perde automaticamente a função ou cargo que exerça, na respectiva Casa Legislativa, em virtude da proporção partidária, o parlamentar que deixar o partido sob cuja legenda tenha sido eleito”.

Retirar o vice-presidente do posto, defendem aliados de Ramos, seria descumprir um acordo firmado em dezembro.

Em entrevista à Folha, Ramos afirmou que, ao se desfiliar do PL, Lira havia manifestado preocupação com a possibilidade de que ele pudesse perder o posto.

“Eu ponderei com ele que o PL havia renunciado expressamente ao direito de pedir o cargo. Quando isso acontece, o partido pode inclusive indicar um deputado do PSD para a vaga do PL. Foi o que o PL fez. O

PL não deixou de ter o direito do cargo, mas ele me indicou para o cargo que era do PL”, afirma o parlamentar.

Deputado federal de primeiro mandato, Marcelo Ramos, à época no PL, foi eleito vice-presidente da Câmara em fevereiro de 2021 com o voto de 396 colegas, na mesma chapa em que Arthur Lira se tornou presidente da Casa.

A decisão de Ramos de entrar com o pedido de liminar ocorreu após entrevistas de Coronel Menezes, aliado de Bolsonaro no Amazonas e pré-candidato ao Senado, em que ele disse que o partido queria tirar o parlamentar do cargo de vice-presidente da Câmara.

Apesar da decisão de Moraes, a avaliação da própria PGE (Procuradoria-Geral Eleitoral) é de que o assunto não compete ao TSE. Em parecer, a PGE afirmou que a Justiça Eleitoral não tem atribuição para analisar a pressão do PL para retirar Ramos da vice-presidência.

O vice-procurador-geral eleitoral, Paulo Gustavo Gonet Branco, designado para a função por Augusto Aras, argumentou ainda ser possível a destituição de Ramos do posto na Mesa Diretora em razão de ele ter trocado o PL pelo PSD.

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