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Europa isola Kaliningrado e abre nova frente na crise com a Rússia

Para os russos, é mais uma peça da disputa retórica em torno da Guerra da Ucrânia. Os trens embargados transportam produtos como material

FolhaPress

21/06/2022 16h56

Foto: Fraçois Lenoir

Igor Gielow
São Paulo, SP

Frente presumida em quase todos os cenários de uma Terceira Guerra Mundial entre Rússia e Otan, a aliança militar ocidental, Kaliningrado estreou na crise da Guerra da Ucrânia.

A Lituânia implementou um embargo ao transporte ferroviário de bens russos por seu território até o território de Moscou ensanduichado entre o país e a Polônia, ambos membros da Otan. O Kremlin reagiu ameaçando retaliação contra o vizinho e acusou a União Europeia de escalar a já tensa situação.

“A Rússia irá reagir a essas ações hostis. As medidas serão implementadas, e as consequências terão um sério impacto negativo que será sentido pela população lituana”, afirmou à agência estatal RIA o poderoso secretário do Conselho de Segurança do Kremlin, Nikolai Patruchev.

Tudo começou no sábado (18), quando passou a valer um embargo europeu ao transporte de produtos russos por terra, parte dos pacotes de punição pela guerra. Como cerca de 50% do que é consumido por Kaliningrado vem da Rússia por linhas de trem que passam pela Lituânia, o problema está colocado.

“Quando a notícia veio, lá pela quinta-feira (16), nós corremos para o supermercado e compramos tudo o que não fosse perecível”, disse por aplicativo de mensagem Natascha Gruchovka, 35, corretora de imóveis na cidade. O pânico, disse, arrefeceu, mas agora a tensão é sobre os próximos passos da crise.

Kaliningrado era, até o conflito, um dos pontos de maior intersecção e atrito entre Rússia e Ocidente. O motivo é geográfico: a antiga Königsberg, capital da Prússia Oriental tomada da Alemanha ao fim da Segunda Guerra Mundial, é o território mais ocidental da Rússia. Ela foi renomeada em 1946, em homenagem ao líder soviético Mikhail Kalinin, morto naquele ano.

Com o fim da União Soviética e o retrocesso das fronteiras russas, Kaliningrado ficou isolada da pátria-mãe, o que a expôs a maior intercâmbio comercial com os vizinhos europeus e a uma militarização específica: o tamanho dos efetivos russos lá diminuiu, mas a região virou uma base para vários tipos de mísseis, inclusive os do modelo Iskander, com capacidade para atingir Berlim com ogivas nucleares.

Ela também sedia a Frota do Báltico, que só faz crescer de importância com a crise e o pedido de Suécia e Finlândia para entrar na Otan. Toda a região é uma das mais conflituosas na relação Rússia-Ocidente, com grande atividade militar e temor constante dos vizinhos de que Moscou use sua aliada Belarus para tentar estabelecer uma ponte terrestre com Kaliningrado.

Isso é improvável, já que implicaria uma guerra contra a Otan como um todo -o mesmo pode ser dito das ameaças atuais. O território todo tem o tamanho aproximado de São Caetano do Sul (SP) e quase 1 milhão de habitantes. “Ninguém mudou nenhum hábito, mas não temos mais poloneses nos cafés como costumávamos ter”, contou Natascha, que faturou alto vendendo antigas casas soviéticas com fachadas germanizadas para turistas durante a Copa de 2018, que teve ali uma de suas sedes.

O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, disse que o embargo é uma escalada da União Europeia, da qual a Lituânia também faz parte, contra a Rússia. Na semana que vem, o grupo irá analisar o pedido para que a Ucrânia seja considerada candidata a membro do bloco.

Já a União Europeia afirmou que não há um bloqueio do exclave, apenas a aplicação de sanções -embora na prática dê quase na mesma. Os EUA, por sua vez, disseram que mantêm o apoio à Lituânia e à Otan.

Para os russos, é mais uma peça da disputa retórica em torno da Guerra da Ucrânia. Os trens embargados transportam produtos como material de construção, carvão e combustível, mas também comida e bens de consumo como eletrodomésticos. Agora, eles terão de ser enviados por rotas marítimas ou aéreas mais longas e caras, usando territórios internacionais.

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