Menu
Mundo

Como a liderança de Xi na China afeta investimentos no Brasil

Em Pequim, a conclusão do 20º Congresso do Partido Comunista pavimenta o caminho de Xi Jinping para o seu terceiro mandato de cinco anos

FolhaPress

24/10/2022 10h54

Foto: REUTERS/Jason Lee

CLAYTON CASTELANI
SÃO PAULO, SP

Enquanto o Brasil entra na última semana de uma corrida presidencial incerta quanto ao resultado das urnas e dos estragos que o vale-tudo eleitoral deixará nas contas públicas, um cenário mais certeiro e potencialmente promissor para a economia brasileira é desenhado a 17 mil quilômetros de Brasília.

Em Pequim, a conclusão neste sábado (22) do 20º Congresso do Partido Comunista pavimenta o caminho de Xi Jinping para o seu terceiro mandato de cinco anos como presidente da República Popular da China.

Xi ganha mais tempo para consolidar seu plano de transição do modelo econômico do gigante asiático, priorizando o crescimento com base no aumento do consumo das famílias, em detrimento dos investimentos em infraestrutura e empreendimentos imobiliários.

Há nessa mudança riscos e oportunidades para os investidores dos mercados de ações e privado do Brasil.

É a busca pela chamada “prosperidade comum” que norteia o líder chinês, termo frequentemente aplicado pelo mandatário para tratar da distribuição menos desigual de riquezas e promoção do bem-estar social.

“O terceiro mandato de Xi Jinping consolida ideias atribuídas a essa gestão nos últimos dez anos, uma delas é a de confrontar a quantidade com a qualidade, buscando portanto um crescimento econômico sustentável do ponto de vista ambiental e social”, diz Larissa Wachholz, sócia da Vallya e assessora especial do Ministério da Agricultura para assuntos relativos à China de 2019 a 2021.

Do lado das preocupações, a retração da construção civil chinesa diminui a demanda por aço e, consequentemente, pelo minério de ferro. Exportadores dessas mercadorias, como a Vale, estão entre os pesos-pesados da Bolsa de Valores brasileira.

Ventos favoráveis, porém, sopram na direção da cadeia produtiva do agronegócio, responsável por cerca de 25% do PIB brasileiro estimado para 2022 pelo Cepea (centro de estudos da Esalq-USP).

Esse setor poderá ser amplamente beneficiado com a permanência de Xi, segundo Roberto Dumas, estrategista-chefe do Voiter e professor de economia chinesa do Insper.

“O que eles querem é que o crescimento seja sobre o consumo das famílias e, numa escala de necessidades, a alimentação vem em primeiro lugar”, diz Dumas.

O setor de frigoríficos está entre os mais promissores e não é apenas pela necessidade de garantir segurança alimentar de 1,4 bilhão de chineses, mas também pela mudança no paladar desses consumidores.

“Os chineses estão ficando mais ricos, os salários estão crescendo, e eles estão apreciando cada vez mais a carne bovina”, comenta Dumas.

Carne de porco e de frango também devem ter seus mercados ampliados, mas em menor proporção. Wachholz ressalta que a China ambiciona ser autossuficiente na produção dessas proteínas.

Em compensação, a ampliação dos rebanhos no país asiático demandará mais ração animal. Além da soja, devem crescer as compras de milho, sorgo, cevada e trigo.

É uma necessidade que avança desde o final da última década, quando a febre suína forçou a profissionalização e industrialização da pecuária chinesa, e que ganha ainda mais força agora que o país enfrenta a mais severa seca em 40 anos.

Sem terras aráveis em quantidade suficiente para a produção agrícola para suprir sua demanda, os chineses inevitavelmente reforçarão as compras no exterior.

Outro ponto essencial para entender como a permanência de Xi influenciará o mercado é o comprometimento da liderança chinesa com o combate às mudanças climáticas. O risco que o aquecimento global traz para a produção agrícola é a fonte dessa preocupação.

“Eles estão muito comprometidos em enfrentar as mudanças climáticas porque sabem que, entre as grandes economias, estarão entre as mais afetadas devido à questão da segurança alimentar”, afirma Wachholz.

Isso não significa que a China deixará de comprar carne bovina brasileira devido aos problemas relacionados ao desmatamento, embora essa seja uma preocupação que avança entre grupos de consumidores de maior poder aquisitivo.

A prioridade do país diante crise do clima é a substituição gradual de fontes de energia com elevada emissão de gases de efeito estufa, como o dióxido de carbono gerado pela combustão de carvão e petróleo.

Entre as principais apostas para a troca da matriz energética está o hidrogênio verde, com grande potencial de emprego no transporte marítimo de mercadorias que partem dos portos chineses para todos os lugares.

Extraído da água a partir do contato com barras de metal eletrificadas (eletrólise), o hidrogênio só é considerado verde se o alto gasto energético empregado nesse processo tem origem em fontes que não poluem.

É neste ponto que surge a oportunidade de crescimento para ativos de empresas do setor energético brasileiro devido ao seu potencial para geração de energia limpa através de usinas hidrelétricas, parques eólicos e fazendas solares.

“Isso é uma pauta muito relevante para a China hoje e o Brasil tem muita capacidade de absorver investimentos nessa área, que é prioridade para as multinacionais chinesas”, diz a especialista da Vallya.

Guerra e crise dificultam análise dos preços das ações

Especialista no mercado de matérias-primas, Ilan Arbetman, analista de pesquisa da Ativa Investimentos, avalia que as ações dos setores mais importantes da Bolsa brasileira, o petrolífero e o da mineração, encontram dificuldades para espelhar as mudanças em curso na China, país que mais demanda esse tipo de mercadorias.

Até mesmo o preço desses papéis não reflete exatamente o real valor das commodities exportadas, segundo Arbetman.

Os desafios para se investir com foco na demanda externa neste momento, diz o analista, são um retrato do cenário internacional de grande complexidade devido à Guerra na Ucrânia, aos gargalos no escoamento ainda provocados pelo controle da Covid na China e pela ameaça de recessão com a escalada dos juros promovida por bancos centrais que tentam frear a inflação mundial.

Para evitar quedas significativas nos preços das commodities em um cenário de contração da demanda, agentes produtores forçam a alta dos preços entregando menos ao mercado.

“Há uma série de forças atuando e hoje o preço responde mais ao ajuste da oferta”, diz Arbetman, destacando os seguidos anúncios de corte na produção diária de barris de petróleo por parte da Opep, cartel de países produtores da matéria-prima.

    Você também pode gostar

    Assine nossa newsletter e
    mantenha-se bem informado