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Após veto a texto brasileiro, EUA apresentam resolução no Conselho de Segurança

Ainda não há previsão de quando o texto será votado. A missão americana na ONU ainda não solicitou a análise do texto ao conselho

Redação Jornal de Brasília

24/10/2023 15h14

Foto: AFP

FERNANDA PERRIN
WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS)

Após vetarem a resolução proposta pelo Brasil na semana passada, os Estados Unidos apresentaram um texto próprio o Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre o conflito no Oriente Médio.

Ainda não há previsão de quando o texto será votado. A missão americana na ONU ainda não solicitou a análise do texto ao conselho, presidido neste mês pelo Brasil.

Em reunião do órgão nesta terça (24), o secretário de Estado americano, Antony Blinken, afirmou que o documento “se baseia em muitos elementos da resolução proposta pelo Brasil”, somados ao feedback de outros membros do conselho.

A Rússia, no entanto, que tem poder de veto, já afirmou que não pode apoiar o texto americano e que elaborou uma terceira proposta, sintetizando sua própria redação do documento (derrotada no conselho na semana passada), a brasileira e a americana.

Na semana passada, os EUA foram o único país a votar contra a resolução brasileira, sob a justificativa de que ela não afirmava o direito de Israel de se defender.

Assim, o texto apresentado por Washington “reafirma o direito inerente de todos os Estados à autodefesa individual e coletiva” e elimina o trecho presente na resolução brasileira que pedia a rescisão da ordem de evacuação imposta por Israel a civis no norte de Gaza (leia a íntegra ao fim deste texto).

Diante das críticas à reação de Israel, a resolução americana também “reafirma que, ao responder a ataques terroristas, os Estados-Membros devem cumprir integralmente todas as suas obrigações nos termos do direito internacional, em particular o direito internacional dos direitos humanos, o direito internacional dos refugiados e o direito internacional humanitário”.

Assim como o texto proposto pelo Brasil, a resolução americana condena os ataques perpetrados pelo grupo terrorista Hamas, mas inclui “outros grupos terroristas”. O texto faz ainda um apelo para que todos os Estados-membros “intensifiquem seus esforços para reprimir o financiamento do terrorismo”.

Enquanto o documento brasileiro pedia diretamente pausas humanitárias, o americano pede “a adoção de todas as medidas necessárias, como pausas humanitárias, para permitir o pleno, rápido, seguro e não impedido acesso humanitário”.

Ambos os textos fazem um apelo para que agentes relevantes usem sua influência para evitar uma ampliação do conflito na região, mas o texto americano cita explicitamente a exigência para que o Hizbollah -apoiado pelo Irã- pare seus ataques.

“Pedimos a todos os países que enviem uma mensagem firme a quem esteja considerando abrir um novo front nessa guerra contra Israel, ou que more um aliado de Israel, incluindo os EUA: não coloque gasolina nesse fogo”, disse Blinken.

O secretário de Estado americano afirmou que pretende trabalhar por esse objetivo durante visita de seu par chinês, Wang Yi, a Washington nesta semana.

Blinken mencionou ataques sofridos por pessoal americano no Iraque e na Síria, atribuídos por ele a aliados do Irã. “Repito aqui: os EUA não buscam um conflito com o Irã, não queremos que essa guerra cresça, mas se o Irã atacar pessoal americano, não se enganem. Nós vamos defender nosso pessoal, nossa segurança”, alertou.

A sessão sobre Oriente Médio do Conselho de Segurança nesta terça já estava no calendário do órgão desde antes da eclosão do conflito -trata-se de uma agenda trimestral. No entanto, com a escalada da violência após os ataques perpetrados pelo Hamas em 7 de outubro, o encontro ganhou outro escopo.

Ministros de relações exteriores, como o brasileiro Mauro Vieira, representaram seus países, em vez dos embaixadores das missões nacionais na ONU, como é de costume. Além dos 15 integrantes do conselho, outros Estados também foram autorizados a participar, como Egito e Alemanha, e o observador do Vaticano.

No total, 86 representantes pediram a palavra, incluindo o secretário-geral da ONU, Antonio Guterres, e o coordenador especial para o processo de paz no Oriente Médio, Tor Wennesland.

Vieira, falando na condição de representante do Brasil, repetiu os apelos do presidente Lula (PT) para que os reféns sejam soltos, e para que Israel pare os bombardeios para que civis palestinos saiam de Gaza.

Sem citar os EUA, o diplomata disse que “estratégias obstrutivas têm impedido que decisões cruciais sobre a paz e segurança internacional sejam tomadas”.

“Como resultado, a situação no Oriente Médio é de longe um dos assuntos mais obstruídos no Conselho de Segurança”, afirmou. “É provável que sejamos testados e considerados culpados pelas gerações futuras por nossa inação e complacência.”

O chanceler afirmou ainda que há “um pedido abrangente por corredores humanitários urgentemente necessários”, que uma decisão nesse aspecto humanitário está “ao alcance das mãos do conselho” desde que ele evite a politização de uma situação já complexa em campo.

Vieira disse que a entrada de suprimentos humanitários via Rafah é insuficiente. Vieira destacou que o conselho tem uma “responsabilidade crucial” na resposta à crise de reféns e humanitária. “Muito da reputação das Nações Unidas depende de sua abordagem à crise em curso.”

O secretário-geral da ONU, António Guterres, ao abrir a reunião, pediu um cessar-fogo humanitário imediato. Invocando o aniversário da entrada em vigor, há 76 anos, da Carta da ONU nesta terça, ele fez um apelo para que o conselho aja sobre o conflito.

Wennesland reforçou o pedido por um cessar-fogo humanitário imediato e alertou para o risco de o conflito se espalhar pela Cisjordânia, onde crescem confrontos entre palestinos, soldados israelenses e colonos.

Segundo Wennesland, desde 7 de outubro, 93 palestinos, incluindo 27 crianças, foram mortos na Cisjordânia por soldados ou colonos. Um soldado israelense foi morto.

Lynn Hastings, representando o subsecretário-geral para assuntos humanitários, também pediu um cessar-fogo humanitário e a libertação imediata dos reféns feitos pelo grupo terrorista Hamas. Ela apontou que o número de civis atingiu 2,5 vezes a capacidade dos abrigos da ONU.

“Ao menos 42% de todas as casas em Gaza foram destruídas ou afetadas. Isso coloca sob questão a capacidade de as pessoas voltarem algum dia para suas casas”, disse Hastings. “Médicos estão sendo obrigados a operar sem anestesia.”

O uso da passagem por Rafah para a entrada de suprimentos humanitários em Gaza é bem-vindo, disse ela, mas ainda significam muito pouco da necessidade total da região. Outro problema é que esses suprimentos não incluem combustível -o que impede a dessalinização da água e o funcionamento de hospitais.

“Mais de 2 milhões de palestinos estão em uma missão de sobrevivência todos os dias. Até o momento em que os seus discursos acabem hoje, 150 palestinos terão sido mortos, incluindo 60 crianças”, disse Riyad Al-Maliki, ministro de Relações Exteriores e expatriados da Palestina. “Quase todos os mortos por Israel são civis.”

Ele acusou Israel de praticar uma punição coletiva contra a população palestina, mirando civis e desrespeitando o direito internacional. Ele afirmou que Tel Aviv trata os palestinos com “subhumanos”.

Falando em seguida, Eli Cohen, ministro das relações exteriores de Israel, mostrou imagens de crianças reféns mantidas pelo Hamas em Gaza. “Senhor secretário-geral, em que mundo você vive? Definitivamente, não é o nosso”, disse.

“Eu ouço os apelos para proporcionalidade. Qual a resposta proporcional para o assassinato de bebês, estupro de mulheres?”, questionou. “Como você pode concordar com um cessar-fogo com alguém que prometeu eliminar sua existência?”

“A resposta proporcional ao massacre de 7 de outubro é a total destruição até o último do homem do Hamas. Não é só direito de Israel destruir o Hamas, é nosso dever”, defendeu.
Veja a íntegra do texto proposto pelos EUA

“O Conselho de Segurança,
Reafirmando os propósitos e princípios da Carta das Nações Unidas,
Recordando suas resoluções sobre o combate ao terrorismo, contra sequestros e tomada de reféns de civis por organizações terroristas, sobre a proteção de civis e crianças em conflitos armados, sobre a fome em conflitos e sobre a situação no Oriente Médio, e recordando que quaisquer medidas tomadas para combater o terrorismo devem estar em conformidade com todas as obrigações do direito internacional, em particular o direito internacional dos direitos humanos, o direito internacional dos refugiados e o direito internacional humanitário.

Expressando profunda preocupação com casos de discriminação, intolerância e extremismo violento, manifestados na forma de discurso de ódio ou violência baseada em raça, sexo, etnia, religião ou crença, tais como, mas não limitados a, pessoas pertencentes a comunidades religiosas, em particular casos motivados por islamofobia, antissemitismo ou cristianofobia, e outras formas de intolerância.

Reafirmando que o terrorismo em todas as formas e manifestações constitui uma das ameaças mais sérias à paz e segurança internacionais e que quaisquer atos de terrorismo são criminosos e injustificáveis, independentemente de suas motivações, quando e por quem forem cometidos.

Expressando profunda preocupação com a deterioração da situação na região e enfatizando que todas as populações civis, incluindo israelenses e palestinos, devem ser protegidas de acordo com o direito internacional humanitário e o direito internacional dos direitos humanos.

Expressando profunda preocupação com a situação humanitária em Gaza e seu grave impacto na população civil, especialmente o efeito desproporcional sobre as crianças, e enfatizando a necessidade de acesso humanitário pleno, rápido, seguro e não impedido.

Recordando o desejo de que um fim duradouro ao conflito israelo-palestino só pode ser alcançado por meios pacíficos, com base em suas resoluções relevantes.

Observando que o Hamas e outros grupos terroristas em Gaza não representam a dignidade ou autodeterminação do povo palestino e que o Hamas foi designado como organização terrorista por numerosos Estados-membros.

Determinado a combater por todos os meios, de acordo com a Carta das Nações Unidas e outras obrigações do direito internacional, incluindo o direito internacional dos direitos humanos, o direito internacional dos refugiados e o direito internacional humanitário, as ameaças à paz e segurança internacionais causadas por atos terroristas.

Rejeita inequivocamente e condena os ataques terroristas hediondos do Hamas e de outros grupos terroristas que ocorreram em Israel a partir de 7 de outubro de 2023, bem como o sequestro e assassinato de reféns, assassinato, tortura, estupro, violência sexual e a contínua disparada indiscriminada de foguetes.

Expressa suas mais profundas condolências e sentimentos às vítimas e suas famílias, ao Governo de Israel e a todos os Governos cujos cidadãos foram alvo e perderam suas vidas nos ataques mencionados acima.

Expressa mais profundas condolências e sentimentos às populações palestinas e a todos os outros civis que perderam suas vidas desde 7 de outubro de 2023, incluindo no Hospital Al-Ahli em 17 de outubro de 2023.

Reafirma o direito inerente de todos os Estados à autodefesa individual e coletiva, e também reafirma que, ao responder a ataques terroristas, os Estados-Membros devem cumprir integralmente todas as suas obrigações nos termos do direito internacional, em particular o direito internacional dos direitos humanos, o direito internacional dos refugiados e o direito internacional humanitário.

Insta fortemente todas as partes a respeitar integralmente e cumprir as obrigações do direito internacional, incluindo o direito internacional dos direitos humanos e o direito internacional humanitário, incluindo aquelas relacionadas à conduta das hostilidades e à proteção da população civil, incluindo civis que estão tentando chegar em segurança, e à infraestrutura civil, e reitera a necessidade de tomar medidas apropriadas para garantir a segurança e o bem-estar dos civis e sua proteção, bem como dos trabalhadores humanitários e ativos humanitários.
Reafirma que qualquer movimento de pessoas deve ser voluntário, seguro e consistente com o direito internacional e insta todas as partes a tomar medidas apropriadas para promover a segurança e o bem-estar dos civis e sua proteção, incluindo crianças, permitindo seu movimento seguro.

Condena nos termos mais fortes toda a violência e hostilidades contra civis, bem como os contínuos abusos grosseiros, sistemáticos e generalizados dos direitos humanos, violações do direito internacional humanitário e atos odiosos de destruição realizados pelo Hamas, incluindo seu uso condenável de civis como escudos humanos e sua tentativa de obstruir a proteção de civis.

Exige a libertação imediata e incondicional de todos os reféns restantes feitos pelo Hamas e outros grupos terroristas, bem como sua segurança contínua, bem-estar e tratamento humano de acordo com o direito internacional, e expressa apreço pelos esforços de todos os estados, incluindo o Qatar, pela libertação em 20 de outubro de 2023 de dois reféns feitos pelo Hamas.

Chama a adotar todas as medidas necessárias, como pausas humanitárias, para permitir o acesso humanitário pleno, rápido, seguro e não impedido, de acordo com o direito internacional humanitário, às agências humanitárias das Nações Unidas e seus parceiros de implementação, o Comitê Internacional da Cruz Vermelha e outras organizações humanitárias imparciais, para facilitar o fornecimento contínuo, suficiente e não impedido de bens e serviços essenciais importantes para o bem-estar da população civil em Gaza, incluindo especialmente água, eletricidade, combustível, alimentos e suprimentos médicos;
Saúda o anúncio em 21 de outubro de 2023 pelo Secretário-Geral da provisão inicial de suprimentos humanitários para civis em Gaza via a Passagem de Rafah, bem como a entrega adicional de suprimentos em 22 de outubro de 2023, e insta os Estados-Membros a apoiar ainda mais os esforços das Nações Unidas, Egito, Jordânia e outros para permitir pleno, rápido, seguro e não impedido acesso de acordo com o direito internacional humanitário e para construir sobre este importante primeiro passo, incluindo promovendo passos práticos como o estabelecimento de corredores humanitários e outras iniciativas para a entrega sustentável de ajuda humanitária aos civis.

Reitera o apelo a todas as partes em conflito armado a cumprir suas obrigações nos termos do direito internacional humanitário, incluindo o respeito e a proteção de civis e o cuidado constante para poupar objetos civis, incluindo objetos críticos para a entrega de serviços essenciais à população civil, abster-se de atacar, destruir, remover ou tornar inúteis objetos indispensáveis à sobrevivência da população civil e respeitar e proteger pessoal humanitário e carregamentos usados em operações de ajuda humanitária.

Enfatiza que as instalações civis e humanitárias, incluindo hospitais, instalações médicas, escolas, locais de culto e instalações da ONU, bem como o pessoal humanitário e pessoal médico exclusivamente envolvido em funções médicas e seus meios de transporte, devem ser respeitados e protegidos, de acordo com o direito internacional humanitário, e insta todas as partes a agir consistentemente com esses princípios e regras.

Sublinha a importância da coordenação e desobstrução para proteger todos os locais humanitários, incluindo instalações da ONU, e para facilitar o movimento de comboios de ajuda.

Insta os Estados-Membros a intensificar seus esforços para suprimir o financiamento do terrorismo, incluindo restringir o financiamento do Hamas por meio de autoridades nacionais aplicáveis, de acordo com o direito internacional e consistente com a Resolução 2482 (2019);
Chama todos os Estados e organizações internacionais a intensificar passos urgentes e concretos para apoiar os esforços das Nações Unidas e dos Estados regionais para prevenir a escalada da violência em Gaza, a transbordar ou se expandir para outras áreas na região, e chama a todos com influência a trabalhar em direção a esse objetivo, incluindo exigindo a cessação imediata por parte do Hizbollah e de outros grupos armados de todos os ataques que constituem violações claras da Resolução 1701 (2006) e resoluções relevantes do Conselho de Segurança.

Chama todos os Estados a tomar medidas práticas para impedir a exportação de armas e material para milícias armadas e grupos terroristas que atuam em Gaza, incluindo o Hamas.

Ressalta que a paz duradoura só pode ser baseada em um compromisso duradouro com o reconhecimento mútuo, pleno respeito aos direitos humanos, liberdade da violência e incitamento, e afirma a urgência de esforços diplomáticos para alcançar uma paz abrangente com base na visão de uma região onde dois estados democráticos, Israel e Palestina, vivem lado a lado em paz com fronteiras seguras e reconhecidas, como previsto em suas resoluções anteriores, e pede a retomada das negociações israelo-palestinas com base nas resoluções relevantes das Nações Unidas, incluindo uma solução de dois estados.

Expressa solidariedade com todas as pessoas que desejam uma paz duradoura com base em uma solução de dois estados, e também apoio a medidas práticas, de acordo com o direito internacional, necessárias para contribuir para o fim do ciclo de violência, a reconstrução da confiança e a criação das condições necessárias para avançar na paz e na segurança;
Decide manter-se informado sobre o assunto.”

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