Menu
Mundo

Após tensão, Trump tenta lucro político e financeiro com operação do FBI

Na quinta-feira (11), um homem armado tentou invadir um prédio do FBI em Cincinnati (Ohio), trocou tiros com agentes e foi perseguido

FolhaPress

12/08/2022 17h16

Foto: Jim Watson/AFP

Thiago Amâncio
Washington, EUA

Donald Trump nunca saiu do cenário político dos EUA desde que deixou a Presidência, há pouco mais de um ano e meio, mas poucas vezes passou tanto sufoco quanto nesta semana, após uma inédita operação de busca em sua casa, que pode se transformar num caso criminal, além de um depoimento a autoridades em Nova York em que invocou 440 vezes o direito de ficar calado.

A investida contra o ex-presidente, admitida publicamente pelo Departamento de Justiça do governo Joe Biden, elevou sobremaneira as tensões no país, com militantes radicalizados nas ruas –foi a provável causa de um atentado a um prédio do FBI em Ohio– e trocas de acusações entre democratas e republicanos. Também levantou questionamentos sobre o lugar de Trump no atual xadrez político dos EUA.

O ex-presidente tem tentado usar tudo isso em seu proveito. Não só politicamente, ao dizer e repetir que é alvo de perseguição, mas também financeiramente.

O Save America (“salve os EUA”), comitê político de Trump, disparou na manhã de terça-feira (9) um email pedindo dinheiro dos apoiadores. “Corram para doar IMEDIATAMENTE para mostrar publicamente que estão do meu lado contra ESSA CAÇA ÀS BRUXAS SEM FIM.”

No Telegram, Trump afirmou que o ex-presidente Obama “manteve 33 milhões de páginas de documentos, muitos deles secretos” e afirmou que a acusação de que mantinha documentos sobre armas nucleares “é uma farsa”, como as acusações de que foi ajudado pelos russos na eleição ou os processos de impeachment que sofreu.

Foi Trump quem revelou, no fim da tarde de segunda-feira (8), que sua casa havia na Flórida sido alvo de uma operação de busca do FBI, a política federal do país. Sem nenhuma informação pública, a imprensa americana descobriu que os agentes buscavam documentos supostamente tirados de forma indevida da Casa Branca no período em que ocupou a Presidência, e já se fala em informações secretas sobre pesquisas nucleares.

Foram dias tensos de silêncio do governo, que a princípio disse apenas que a Casa Branca não havia sido informada da busca. Na quinta (11), após uma série de acusações de perseguição política, o procurador-geral dos EUA, Merrick Garland, secretário do Departamento de Justiça, ao qual o FBI é subordinado, foi à TV dizer que aprovou pessoalmente a operação e defendeu a corporação dos ataques de republicanos.
“Não vou ficar calado quando a integridade deles [dos agentes] é atacada injustamente”, afirmou. “Os homens e mulheres do FBI e do Departamento de Justiça são servidores públicos e patriotas dedicados”.

Não é a primeira vez que o Departamento de Justiça investiga autoridades por suspeita de lidar de forma imprópria com material sensível –o caso recente mais chamativo foi o da democrata Hillary Clinton, que usou um email pessoal para lidar com informações classificadas como secretas ou ultrassecretas quando ocupou o cargo de secretária de Estado.

De acordo com o jornal americano The Wall Street Journal, na operação de segunda-feira os agentes do FBI retiraram 20 caixas da casa de Trump, com 11 conjuntos de documentos sigilosos, além de fotos e anotações. O Departamento de Justiça afirmou que pediu a remoção do sigilo do inventário do que foi apreendido, para mostrar que não houve perseguição política.

Dois dias depois da operação, na quarta (10), Trump teve outra dor de cabeça ao ter que depor à Procuradoria-Geral de Nova York, em um caso que investiga supostas manobras fiscais irregulares de suas empresas. Na ocasião, a única pergunta que respondeu foi qual era seu nome, antes de ler um comunicado em que acusava a investigação de ter motivações políticas e dizer centenas de vezes por mais de quatro horas que não responderia às perguntas.

O ex-presidente tem apoio sólido entre cerca de 30% dos filiados ao Partido Republicano, diz Daniel Disalvo, professor de ciência política na Universidade da Cidade de Nova York. Esse grupo “continua com Trump mesmo se ele atirar em alguém na Quinta Avenida”, diz.

Para essa parcela, as investidas contra o ex-presidente corroboram uma narrativa de que ele é perseguido politicamente. Outra parcela do partido tem ojeriza a Trump desde antes de seu primeiro mandato e vê na figura dele uma representação do declínio e uma negação dos valores republicanos.

“A única mudança real que vejo no tabuleiro político é para o grupo que votou nele nas últimas eleições, mas que pode ficar mais reticente com ele aparecendo no noticiário policial”, declara Disalvo, afirmando que isso eventualmente pode atrapalhar candidatos apoiados pelo ex-presidente nas midterms, mas que não vislumbra uma diferença grande na próxima eleição presidencial, que acontecerá só em 2024.

“Em dois anos pode acontecer uma enormidade de coisas. Os anos da juventude de Trump se foram já muito tempo, sua saúde não é a melhor, ele pode muito bem não concorrer em 2024.”

A resistência de setores mais tradicionais contra o ex-presidente foi expressa há uma semana por Dick Cheney, o poderoso vice-presidente do país durante o governo George W. Bush. Em anúncio veiculado na TV a favor da reeleição de sua filha, Liz Cheney, como deputada por Wyoming, o republicano chamou Trump de covarde e disse que o ex-presidente é uma ameaça aos Estados Unidos.

“Nos 246 anos de história da nossa nação, nunca houve um indivíduo que fosse uma ameaça maior à nossa república que Donald Trump. Ele tentou roubar a última eleição usando mentiras e violência para se manter no poder depois que os eleitores o rejeitaram. Ele é um covarde. Um homem de verdade não mentiria para seus apoiadores. Ele perdeu as eleições e perdeu feio. Eu sei disso, ele sabe disso e, lá no fundo, acredito que a maioria dos republicanos sabem disso”, disse.

Um dos motivos da ira de Cheney é que Liz, também republicana, tornou-se alvo de manifestantes radicais do partido depois que assumiu a vice-presidência da comissão que apura na Câmara o ataque ao Capitólio em 6 de janeiro de 2021.

Ela concorre à indicação do partido nas primárias para a eleição de meio de mandato, que ocorrerão em novembro, e foi uma dos 10 deputados republicanos que votaram a favor do impeachment de Trump após o ataque ao Capitólio. Outros parlamentares que não apoiaram o presidente também têm sido punidos nas primárias locais, o que indica a força que Trump ainda representa dentro do partido.

A operação contra Trump gerou receio mesmo entre republicanos de que a base trumpista se radicalize ainda mais, após apoiadores irem às ruas em defesa do ex-presidente. Segundo o portal Político, mesmo alguns deputados republicanos já expressaram esse temor. “A base perdeu a cabeça. Se Trump decidir chamá-los às armas, acho que podemos ter um outro 6 de janeiro”, disse um deles ao site.

Na quinta-feira (11), um homem armado tentou invadir um prédio do FBI em Cincinnati (Ohio), trocou tiros com agentes e foi perseguido até ser morto. O atirador era um prolífico apoiador de Trump em redes sociais, e a corporação investiga se ele tem ligação com grupos extremistas do país.

    Você também pode gostar

    Assine nossa newsletter e
    mantenha-se bem informado