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Economia

Eles pegaram comida do lixo, e Ministério Público quer que eles fiquem na cadeia

O Ministério Público do Estado recorreu da absolvição em 30 de setembro e o caso agora vai para o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul

FolhaPress

28/10/2021 17h51

Foto: Divulgação

Fernanda Brigatti
SÃO PAULO, SP

A Justiça do Rio Grande do Sul absolveu dois homens acusados pelo furto de alimentos vencidos que estavam no pátio de um supermercado no município de Uruguaiana. Ao todo, eles furtaram 50 fatias de queijo, 14 calabresas, 9 unidades de presunto e 5 peças de bacon.

O Ministério Público do Estado, porém, recorreu da absolvição em 30 de setembro e o caso agora vai para o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Somados, os produtos valiam R$ 50 -o caso foi em agosto de 2019- e foram devolvidos ao estabelecimento depois que a polícia prendeu os dois homens. Segundo a Defensoria Pública do Rio Grande do Sul, os alimentos estavam em uma área de descarte, onde seriam triturados.

Furtos de alimentos e de baixo valor são conhecidos como crimes famélicos, ligados à fome -como o caso da mãe de cinco filhos que levou sem pagar pacotes de macarrão instantâneo, refrigerantes e suco em pó de um supermercado em São Paulo.

O juiz André Elias Atalla, da 1ª Vara Criminal de Uruguaiana, entendeu que, para o caso dos dois homens, cabia a aplicação do princípio da insignificância, quando o crime é considerado tão pequeno que a aplicação de uma punição é considerada desproporcional.

Para ele, o delito cometido pelos homens teve “mínima ofensividade”, “inexistência de periculosidade social” e “inexpressividade da suposta lesão”. Os dois homens chegaram a ser presos em agosto de 2019, mas estavam respondendo pelo crime em liberdade pelo menos desde julho de 2020.

Em nota, a promotoria afirma ter discordado do “argumento do juízo dado o contexto dos fatos.” O MP diz também que os homens flagrados furtando os produtos já tinham “condutas anteriores voltadas à pratica de ilícitos, tendo um deles sido condenado por roubo.”

Na decisão publicada em julho deste ano, o juiz André Elias Atalla afirma que o princípio da insignificância tem relação com a “envergadura da lesão”. Os antecedentes dos envolvidos seriam, portanto, fatos alheios. O magistrado cita ainda um precedente do STF (Supremo Tribunal Federal), segundo o qual “é inadequado se apreciar os antecedentes do acusado para tipificar ou não a conduta.”

Nesta quinta (28), a Defensoria Pública estadual divulgou ter enviado manifestação ao TJ-RS. “Tristes tempos em que lixo (alimento vencido) tem valor econômico. Nesse contexto, se a mera leitura da ocorrência policial não for suficiente para o improvimento do recurso, nada mais importa dizer” escreveu o defensor público Marco Antonio Kaufmann, que atua no caso.

Reportagem do jornal Folha de S.Paulo publicada no último sábado (23) mostrou como o avanço da inflação e o desemprego em níveis ainda elevados têm levado mais gente a buscar alimentos em áreas de descarte de locais como o Mercado Municipal, no centro de São Paulo.

Outras marcas da situação de insegurança alimentar -quando a pessoa não tem a certeza de que terá o que comer nas próximas 24 horas- já foram vistas em Fortaleza (CE), onde pessoas buscavam comida em um caminhão de lixo, no Rio de Janeiro (RJ), com o garimpo de pelancas e carcaças de carne, e em Cuiabá (MT), onde cidadãos foram filas na expectativa de conseguir doação de ossos de boi.

A inflação oficial, calculada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), chegou a 10,25% nos 12 meses até setembro. Os alimentos e bebidas acumulam avanço de 12,54% também em um ano. No mesmo período, a variação de preços dos itens que formam a cesta básica já encosta em 16%, segundo estudo da PUCPR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná).

Supermercados também passaram a reforçar procedimentos de segurança para evitar furtos. Uma rede chegou a ser multada pelo Procon-SP depois que algumas unidades passaram a entregar bandejas vazias a quem pedia carne porcionada no açougue. A embalagem de isopor era etiquetada e o cliente só poderia pegar o produto depois que a compra fosse concluída -e paga.

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