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Brasil

Entregadores de aplicativo: trabalhadores precarizados vivem sob riscos

Sem benefícios e garantias comuns em empregos tradicionais, eles se veem obrigados a realizar jornadas exaustivas e colocarem sua saúde em risco em busca da remuneração

Redação Jornal de Brasília

01/05/2023 16h20

Delivery de comida

Arthur Ribeiro e Fernanda Ghazali
Jornal de Brasília/Agência Ceub

Ao passo em que o trabalho de motoristas de entrega por aplicativo tem crescido rapidamente, com inúmeras pessoas optando por essa ocupação, os direitos trabalhistas desta categoria seguem precários e superficiais. Sem benefícios e garantias comuns em empregos tradicionais, eles se veem obrigados a realizar jornadas exaustivas e colocarem sua saúde em risco em busca da remuneração.

De acordo com a Aliança Nacional dos Entregadores de Aplicativos (ANEA), no Brasil existem 1,5 milhão de entregadores, que, segundo uma carta do grupo, “vive sob a tirania de um trabalho mal remunerado, com a ameaça permanente de exclusão, sem direitos trabalhistas mínimos e sem reconhecimento”. Criada em dezembro de 2022, a associação tem o objetivo de defender e representar os trabalhadores enquanto contribui para o debate sobre a regulação das plataformas.

Em busca de maior regulamentação dos direitos trabalhistas, a ANEA listou 12 pontos de melhora. Entre as propostas estão a formalização da relação de trabalho, o acesso à Previdência Social, garantias de remuneração, definição da jornada de trabalho e descanso semanal, responsabilidade por custos e equipamentos, seguro de acidentes de trabalho, auxílio-doença e auxílio-acidente, garantias contra desligamento abusivo, condições de trabalho, liberdade de associação e sindical, direito à informação e transparência do algoritmo e, por fim, o registro profissional e carteira de habilitação.

Membro da ANEA e entregador por aplicativo, Jean Clezar, de 19 anos, reforça que esses direitos são o mínimo que o trabalhador deve ter. “A categoria já entendeu que os trabalhadores independentes não se encaixam no que a gente vive. O autônomo só é autônomo quando escolhe o que quer fazer. Entregador existe antes das plataformas digitais chegarem, mas elas se apropriaram desse trabalho e tiraram a autonomia que o motoboy tinha. A gente presta serviço para uma empresa, então devemos ter direito trabalhista. Não somos autônomos, não somos empresários”, compartilha.

O jovem explica que certas plataformas afirmam ter seguros, mas que na prática não funcionam, já que eles cobrem apenas sete dias sem trabalho e apenas em casos que ocorrem durante a entrega. Desta forma, o entregador fica refém da ajuda de terceiros em casos de acidentes ou furtos. Jean, por exemplo, alugava uma bicicleta em uma empresa parceira das plataformas, mas foi furtado há dois meses e, como consequência, foi multado em R$ 3 mil e foi bloqueado pelo aplicativo, ficando sem respaldo algum.

Jean, de 19 anos, trabalha como entregador e luta pelos direitos da categoria (Foto: Arquivo Pessoal)

“Se você não estiver fazendo uma corrida, se você não estiver dentro de uma entrega, você não tem suporte. Quando fui assaltado não tive nenhuma resposta da plataforma quanto a isso, tomei um bloqueio e ainda fui prejudicado financeiramente. Você tem que lidar pedindo ajuda para os seus colegas. É essa a situação. A gente manda para a plataforma e eles vão dar qualquer justificativa para não te ajudar”, relata.

Apesar de serem tidos como autônomos, Jean conta que são obrigados a cumprir horário para poder receber e não ganham nenhum valor adicional enquanto esperam para fazer a retirada ou a entrega. Em média, ele começa por volta das 8h e roda até as 22h não apenas por opção, mas por necessidade que expõem as condições precárias de trabalho oferecidas no modelo.

“O trabalhador de aplicativo está pagando para trabalhar. Paga plano, paga equipamento, paga isso, aquilo, realmente tem que pagar pra trabalhar e não tem direito nenhum. São categorias menosprezadas, mas em casos de emergência, de noite, na chuva, quem vai na casa entregar o remédio, a comida, é o motoboy”, desabafa.

Na visão do motociclista Roberto Fernandes Sampaio, que trabalha na área há 5 anos, seguir essa profissão atualmente é algo arriscado. Em uma pesquisa feita pela Associação Brasileira de Medicina do Tráfego (Abramet), entre março de 2020 e julho de 2021, o Sistema Único de Saúde (SUS) registrou um total de 308 mil internações de pessoas envolvidas em acidentes no trânsito, sendo 54% motociclistas.

“Hoje o maior desafio é sair e voltar para casa em segurança. Está muito perigoso, as pessoas não tem respeito nenhum com o motoboy, principalmente trabalhando com aplicativo. Quando não tinha aplicativo era melhor. Se o cara precisar se afastar ou bater a moto, é tudo por conta dele, não tem auxílio nenhum, fica na mão”, expõe o entregador..

O que diz o Sindicato

Luiz Carlos Garcia Galvão, presidente do Sindicato dos Motociclistas Profissionais do Distrito Federal (Sindmoto-DF), conta que quando essas empresas começaram a surgir, valia a pena trabalhar mesmo na informalidade, mas agora o cenário é outro.

“Depois que eles dominaram o mercado, precarizaram o setor e vem explorando cada vez mais. Eles sabem que tem a massa inteira à disposição para trabalhar. Existe uma exploração em cima do entregador e nós queremos acabar com isso, queremos que ele seja amparado pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho)”, detalha.

Para Galvão, a principal preocupação da categoria é justamente a informalidade e a falta de reconhecimento profissional pela CLT, já que as empresas não assumem suas devidas responsabilidades como patrões, pois são empresas iguais às demais. Ainda assim, ele afirma que estão juntos com o Ministério do Trabalho discutindo a formação de uma mesa tripartite – comissão para reunir governo, representantes dos trabalhadores e empresas – para formalizar todos os trabalhadores nas plataformas de aplicativos no Brasil.

Com a Convenção Coletiva de Trabalho 2022/2024, feita pelo Sindimoto-DF e Sindhobar (Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e similares de Brasília), em 1º de maio de 2023, Dia do Trabalho, o salário da categoria sofrerá um reajuste de 11%, passando de R$1390,22 para R$1543,14. Aqueles que se sentirem lesados pelas empresas de aplicativo podem recorrer à justiça a partir dessa convenção que sobrepõe a CLT, explica Luiz Carlos.

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