STEFHANIE PIOVEZAN
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS)
A população parda é predominante em 3.245 cidades brasileiras, o equivalente a 58,3% do total, e em um desses municípios representa 92,7% dos moradores. Trata-se de Boa Vista do Ramos (AM), a cidade mais parda do país, segundo dados do Censo 2022 divulgados nesta sexta-feira (22) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Localizada na margem direita do rio Amazonas, na microrregião de Parintins, a cidade possui 23.785 pessoas e uma área de 2.589,4 km², o equivalente a 9,19 hab/km². Considerando somente a área urbanizada, são 3,78 km², o que a coloca como a 35ª no Amazonas.
Em janeiro deste ano, o município comemorou o aniversário de 40 anos de fundação, mas sua história remonta ao século 19, quando a região foi palco de sangrentos conflitos da Cabanagem.
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“A revolução social dos cabanos, que explodiu em Belém do Pará, em 1835, deixou mais de 30 mil mortos e uma população local que só voltou a crescer significativamente em 1860. Este movimento matou mestiços, índios e africanos pobres ou escravos, mas também dizimou boa parte da elite da Amazônia. O principal alvo dos cabanos eram os brancos, especialmente os portugueses mais abastados”, escreve a professora Magda Ricci, da UFPA (Universidade Federal do Pará), em artigo sobre a identidade dos revolucionários.
O movimento eclodiu devido à miséria na região, um problema que ainda deixa marcas. O IDH (índice de desenvolvimento humano) de Boa Vista do Ramos subiu nas últimas décadas, passando de 0,287 em 1991 para 0,372 em 2000, e chegou a 0,565 em 2010, ano em que Manaus registrou 0,737.
Em 2008, 51,3% da população de Boa Vista de Ramos vivia abaixo da linha da pobreza e, em 2020, o município contabilizava 23,4 óbitos de crianças menores de um ano por mil nascidos vivos, quase o dobro da capital do Amazonas (12,8).
“Há um povo das florestas, que vive da extração de produtos da mata e dos rios e em guerra por sua conservação e sustentação. Há um povo indígena multifacetado, mas uníssono na guerra com os brancos e a usurpação que estes continuam fazendo de suas terras e riquezas. Existe ainda um povo afrobrasileiro que cotidianamente reivindica a propriedade de seu território, obtido pela luta quilombola e escrava”, escreve Ricci.
“Todos estes povos se deparam constantemente com problemas como a devastação ecológica, a questão fundiária, a miséria e, sobretudo, a falta de acesso à plena cidadania. Sua luta presente também rememora a dos tempos cabanos. Trata-se de povos amazônicos e de uma luta secular que merece ser conhecida e amparada.”
PARÁ É O ESTADO MAIS PARDO
O Pará é o estado com maior concentração de população parda, 69,9%. Em seguida, vêm Amazonas, com 68,8%, e Maranhão, com 66,4%. Já os estados com os menores pesos relativos da população parda são Rio Grande do Sul, com 14,7%, e Santa Catarina, com 19,2%.Quando consideradas as regiões, o Norte tem 96% (432) dos municípios com predominância de pessoas pardas. O Nordeste também possui percentual elevado, com predominância de pardos em 95,9% (1.720) das cidades, e em terceiro lugar vem o Centro-Oeste, com 91,2% dos municípios (426).
Em números absolutos, as regiões Nordeste e Sudeste concentram juntas 71,1% da população parda do país, com 35,4% e 35,7%, respectivamente. E as cidades com maior contingente desse grupo étnico-racial são São Paulo (3.820.326), Rio de Janeiro (2.403.895) e Fortaleza (1.456.901).