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Brasil

Alfabetização desaba em avaliação e frustra aposta de Bolsonaro no ensino domiciliar

A avaliação, que envolve provas de português e matemática, compõe um indicador chamado Ideb

FolhaPress

16/09/2022 17h36

Paulo Saldña, Isabela Palhares e William Cardoso
São Paulo, SP

O desempenho dos alunos brasileiros no ciclo de alfabetização despencou com o fechamento das escolas por causa da pandemia, mostram os dados de avaliação federal da educação básica de 2021, divulgados nesta sexta-feira (16). Os resultados frustram aposta do governo Jair Bolsonaro (PL) em atividades de alfabetização em casa, desenvolvidas mesmo antes da pandemia.

As provas do Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica) foram aplicadas a uma amostra de alunos do 2º ano do ensino fundamental. A queda em língua portuguesa foi bem acentuada, destoando inclusive do prejuízo identificado nas outras etapas da educação básica.

Houve uma perda de 24,5 pontos na proficiência média desses estudantes entre 2019 e 2021. A nota média passou de 750 para 725,5, o que é considerando por especialistas uma queda muito forte.

“Esperávamos que os resultados do 2º ano fossem piores pela dificuldade de fazer esse processo a distância, mas quando a gente olha para os resultados de língua portuguesa vemos que o resultado foi brutal”, diz Ernesto Faria, diretor fundador do Iede (Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional).

A escala da prova de alfabetização não é a mesma das outras séries, mas, a título de comparação, a queda da pontuação significaria dois anos de aprendizagem, ressalta Faria. “É preocupante porque, se a avaliação seguir o formato atual, essa turma que estava no 2º ano não voltará a ser avaliada nos próximos anos, e é necessário que isso ocorra.”

A alfabetização era apontada durante a pandemia como a maior preocupação com o fechamento das escolas. Para crianças em fase de alfabetização, há enorme dificuldade de ensino com o ensino remoto -na maioria das redes públicas, a principal estratégia de manutenção de atividades foi por atividades impressas e contato por aplicativos de mensagens.

No entanto, o governo Jair Bolsonaro (PL) elegeu a alfabetização como prioridade da gestão do MEC (Ministério da Educação) e investiu exatamente em ações de ensino em casa como estratégia de alfabetização. Iniciativas como a entrega de livros para famílias e a oferta de um game de alfabetização tiveram protagonismo na gestão, além de terem sido amplamente divulgadas pelo governo.

O governo criou uma secretaria de alfabetização na estrutura do MEC logo nos primeiros dias da gestão, em 2019. O titular da pasta, Carlos Nadalim, é um entusiasta da educação domiciliar e, antes de chegar ao ministério, se notabilizou pela venda de materiais para alfabetização em casa e por ser aluno do escritor Olavo de Carvalho.

A regulamentação do ensino domiciliar foi, inclusive, uma das principais bandeiras do governo na área da educação. Um projeto patrocinado por Bolsonaro passou na Câmara e aguarda análise do Senado.

O Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), responsável pela avaliação, organiza os resultados da avaliação de alfabetização em uma distribuição percentual por oito níveis de proficiência. O governo não definiu, entretanto, a partir de qual nível um aluno é considerado plenamente alfabetizado.

Mas a distribuição dos alunos por níveis já mostra o recuo dos estudantes mais novos e o impacto da pandemia de Covid-19. Em 2019, havia 8,8% dos alunos no nível 1 ou abaixo do 1.

Na avaliação de 2021, o índice foi de 23,6% dos alunos no nível 1 ou abaixo dele. Ficaram nos dois últimos níveis 10,3% dos estudantes, eram 14,8% em 2019.

Em matemática, a queda da nota média dos alunos de 2º ano do ensino fundamental foi menor, de nove pontos. Passou de 750 para 741.

“O maior impacto foi nessa fase de alfabetização porque é muito difícil alfabetizar no ensino remoto. Há nessa fase um maior vínculo com o professor, depende muito mais da escola”, diz o diretor de conhecimento, dados e pesquisa da Fundação Lemann, Daniel de Bonis.

O fechamento das escolas por causa da pandemia de coronavírus resultou em uma queda de aprendizado dos alunos de escolas públicas e privadas em todas as etapas da educação básica.

O Brasil foi um dos países com maior tempo de escolas fechadas no mundo. Foram quase dois anos letivos sem aulas presenciais. A oferta de ensino remoto foi desigual pelo país.

A maior queda ocorreu em matemática no 5º ano do ensino fundamental, cuja nota na avaliação passou de 227,88, em 2019, para 216,85 pontos. Isso considerando a rede pública e privada.

Essa queda interrompeu uma tendência de melhoria experimentada desde o início da série histórica, em 2005.

SAEB E IDEB

O Saeb compõe o principal termômetro da educação brasileira. A aplicação é feita a cada dois anos pelo Inep, órgão do Ministério da Educação.

A avaliação, que envolve provas de português e matemática, compõe um indicador chamado Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), ao combinar resultados de aprovação escolar. Como na pandemia as redes de ensino seguiram orientação de não reprovar os alunos, os dados do Ideb ficaram prejudicados, indicando um comportamento artificial de melhora.

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