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Coluna Informação #036 – Recados do estrangeiro

Esta semana, o presidente Jair Bolsonaro fez novo teste e verificou que segue contaminado pelo novo coronavírus e terá que passar mais um tempo isolado

Rudolfo Lago

17/07/2020 5h00

Esta semana, o presidente Jair Bolsonaro fez novo teste e verificou que segue contaminado pelo novo coronavírus. Terá que passar mais um tempo isolado no Palácio da Alvorada. Como, aparentemente, a doença lhe chegou de forma branda do ponto de vista da saúde, ao que tudo indica tem lhe feito bem o isolamento forçado do ponto de vista da oportunidade de reflexão. O Bolsonaro recolhido tornou-se mais sereno. E talvez com mais tempo e capacidade de deglutir os seguidos sinais de que sua postura bélica de viver o tempo todo em conflito com todos aqueles que pensam diferente dele e de seus seguidores mais fieis começavam a fazer com que os canhões que antes voltava para os outros comecem agora a se voltar contra ele.

Depois dos sinais internos começaram a chegar a Bolsonaro os sinais externos. Os recados vindos do estrangeiro. Além dos inquéritos movidos pelo Supremo Tribunal Federal a respeito de fake news e do patrocínio de atos antidemocráticos, o julgamento da chapa Bolsonaro/Mourão no Tribunal Superior Eleitoral, a prisão de Fabrício Queiroz, os sinais internos, primeiro surgiram como sinais externos as reações econômicas. Os alertas de que as posições negacionistas a respeito da pandemia e contra o meio ambiente prejudicavam os negócios do país. O novo alerta vindo do exterior, igualmente contundente, Bolsonaro ouviu do ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes.

Em outros tempos, a fala de Gilmar Mendes no fim de semana relacionando diretamente o Exército, que hoje conduz o Ministério da Saúde, a um “genocídio” teria todos os elementos para fazer Bolsonaro empunhar as suas armas e sair em busca dos acampamentos e mangueiras onde antes se encontrava com sua torcida organizada. Ao contrário disso, o presidente não fez maior coro às críticas à fala do ministro do STF. No caminho oposto, ligou para Gilmar Mendes e fez com que o ministro da Saúde, o general Eduardo Pazzuelo, também ligasse para ele.

Longe de fazer a retratação que o vice-presidente, general Hamilton Mourão, exigira, Gilmar contextualizou o que pretendera dizer ao falar de “genocídio”. E, nesse sentido, fez a Bolsonaro um alerta importante. Em Portugal, onde se encontra no recesso de meio de ano do Poder Judiciário, ele disse ter ouvido de uma forma maior do que esperava que é real o risco de Bolsonaro vir a ser condenado pelo Tribunal Penal Internacional de Haia, na Holanda. Essas informações foram publicadas pela Folha de S.Paulo.

Denúncias à Corte Internacional foram feitas. Mas ninguém até então dera maior importância a elas. Mas Gilmar disse a Bolsonaro que ele não deveria desconsiderar tal hipótese. O Brasil é um país de dimensões continentais. Assim, caminhar no sentido de negar os riscos de uma pandemia letal e de rápido avanço contagioso como vem sendo a da covid-19 é caminhar no sentido de produzir consequências continentais. E consequências continentais rapidamente tem potencial de se tornarem consequências planetárias. A Corte Internacional de Haia julga crimes que afetem a humanidade.

Ainda que seja difícil que as coisas avancem a esse ponto – uma condenação desse tipo é uma medida extrema, muito poucas vezes tomada -, o fato é que Gilmar Mendes disse a Bolsonaro que ficou estarrecido com a imagem negativa do Brasil que viu no exterior. Uma situação que poderia se agudizar caso o país siga na postura negacionista patrocinada por Bolsonaro.

O presidente negou a gravidade da doença até acabar ele mesmo contaminado por ela. Negou e desestimulou as recomendações de isolamento social feitas pela Organização Mundial de Saúde. Pelo contrário, em diversos momentos agiu no sentido oposto, estimulando aglomerações em manifestações de que participou. Em diversas ocasiões, deixou de usar a máscara, proteção recomendada, e não cumpriu as regras de distanciamento. Beijou e abraçou crianças. Apertou mãos de autoridades. Limpou o nariz e encostou nos outros em seguida.

Pode-se gostar ou não de Bolsonaro. O que não se pode negar é que ele seja uma liderança expressiva. E que, assim, seus exemplos pessoas se multipliquem e sejam imitados. Falar em “genocídio” talvez seja mesmo um exagero retórico de Gilmar Mendes. Ainda mais vindo de um representante de outro poder, o que agrava ainda mais a situação. Mas a fala do ministro foi decorrência da impressão que teve de seu país no exterior. Perto que já estamos das 80 mil mortes pela covid-19, essa impressão está longe de ser boa. É importante ouvir esses recados do estrangeiro.

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