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Tim Burton inaugura mural em prédio de SP e diz que brasileiros são inspiração

Cineasta americano prepara vinda ao país no ano que vem e diz que Hollywood precisa dar sinal verde a história originais

FolhaPress

01/12/2021 11h02

Foto: Reprodução

Leonardo Sanchez
São Paulo, SP

Discos voadores começaram a pairar sobre o centro da cidade de São Paulo, sob os olhos vigilantes de um imenso robô, nos últimos dias. Isso porque um mural criado pelo cineasta americano Tim Burton está em fase de finalização no paredão lateral do edifício-garagem Parque 25, na região da 25 de Março -mas a obra já pode ser observada em sua totalidade por quem passa por ali.

É a primeira empena em todo o mundo que recebe uma ilustração original desenhada pelo diretor de filmes como “Edward Mãos de Tesoura” e “Beetlejuice – Os Fantasmas se Divertem”. A intervenção antecipa uma mostra dedicada a Burton, que levará desenhos, pinturas e outros trabalhos seus à Oca, no parque Ibirapuera, a partir de maio.

A arte criada pelo cineasta consiste num enorme robô metálico, de olhos fundos e esbugalhados, como os que normalmente estampam o rosto de seus personagens animados. Os braços do homem de lata travam uma luta contra um monstro de lábios grossos e vermelhos, que escondem uma fileira de dentes pontiagudos.

O visual segue a paleta de cores e o estilo melancólico e fantasioso observado em rascunhos de seus personagens e em outros de seus trabalhos como desenhista. Robô e criatura poderiam muito bem ter saído de “O Triste Fim do Pequeno Menino Ostra e Outras Histórias”, seu livro de poemas e ilustrações, ou do filme “Frankenweenie”.

“Eu gosto de pegar algo que já tenha uma ‘vibe’, um formato próprio, e trabalhar a partir disso. Então quando eu vi uma foto daquele prédio, eu automaticamente pensei nesse robô imenso. Além disso, eu tenho esse amor por filmes de monstros gigantes”, diz Burton em conversa por telefone.

São Paulo, com seus prédios altos e a vida urbana agitada, se mostrou o cenário perfeito para essa história sobre monstros invadindo a cidade. Burton, afinal, compara o processo de conceber a ilustração com a feitura de um filme ou um livro -é preciso haver uma história por trás daqueles personagens.

A execução do “Mural Tim Burton”, como a intervenção foi batizada, ficou a cargo da artista plástica paulistana Luna Buschinelli. Ela vê sua obra muito influenciada pela melancolia e a inventividade dos trabalhos do cineasta, e acha que, justamente por isso, acabou sendo escolhida a dedo para a empreitada.

“Eu sou uma grande admiradora do trabalho dele, nossos universos criativos têm a ver. Nós dois, por meio das nossas ilustrações, gostamos de contar histórias, especialmente a partir de personagens reclusos, solitários, melancólicos”, explica a muralista. “Existe na obra dele uma coisa que consegue acessar o íntimo de qualquer pessoa.”

Buschinelli e Burton ainda não se conheceram pessoalmente, mas isso deve mudar às vésperas da abertura da exposição “A Beleza Sombria dos Monstros: Dez Anos de ‘A Arte de Tim Burton'”, no ano que vem. O cineasta planeja vir ao Brasil para o evento e também para conferir a empena, uma iniciativa da Secretaria Municipal de Cultura e do Museu de Arte de Rua de São Paulo.

Durante a conversa, ao saber que a rua onde o edifício está localizado, a 25 de Março, é cheia de lojinhas nas quais não é difícil encontrar os personagens de seus filmes em estampas de camisetas, chaveiros e outras bugigangas, Burton se mostra animado com a ideia de caminhar pela região em breve.

“Eu amo esse tipo de lugar, e amo ver a minha arte sendo usada e interpretada de formas diferentes pelas pessoas. Eu mal posso esperar para caminhar por essas ruas”, diz ele. “Eu espero que essa visita ao Brasil me inspire, porque, enquanto artista, a energia do seu país, das pessoas, me empolga muito. É ótimo poder voltar.”

O cineasta já esteve no Brasil há cinco anos, quando veio inaugurar a mostra “O Mundo de Tim Burton”, uma retrospectiva de sua carreira que foi sucesso de público no Museu da Imagem e do Som. No país, conheceu Zé do Caixão, acompanhou os desfiles das escolas de samba durante o Carnaval e tirou fotos com banhistas na praia, onde foi clicado de camisa, todo molhado e em poses teatrais.

Antes da viagem, no entanto, Burton deve finalizar as gravações de “Wednesday”, sua primeira série. Ele telefona para este repórter diretamente da Romênia, onde a produção da Netflix inspirada em “A Família Addams” está sendo rodada. Ele diz que não pode dar detalhes sobre o projeto, mas se mostra empolgado em trabalhar numa trama serializada -e, também pela primeira vez, no streaming.

“Eu não sei exatamente o que sinto sobre esse novo meio, mas, como qualquer outro, ele tem seus pontos positivos e negativos. Eu ainda acho que o cinema é, para mim, um formato muito bonito, que deve continuar. A ideia de ver um filme numa telona é algo insubstituível, que desperta sentimentos viscerais e que precisa ser preservada. Então eu espero que a gente não acabe num mundo em que as opções são assistir a algo em casa ou na tela do celular.”

Burton tampouco fala sobre “Beetlejuice 2”, uma sequência para o clássico oitentista que foi anunciada mais de uma vez e que, agora, parece ter sido novamente tragada para o limbo. Desde 1990, ele tenta tirar a continuação do papel -inicialmente, ela levaria o “bio-exorcista” do título para o Havaí-, mas o plano tem se mostrado mais complicado do que o esperado.

“Eu não acho que Hollywood deveria depender demais de sequências, derivados e afins, apesar de achar que eles são ok”, diz o cineasta, que reconhece que ele próprio faz parte dessa tendência com suas versões para “Dumbo” e “Alice no País das Maravilhas”, por exemplo.

“A questão, o que me preocupa, é que precisa haver uma dinâmica em que coisas novas sejam aprovadas, elas precisam ser. Às vezes algo se torna tão popular, como os filmes de heróis, que é a única coisa que os estúdios querem fazer. Há uma luta constante para nós, cineastas, conseguirmos fazer algo totalmente inédito. Quando eu fiz ‘Batman’, por exemplo, isso tudo era muito novo.”

Seus dois filmes sobre o homem-morcego, estrelados por Michael Keaton em 1989 e 1992, eram temática e visualmente muito diferentes do que vemos hoje nos universos da Marvel e da DC. Mas, mesmo assim, foram essenciais para pavimentar o caminho para a onda de super-heróis que vemos tomar as salas de cinema. Hoje, no entanto, Burton já não sente vontade de vestir uma capa e distribuir superpoderes para os atores que dirige.

Talvez não haja espaço, na Hollywood atual, para as esquisitices e o visual gótico que pautaram seus filmes do Batman -pelo menos não com os orçamentos e expectativas destinados ao gênero pelos grandes estúdios. E Burton é o tipo de cineasta que não abre mão de sua visão criativa, por mais excêntrica e não comercial que seja.

Foi insistindo nela, apesar da clara não adequação aos padrões hollywoodianos, que o cineasta deu ao mundo filmes hoje cultuados. É o caso de “Sweeney Todd: O Barbeiro Demoníaco da Rua Fleet”, com seu elenco de não cantores se debruçando sobre as partituras sagradas de ninguém menos que Stephen Sondheim, morto na semana passada, e de “O Estranho Mundo de Jack”, que ele concebeu e produziu, e que na época foi visto como sombrio demais pela Disney.

“Eu nunca penso muito sobre o tom dos meus filmes, é algo que eu simplesmente faço”, explica ele. “Mas, para mim, poder contar com esse aspecto visual sempre foi muito bom, porque eu não sou o melhor dos comunicadores na hora de falar, então é ótimo explorar ideias e pensamentos por meio de desenhos e estéticas.”

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