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Exposições

Entenda como Marc Chagall pintou esperança e mundo onírico com explosão de cor

O óleo “Buque de Flores sobre Fundo Vermelho” reúne alguns temas recorrentes na carreira do artista Marc Chagal

FolhaPress

07/02/2023 10h37

Foto: Reprodução

João Perassolo
São Paulo – SP

Um grande buquê multicolorido ocupa a maior parte de uma pintura com fundo vermelho, ao lado do qual aparecem um homem e uma mulher de braços dados, ele de terno, chapéu e gravata e ela com vestido branco, parecendo uma noiva. Os trajes do casal não são imaculados -o amarelo, o verde e o roxo das flores avançam sobre as roupas, integrando a dupla na explosão cromática da tela.

O óleo “Buque de Flores sobre Fundo Vermelho”, pintado por Marc Chagall por volta de 1970, quando ele tinha 83 anos, reúne alguns temas recorrentes na carreira do artista, como as flores e os enamorados que “flutuam” na composição da imagem. Ambos os elementos aparecem representados numa ampla paleta de cores fortes, outra característica dos trabalhos do pintor.

“A vida de Chagall foi uma perseguição contínua, um exílio contínuo, ou seja, ele não teve uma vida fácil. Mas, ao mesmo tempo, em suas obras, o que ele nos transmite é cor, alegria. E é porque, no fundo, o que nos quer transmitir é uma mensagem de esperança. É a forma com que ele vê o mundo”, afirma a espanhola Lola Durán Úcar, organizadora de uma grande exposição retrospectiva do artista franco-russo que chega nesta quarta-feira a São Paulo.

Até o final de maio, o CCBB, o Centro Cultural Banco do Brasil, exibe 191 obras do pintor e gravador, cobrindo cerca de seis décadas de sua produção, de 1922 até 1981, pouco antes de ele morrer, com 97 anos. A exposição, formada sobretudo com obras provenientes de coleções privadas -portanto, pouco vistas pelo público- percorreu cidades da Itália, da China e outras do Brasil antes de chegar à capital paulista.

Em quatro grandes núcleos, “Marc Chagall: Sonho de Amor” reúne os principais temas das pinturas do artista e deixa ver sua maestria no uso da cor e na exploração das possibilidades estéticas da gravura, formando um panorama da vida deste judeu que fincou raízes na França no auge do surrealismo da década de 1920 e que, mais tarde, se viu obrigado a buscar refúgio nos Estados Unidos, devido à perseguição nazista da Segunda Guerra Mundial.

Um dos destaques da mostra é uma série de 24 litogravuras nas quais Chagall retrata a história bíblica do Êxodo, o mito fundador de Israel, feitas sob encomenda depois de ele empreender uma viagem de pesquisa à Palestina. Outro é o guache “O Avarento que Perdeu seu Tesouro”, de 1927, pintura que deu início às ilustrações do artista para as fábulas de La Fontaine.

As cem gravuras em metal em exibição cobrem todas as lendas do clássico infantojuvenil e ocupam o subsolo do espaço expositivo inteiro, formando pouco mais da metade da mostra. Estes trabalhos evidenciam como o artista “domina tudo o que a água-forte e a água-tinta oferecem como técnica na construção de hachuras e dos claros e escuros”, afirma Cynthia Taboada, a idealizadora da exposição.

Para a versão paulistana da mostra, os organizadores reuniram 12 obras de Chagall espalhadas por coleções de São Paulo e não mostradas em outras cidades, a exemplo de uma guache do MAC, o Museu de Arte Contemporânea da USP, de um conjunto de gravuras do IEB, o Instituto de Estudos Brasileiros da USP e de uma têmpera do acervo do Masp, o Museu de Arte de São Paulo.

A tela do Masp, raramente exibida para o público, é uma pintura feita de memória no início da década de 1920 que reproduz o quadro “Vendedor de Gado”, pintado por Chagall dez anos antes. Com seu tradicional uso das cores, o pintor retrata um vaqueiro levando gado em uma carroça para ser comercializado em um mercado. O veículo é puxado por uma égua grávida, e atrás da carruagem uma mulher carrega um bezerro nas costas.

Enquanto a pintura do Masp está mais para um esboço, a versão original tem traços cubistas e um quê fantástico na temática, dado que o cavalo e o bezerro parecem humanos. Esta mistura de influências mostra como não se deve reduzir as pinturas de Chagall a uma corrente artística específica, afirma Úcar, a curadora espanhola -para ela, o artista criou “um estilo próprio e inconfundível”.

“Quando ele chega em Paris [em 1911], é o momento das vanguardas -do cubismo, do surrealismo-, mas ele não se inscreve em nenhum destes movimentos. Segue seu próprio caminho. Este estilo pessoal, este surrealismo especial tão poético e o magnífico uso que faz das cores é o que tornam seu estilo tão reconhecível. Chagall utiliza alguns elementos das vanguardas e muitos elementos da tradição russa”, ela afirma.

Nascido no final do século 19 no vilarejo de Vitebsk, à época pertencente ao Império Russo e hoje parte do território da Belarus, o artista traria para as suas composições elementos recorrentes na sua infância, como os animais com os quais convivia, mas os colocaria “em um mundo mágico onde os burros voam e as figuras humanas têm cara de gato”, acrescenta Úcar.

A curadora lembra ainda outro tema recorrente nas obras do artista, os amantes que pairam sobre as nuvens, “porque eles não são afetados pela força da gravidade, dado que o amor nos faz flutuar”.

O universo onírico das pinturas do artista se traduz para seus poemas, uma faceta menos conhecida de sua obra -30 deles foram traduzidos do francês pela primeira vez para a exposição, por Saulo di Tarso. Até então, só havia em português uma única poesia de Chagall, traduzida por Manuel Bandeira.

Ao invés de tentar compreender sua escrita, talvez seja aconselhável se aproximar dela com o sentimento. Em um dos poemas, escreveu -“Os meus sonhos eu escondi / sobre as nuvens / meus suspiros / voam com os pássaros”.

MARC CHAGALL: SONHO DE AMOR
Quando De 8/2 a 22/5; de qua. à seg., das 9h às 20h; fecha ter.
Onde Centro Cultural Banco do Brasil – r. Álvares Penteado, 112, São Paulo
Preço Grátis
Link: https://ingressos.ccbb.com.br/exposicao-marc-chagall-sonho-de-amor__611

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