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Bolsonaro não seria ameaça sem reeleição, diz Fernanda Montenegro, eleita para ABL

Os imortais, como os acadêmicos são chamados, não dão uma palavra antes do pleito -e às vezes nem depois dele

FolhaPress

04/11/2021 18h20

Pedro Martins
RIBEIRÃO PRETO, SP

As eleições da Academia Brasileira de Letras são pautadas pelo sigilo e pelo mistério. Os imortais, como os acadêmicos são chamados, não dão uma palavra antes do pleito -e às vezes nem depois dele. Mas Fernanda Montenegro parecia já saber que seria eleita para ocupar a cadeira de número 17, que pertencia a Affonso Arinos de Mello Franco, morto no início do ano passado.

Embora humilde, cerca de uma hora antes da eleição sua fala se confundia, com verbos conjugados ora no subjuntivo, ora no passado, ao ser questionada sobre o que poderia trazer de novo à academia. “Preciso esperar ser aceita. Só vou sair de dentro da casa daqui a três ou quatro meses, quando acontecerá a posse. Agora fui aceita, mas não tenho a posse”, afirmou, em entrevista por videoconferência, de seu apartamento no Rio de Janeiro.

Confusão verbal à parte, ela tinha razão. Entre os 35 imortais, 32 votaram a seu favor. Dois votaram em branco e um se absteve ou votou nulo, num imbróglio que a academia ainda está averiguando. Não precisou nem cortejar os imortais, como é de costume nos meses que antecedem a eleição. É uma aposta arriscada, pode-se dizer. Não deu certo para Conceição Evaristo, por exemplo, que tampouco fez o cortejo e recebeu apenas um voto, ao tentar se eleger em 2018.

“Eu me inscrevi e me ausentei. Não dei entrevista, não cavuquei espaço nem temperei uma chegada. Isso não me compete. Me propus e saí de cena. Como atriz, meu papel é me preparar. Só se entra em cena quando chega a hora.” Agora que as cortinas acabaram de se abrir, a atriz talvez possa começar a matutar seu papel na academia. Ela sabe que uma das principais tarefas que rege os encontros dos imortais, atualmente híbridos entre o mundo de carne e osso, é o debate.

A diferença é que ela não se furta de tornar seu debate público, diferente do que os outros membros normalmente fazem. À reportagem, não poupou críticas ao presidente Jair Bolsonaro, tampouco ao ex-presidente Lula, ao discutir o cenário político do Brasil e a corrida eleitoral que se aproxima.

“Tudo está em extrema desgraça porque existe a reeleição”, diz. “Estamos vivendo um momento complicadíssimo, porque um quer continuar e outro quer voltar. Esse horror quer continuar, e o outro, apesar de ter sido bastante interessante, quer voltar. Mas com quem? Com o quê? Com qual atendimento político honesto e sadio, sem ter que comprar votos para continuar, por exemplo?”, questiona ela. “Para ser reeleito, vale entregar a pátria, tirar o prato de comida de um desamparado, vale deixar que não tenham água encanada para se lavar desse vírus, vale não ter onde defecar porque não tem nem onde morar.”

“Eu espero um jovem candidato, sem as heranças negativas que nos trouxeram para este sufoco. Não nego a importância dos governos que precederam este monstro, a partir de Itamar. Mas este homem só está aí porque não se fez o que precisava ser feito. Não se fez um pouco mais, e não se fez em função de uma reeleição. O grande ganho político que poderíamos ter no Brasil seria o fim da reeleição presidencial.”

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