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Brasília

Prejuízo por fraude na Secretaria de Saúde pode passar de R$ 2,2 bilhões

Arquivo Geral

29/11/2018 15h58

Promotores de Justiça detalham a operação. Foto: Jéssica Antunes/Jornal de Brasília

Jéssica Antunes
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O prejuízo estimado das fraudes em contratos na Secretaria da Saúde do Distrito Federal pode ultrapassar os R$ 2,2 bilhões. São dezenas de contratos firmados por Ata de Registro de Preços, geralmente com justificativas de urgência e emergência, sob a suspeita de causarem o rombo nos cofres públicos da capital. Somente uma licitação, de R$ 19 milhões, levou dois ex-secretários da pasta para a prisão. Segundo o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), compras eram feitas privilegiando empresas privadas vinculadas ao Grupo Iskin, alvo na Operação Lava  Jato. Em estoque, há órteses e próteses pouco relevantes até 2056.

Segundo a investigação da força-tarefa de combate à corrupção na Saúde, deflagrada pela Comissão de Combate à Corrupção do MPDFT, a Secretaria de Saúde do DF (SES) correu para aderir à ata de aquisição de órteses e próteses que estava prestes a vencer no Rio de Janeiro.

Em tempo recorde, no fim de dezembro e no meio das festas de Ano Novo de 2012, o GDF fez uma série de procedimentos com justificativas genéricas para conseguir fechar o contrato dois dias antes do fim do prazo, que era um domingo, 6 de janeiro. Luiz Henrique Ishihara, promotor de Justiça, diz que chamou a atenção que, em uma sexta-feira, foram praticados 17 atos em várias repartições da pasta, o que seria fora da rotina usual do Executivo. Na época, o DF era proibido legalmente de aderir a valores de outros estados.

A ata era com uma empresa fantasma ligada grupo Iskin, que mais de uma vez veio à tona como integrante principal de um esquema criminoso de fraude de licitações no Rio de Janeiro durante a gestão do ex-governador Sérgio Cabral (MDB). Representantes e funcionários foram alvos de duas outras operações na capital fluminense, “Ressonância” e “Fatura Exposta”, desdobramentos da Lava Jato. Cerca de 10% do valor dos contratos era direcionado à organização criminosa.

“Identificamos vários processos suspeitos e trabalhamos em muitas vertentes. Muito ainda está sob sigilo. A operação deflagrada hoje foi uma ata de registro de preço que em sua observação atenta, é possível constar que foi integralmente fraudado pela empresa Hmed, situada no Rio de Janeiro, que faz parte do cartel liderado por Miguel Iskin”, explica Ishihara. O contrato que motivou a deflagração da “Conexão Brasília” equivale a R$ 19 milhões em valores atualizados.

“A justificativa geralmente era de urgência e emergência, mas já se sabe que não é verdade. Em 2013, diversas órteses e próteses foram adquiridas sob esse termo. Em 2015, os materiais ainda estavam estocados nos hospitais do DF. Há próteses e órteses compradas até 2056, mas sabemos que não são as mais utilizadas e necessárias. Enquanto isso, faltam materiais para áreas mais sensíveis. As pessoas que atuaram nesses processos foram pautadas por outros interesses que não o público”, afirma Luiz Henrique Ishihara.

O promotor de Justiça e coordenador da força-tarefa garante que “durante determinado período a SES comprou pouco ou quase nada visando o interesse público, o bem-estar dos cidadãos do DF, mas se privilegiando das empresas privadas”. Ele revela que chegou ao ponto de as empresas apontarem o que e quanto deveria ser contratado pela SES.

Prisões

Dois ex-titulares da Secretaria de Saúde estão entre os presos. Rafael Barbosa e Elias Miziara comandaram a secretaria durante o governo de Agnelo Queiroz (PT). Ao todo, foram 44 mandados de busca e apreensão são cumpridos no DF, no Rio de Janeiro e em São Paulo, além de 12 de prisão preventiva. Os investigados são suspeitos de cometerem crimes de peculato, corrupção ativa e passiva, fraude em licitação e organização criminosa.

Elias Fernando Miziara e Rafael Barbosa. Foto: Valter Campanato/ABr

Advogado do ex-secretário Elias Miziara, Joelson Dias disse que nem ele nem o cliente tiveram acesso ao processo e só se pronunciará após obtê-lo. “Miziara é médico de reconhecida reputação profissional no DF e jamais teve qualquer condenação criminal ou outro ilícito julgado em definitivo que pesasse contra ele. Todo o processo corre em segredo de Justiça”, afirmou ao Jornal de Brasília.

A reportagem tenta contato com o representante de Rafael Barbosa. Os dois foram levados para a Departamento de Polícia Especializada (DPE), ao lado do Parque da Cidade, e ainda não foram ouvidos. Para os promotores, o poder decisório cabia aos secretários de Saúde. “As ilegalidades são flagrantes. Presume-se que eles sabiam. A adesão à ata de registro de preço possibilitou a execução de fraudes na saúde pública do DF”, diz Ishihara.

De acordo com o promotor Flávio Andrade, as investigações continuam. Em dez dias, deve-se concluir as apurações do contrato específico para seguir em busca de informações de outros processos administrativos e atas de registros de preços.

Nas casas dos investigados, foram apreendidos documentos, dispositivos eletrônicos, objetos de grande valor como joias, e armas de fogo — uma, inclusive, sem registro. A sede da SES também foi visitada pelos investigadores, que levaram processos administrativos. Os investigadores não encontraram até o momento elementos probatórios que indicam participação ou conhecimento de ex-governadores do DF no esquema.

No Rio de Janeiro, um dos alvos é o ex-secretário de Saúde do governo Cabral. Sérgio Cortês é acusado em quatro fases da operação da Lava Jato, por integrar um esquema milionário de fraude à licitação, corrupção e lavagem de dinheiro exportado para outras unidades da Federação.

Foto: Myke Sena/Jornal de Brasília

Veja a lista de alvos de mandados de prisão:

Distrito Federal:
1) Edcler Carvalho Silva, diretor comercial de uma empresa que vende produtos hospitalares
2) Rafael de Aguiar Barbosa, ex-secretário de Saúde do DF
3) Elias Fernando Miziara, ex-secretário de Saúde do DF
4) José de Moraes Falcão, ex-subsecretário de Saúde do DF
5) Renato Sérgio Lyrio Mello, ortopedista, ex-coordenador de Ortopedia da Gerência de Órteses e Próteses da Secretaria de Saúde do DF
6) Vicente de Paulo Silva de Assis, ex-diretor da Diretoria de Assistência Especializada (Diase) da Secretaria de Saúde do DF

Rio de Janeiro:
1) Miguel Iskin, presidente do Grupo Iskin, um dos principais fornecedores de equipamentos médico-hospitalares
2) Gustavo Estellita Cavalcanti Pessoa, sócio do Grupo Iskin
3) Marco Antonio Guimaraes Duarte de Almeida, do Grupo Iskin
4) Marcus Vinícius Guimarães Duarte de Almeida, do Grupo Iskin
5) Gaetano Signorini, Grupo Iskin
6) Márcia de Andrade Oliveira Cunha Travassos, Grupo Iskin.

O site do Grupo Iskin diz que a empresa fundada em 1942 é “referência latino-americana em distribuição de material médico-hospitalar”, com “sólidas relações com clientes e fabricantes”.

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