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Brasília

Ex-esposa acusa negligência por morte de aluno da UnB

Arquivo Geral

25/06/2018 15h18

Foto: João Stangherlin/Jornal de Brasília

Jéssica Antunes e Tainá Morais
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A ex-mulher do estudante da Universidade de Brasília (UnB) encontrado morto no fim de semana acusa negligência. Diagnosticado com esquizofrenia há quatro anos, Jiwago Henrique de Jesus Miranda, 33 anos, não conseguia pegar os medicamentos controlados na Farmácia de Alto Custo e não teve qualquer amparo da instituição. Em surto, ele passou a viver nos corredores e porões do campus Darcy Ribeiro. O corpo do homem é velado na tarde desta segunda (25).

Chef de cozinha Vanice Silva Dantas, 47, contou ao Jornal de Brasília que o marido só deixou a casa porque estava em surto. Ela diz que os dois viviam juntos com os dois filhos de seis anos até o medicamento Olanzapina deixar de ser fornecido pelo Governo de Brasília, um ano atrás.

Para manter o tratamento, eles teriam que pagar R$ 600 por cada caixa. “Ele simplesmente chegou, colocou as roupas em um saco de lixo e disse que iria morar na Universidade de Brasília (UnB), que era como se fosse ‘mãe’ pra ele”, diz a mulher.

Procurada, a Secretaria de Saúde informou que o medicamento Olanzapina faz parte da lista de medicamentos fornecidos pelas Farmácias Especializadas (Alto Custo), onde não consta registro de solicitação do medicamento pelo paciente.

Em clima de indignação, Vanice Silva Dantas fala em negligência da UnB e do governo. Foto: João Stangherlin/Jornal de Brasília

Vanice diz que já esperava que isso poderia acontecer a qualquer momento, pois o marido estava em situação de vulnerabilidade. A chef conta que havia pedido assistência da universidade, mas teria recebido resposta negativa. “Não fizeram nada”, lamenta.

“Ele dormia em um porão na Colina, onde moram também alguns professores, e eu previa meu marido morrendo naquele lugar. O que aconteceu com ele não passa de crueldade”, afirma.

Ainda sem respostas para o ocorrido, o corpo de Jiwago é velado na capela 7 do Cemitério Campo da Esperança, na Asa Sul, sob forte clima de indignação. A previsão é que ele seja sepultado às 16h desta segunda-feira (25).

Corpo de Jiwago Miranda é velado nesta segunda-feira. Foto: Kleber Lima/Jornal de Brasília

 

Câmeras, iluminação, segurança

Jiwago estava desde 2009 na comunidade acadêmica da Universidade de Brasília (UnB). Nesse período, segundo a instituição, ele recebeu auxílio socioeconômico e acompanhamento psicossocial. Familiares e parentes contam que o estudante tinha histórico de problemas de saúde mental e teria sido diagnosticado com esquizofrenia há quatro anos.

O corpo do aluno foi encontrado por um segurança da UnB no sábado (23) em uma área não edificada, um corredor ecológico entre a L3 e a L4 Norte. Ele estava com um ferimento do lado direito da cabeça, possivelmente causado por golpe de uma pedra ensanguentada encontrada nas imediações.

O local é uma área verde a norte do campus Darcy Ribeiro e passaria por alvo de rondas diurnas. A UnB emitiu nota lamentando o ocorrido. A instituição diz que, apesar das dificuldades orçamentárias, há investimento no aumento da segurança desde 2017. A iluminação foi melhorada e 350 câmeras, instaladas.

A Administração Superior da UnB ainda esclareceu ao JBr. que, na região da Colina, onde moram professores, servidores e alunos, próximo ao local onde o corpo do estudante foi encontrado, houve instalação de postes e a colocação de asfalto em estrada antes de terra. No local, o mato é alto e a iluminação ainda precária. “Ressaltamos que o campus ocupa grande área na Asa Norte e é aberto, o que traz desafios adicionais em relação à segurança”, afirmou a instituição, em nota.

Corpo de estudante foi encontrado próximo à Colina, na UnB. John Stanrgerlin/Jornal de Brasília

A investigação do crime é realizada pelas equipes da 2ª Delegacia de Polícia Civil, na Asa Norte. A principal hipótese é que o homem tenha sido vítima de homicídio. “A Universidade aguarda o esclarecimento das circunstâncias da morte por parte das autoridades policiais e solidariza-se com amigos e a família do estudante, a quem está prestando assistência”, finalizou a entidade.

A Administração do Departamento de Filosofia também se pronunciou. “Estamos absolutamente consternados e indignados com as circunstâncias que parecem cercar esse trágico acontecimento”, diz o documento. A esperança é que a história permaneça “como um exemplo capaz de ensinar futuramente as nossas universidades a demonstrar maior sensibilidade”. A universidade decretou luto por três dias e as atividades do departamento estão suspensas.

Consternação

Entre os corredores da Universidade, o clima é de incredulidade e consternação. A impressão é que todos conheciam Jiwago, mesmo que alguns nunca tenham falado com ele. O rapaz assistia aulas durante o dia e perambulava durante a noite pelo campus, onde morava. Ele incomodava, segundo colegas de instituição, especialmente nos últimos tempos. A colegas, teria dito que não se medicava há dois anos. Gritava, cantava, conversava sem linha de raciocínio específica.

Marcelo Glaeser, 22 anos, conta que a vítima ficava pelos corredores “em outro mundo”. “Ele era gente boa. Muito inteligente, tinha muita informação. Era uma enciclopédia ambulante, mas muito aleatória porque não conseguia desenvolver uma ideia. Incomodava alguns pela insistência, mas nunca vi passar do limite”, conta.

Colega de curso, Alisson Oliveira, 20 anos, conhecia Jiwago apenas de vista. “Ficamos chocados com a notícia e por saber que ele morreu na UnB. Sabíamos que ele tinha dependência química e problemas psicológicos, mas não sabíamos a proporção que isso chegaria”, diz. De acordo com ele, o incômodo ocorria quando, em surto, a vítima ficava agressiva. “Ele estava terminando o TCC (trabalho de conclusão de curso), entretanto o destino não permitiu”, lamenta. O estudante de filosofia acredita em negligência da instituição, que passou por cortes na área de segurança recentemente.

Jiwago Miranda. Reprodução/Facebook

Passagens pela polícia

O nome de Jiwago consta em duas ações penais no site do Tribunal de Justiça do DF. Uma delas é referente a violência doméstica, aberta em 2016, quando a ex-mulher foi vítima. A outra, de 2017, é sobre furto. Ele chegou a ser preso em flagrante e teve a liberdade provisória concedida, mas foi condenado a um ano e seis meses, a serem cumpridos em regime semiaberto.

A sentença foi proferida em outubro do ano passado por pegar o celular da vítima e sair correndo em uma madrugada na universidade. Ele poderia recorrer em liberdade e nem chegou a dar entrada no Sistema Penitenciário, de acordo com a Secretaria da Segurança Pública e da Paz Social.

Memória

Em março de 2016, outro assassinato nas dependências da universidade chocou Brasília. A estudante de biologia Louise Ribeiro, 20, foi morta após ser dopada com clorofórmio dentro de um laboratório. Colega de curso e ex-namorado, Vinícius Neres foi preso e condenado a 23 anos de prisão por homicídio em júri popular. Segundo as investigações, o rapaz prendeu e as mãos da menina, enrolou o corpo dela em um colchão inflável e levou o corpo até uma área de cerrado no Setor de Clubes Norte.

 

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