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Brasília

O caminho para um recomeço

Mostra de fotografias de Antonello Veneri retrata percurso de migrantes venezuelanos no Brasil

Mayra Dias

29/09/2021 7h57

Antonello Veneri

Foto: Divulgação

“O público poderá olhar para os retratos e se inserir numa espécie de troca visual e humana. Eu mesmo, de tanto olhar para as fotografias, às vezes acho que até consigo falar com as pessoas retratadas”, brinca o italiano Antonello Veneri, fotógrafo cujo trabalho, a partir de amanhã, estará exposto no Centro Cultural Banco do Brasil de Brasília (CCBB). As imagens foram registradas com o propósito de destacar o percurso de pessoas refugiadas e migrantes da Venezuela no Brasil.

Intitulada Acolhidos, a exposição contará a história real de pessoas que atravessaram a fronteira em Roraima nos últimos anos em busca de oportunidades para reconstruírem suas vidas em um novo país. “Nesta viagem, encontrei pessoas maravilhosas. Venezuelanas e venezuelanos que, muitas vezes, levam consigo histórias dramáticas junto de uma força e um desejo de recomeçar que emociona”, compartilha o fotógrafo.

Antonello ficou entre os meses de junho e julho trabalhando na produção da mostra. Cruzou a fronteira com a Venezuela, percorrendo as cidades de Boa Vista e Pacaraima, em Roraima — locais que marcam a chegada dos venezuelano; passou por Brasília, além de Concórdia e Seara, no Oeste catarinense. “Percorri mais de 16.000 km. De Roraima cheguei até Santa Catarina”, relembra.

Dentre todas as histórias que ouviu, ele destaca a de Affonso, um senhor de mais de 60 anos que, na Venezuela, era professor de economia e deixou tudo para trás para recomeçar uma nova vida no Brasil. “Agora, ele mora e trabalha em Brasília. Tenho muito orgulho de ter encontrado seres humanos tão humanos”, comenta Antonello.

De acordo com o artista, o trabalho oferece uma imersão no cotidiano de pessoas que carregam histórias surpreendentes de superação, além de eternizar uma longa viagem, feita de estradas e de tristezas, de dignidade e de muita esperança. É, como ele defende, a história de quem não se rende e vai em busca do que faz sentido. “Estamos vivendo um período de grandes migrações no mundo e, dentro destas longas viagens de superação, são os rostos, através dos retratos, os que marcam. Cada olhar é um presente”, desenvolve o fotógrafo que também se intitula um migrante acolhido pelo Brasil.

Passar do ato de fotografar até a exposição, como conta Veneri, foi um processo muito complexo e estimulante. Ele salienta que a curadora da exposição, Benedetta Fontana, o ajudou bastante organizando uma viagem-percursos dos venezuelanos por meio de quatro fases: a do acolher, do proteger, do promover e do integrar. “Na exposição, terá um ‘percurso deste percurso’, onde estarão expostas mais de 120 fotos em grandes formatos, expostas em um espaço educativo onde o público poderá interagir com a mostra”, acrescenta.

Projeto Acolhidos

A ideia da produção desse material, segundo revela Antonello, não nasceu sozinha. Ela faz parte do projeto social Acolhidos, implementado há dois anos pela Associação Voluntários para o Serviço Internacional Brasil (AVSI Brasil) e Instituto Migrações e Direitos Humanos (IMDH). “Começamos a trabalhar juntos em 2015 quando, em Minas, fotografei unidades prisionais que aplicam a metodologia APAC. Tratam-se de presídios diferenciados que promovem a dignidade da pessoa e que humanizam o sistema prisional”, esclarece o profissional. Este trabalho de documentação, inclusive, contou com uma grande exposição, chamada Do amor ninguém foge, que rodou o mundo inteiro.

O projeto Acolhidos visa, entre outras ações, apoiar a interiorização de refugiados e migrantes venezuelanos que estão em centros de acolhida, em Boa Vista (RR), para outras cidades brasileiras, onde há oportunidades de trabalho. Estima-se que, atualmente, há cerca de 8 mil venezuelanos abrigados em Roraima. “A migração dos venezuelanos, pro Brasil e para os outros países é a maior da América Latina. Tínhamos que contar tudo isso e a AVSI me deu esta oportunidade”, diz o italiano.

A exposição, como acredita Antonello, contará como o projeto busca facilitar a integração socioeconômica dessas pessoas. “O que eu acho muito importante é que uma parte deste projeto apoia também a população brasileira mais vulnerável”, pontua. A proposta atua com a população brasileira em situação de vulnerabilidade e a inserção no mercado de trabalho.

Desde que foi implementado, o Acolhidos intermediou a interiorização de 1.084 venezuelanos de Roraima para nove estados brasileiros, incluindo o DF, sendo que 519 migrantes foram contratados por empresas parceiras. Cada pessoa contratada pode levar seus familiares para um novo recomeço na cidade de acolhida, e estes contam com acompanhamento social e moradia nos três primeiros meses após a contratação.

O Acolhidos é financiado pelo Bureau de População, Refugiados e Migração (PRM) do Departamento de Estado dos EUA, com o objetivo de fortalecer as ações da Operação Acolhida, força-tarefa liderada pelo Governo Federal, em resposta à crise humanitária na Venezuela. A iniciativa conta com o apoio institucional da Casa Civil da Presidência da República, da Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) e de entidades da sociedade civil que atuam no refúgio e na migração.

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