Eric Zambon
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O 8º Fórum Mundial da Água tem estreitado relações internacionais e servido como vitrine de tecnologias do Brasil, que recebe o evento pela primeira vez, e de Brasília, escolhida como a cidade-sede. Ademais, tem permitido aos donos de iniciativas de diferentes partes do País entrarem em contato e ensaiarem colaborações.
No estande da Eletrobras, ontem, o engenheiro goiano Lucas Machado, da Cooperativa Casa do Cerrado, se impressionou com a maquete do projeto representado pelo analista ambiental de Furnas do Rio de Janeiro Ronaldo Alves. O modelo, que reaproveita entulho e pneus para criar um ciclo de uso do esgoto de banheiro a fim de irrigar o próprio jardim da residência, é testado em Minaçu (GO), onde Machado também atua.
“Achei fantástico e, conversando, vimos que ele aplicava o modelo na mesma cidade. Foi uma coincidência e agora vamos tentar unir as duas ideias”, animou-se Machado, que passou vários minutos entendendo o sistema proposto, similar a iniciativas já utilizadas na Embrapa e na Emater. Alves, envaidecido, elogiou o Fórum por permitir esse tipo de conexão.
“As pessoas acham que nossa função é só gerar energia, mas há um mundo de coisas envolvidas. Aqui dá para mostrar o que a empresa faz”, exaltou. Segundo ele, representantes do Senegal, cuja capital Dakar será a próxima sede do evento, se interessaram pelas propostas, assim como israelenses. “Naquele inglês primitivo a gente acabou se entendendo”, brincou.
Ainda com a crise hídrica bufando no cangote, o presidente da Companhia de Saneamento Ambiental (Caesb), Mauricio Luduvice, ressaltou que, além do combate ao problema, outro apelo do estande da empresa era o Lago Paranoá. “Foi o primeiro lago tropical urbano a ser recuperado no mundo. Há 20 anos, estava poluído e hoje é multiuso”, enalteceu.
Segundo ele, houve interesse também pelas medidas para mitigar os efeitos da crise na cidade, como o rodízio e a operação das estações de tratamento. “Estamos com uma série de visitas agendadas e muitos estão curiosos”, garantiu.
Do lado de cá, Luduvice disse olhar com carinho para o exemplo de Israel: com condições áridas, a semelhança de Brasília, mas com uma situação mais extrema, tanto geográfica quanto politicamente. “A realidade deles é de água muito escassa. Mas não significa que não possamos aprender”, justificou.
Espaço de reivindicações nacionais
O Fórum foi espaço para reivindicações costumeiras, mas reforçadas pelo caráter internacional do evento. A coordenadora de projetos da Fundação SOS Mata Atlântica, Malu Ribeiro, aproveitou o espaço de debate no estande do Brasil, na entrada da estrutura montada no estacionamento do estádio Mané Garrincha, para criticar a política nacional de preservação.
“Discutimos com vários países – e dialogamos com comunidades tradicionais, sociedade civil e a elite – sobre como a gestão das florestas e da água no País é desrespeitada hoje no nosso Parlamento”, disparou, em um painel composto ainda pelo deputado federal Alessandro Molon (PSB) e representantes do Governo Federal.
A ativista relembrou o passado de exploração do pau-brasil, desde o desbravamento da terra, há mais de 500 anos, para contextualizar a mentalidade extrativista que impera na atualidade. “Perdemos a cultura da abundância de recursos e substituímos a consciência por obras de engenharia”, alfinetou.
No fim do quarto dia de Fórum Mundial da Água, cujo encerramento acontece amanhã, personalidades ilustres, como a candidata a presidente Marina Silva (Rede), prestigiaram o lançamento do documentário Água Que Vem do Céu, dirigido por João Amorim e apresentado pelo ator Marcos Palmeira.
Saiba mais
Dakar, que receberá a próxima edição do Fórum Mundial da Água em 2022, é uma cidade com abundância de recursos hídricos, mas problemas severos de saneamento básico. Não à toa, os enviados do Senegal ao evento têm se interessado pelas iniciativas brasileiras, coreanas e japonesas de tratamento de água residual.
O Ministério Público brasileiro lançou uma declaração sobre o direito a recursos hídricos, que será tema do próximo Fórum. O documento fala sobre cumprimento das funções ecológicas da água e até da preservação da cultura de povos indígenas que envolvam rios e mananciais.