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Questão de Direito
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Caso Lula – implicações da possível parcialidade do ex-juiz Sérgio Moro

A possível declaração de parcialidade de Sergio Moro pelo STF implicará no reconhecimento da nulidade dos processos da operação lava-jato

Marilene Carneiro Matos

11/03/2021 15h32

Ex-presidente Lula. Foto: Miguel SCHINCARIOL / AFP

Foto: Miguel Schincariol/AFP

Em histórica decisão, o Ministro do STF Edson Fachin declarou a incompetência da Vara Federal de Curitiba de todos os processos do ex-presidente lula resultantes dos trabalhos da operação Lava-jato, remetendo o feito para julgamento pela Vara Federal de Brasília. Dentre os processos, havia o relativo ao tríplex do Guarujá já julgado em segunda instância, que acabou por ocasionar a inelegibilidade de Lula no pleito presidencial de 2018, além de sua prisão pelo período de 580 (quinhentos e oitenta) dias, até que sobreveio decisão da Corte que declarou a inconstitucionalidade da prisão antes de esgotados todo e qualquer recurso a ela relativo, ou seja, antes do trânsito em julgado da decisão penal condenatória.

Importante fazer a ressalva de que a decisão do Ministro não inocenta o ex-Presidente. Apenas declara que o Juízo de Curitiba não era competente para julgar a causa e sim a Vara Federal de Brasília. Em momento algum, o julgador adentrou o mérito das acusações que pesam contra Lula.

Neste contexto, uma importante questão que se assoma é quanto a afirmações constantes dos veículos de comunicação, no sentido de que a decisão do Ministro constitui uma tentativa de “salvar os trabalhos da operação lava-jato”. Isso porque, ao declarar a incompetência do Juízo de Curitiba, Fachin declarou também a perda do objeto de vários Habeas Corpus nos quais a defesa do ex-presidente questiona a imparcialidade do ex-juiz Moro quando da sua atuação jurisdicional no caso.

Em outras palavras, a incompetência territorial da vara federal de Curitiba, nos feitos de interesse de Lula preservam os demais processos relativos à operação Lava-jato. Já a declaração de parcialidade do juízo implica no reconhecimento da nulidade de todos os atos por ele produzidos, o que poderia levar à invalidação de todos os processos conduzidos no âmbito da operação lava-jato e consequente imprestabilidade das provas naquele âmbito produzidas.

Os efeitos práticos da declaração de parcialidade do então juiz Sérgio Moro, acaso reconhecida, são de extrema gravidade não só se considerar-se os recursos públicos financeiros e materiais despendidos desde o início dos trabalhos da força-tarefa da operação lava jato, em 2014. Há que se levar em conta, ainda, a devolução de valores astronômicos bloqueados de empresas e pessoas envolvidas, sendo que parte deste montante foi utilizada em providências relativas à pandemia. Ademais, a caso reconhecida a parcialidade do ex-juiz federal de Curitiba, com a anulação dos processos da lava jato, pode-se ter como consequência a soltura dos condenados no âmbito da operação, dentre eles o ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha.

Então, não há como se negar os graves impactos sociais que a anulação dos trabalhos da operação lava jato acarretaria na sociedade brasileira. Além disso, tal decisão tem o potencial de impactar negativamente na credibilidade do Poder Judiciário, com efeitos nefastos à segurança jurídica.

Entretanto, a despeito da decisão de Edson Fachin de que ficam prejudicadas por perda do objeto as ações que visam a análise da parcialidade de Moro, ousamos discordar deste ponto de vista. Isso porque, ao declarar a incompetência do Juízo de Curitiba, Fachin determinou que as provas ali constituídas poderiam ser convalidadas pelo juízo de Brasília. Ou seja, se o magistrado de Brasília decide pela validade das provas produzidas por Curitiba, remanesce para a parte interessada, no caso, Lula, o interesse jurídico em ver decidida a questão da parcialidade, afinal, como validar provas produzidas por juiz que tem interesse na causa?

Ademais, a parcialidade, pela seriedade que ostenta quanto a diversos princípios constitucionais, mormente os princípios do contraditório, da ampla defesa e do Juiz Natural, acaba sendo matéria de ordem pública, a qual pode ser arguida a qualquer momento e grau de jurisdição. Nessa linha, a questão da ausência de imparcialidade de Moro pode e deve ser discutida e decidida pelo Poder Judiciário, sob pena de, para evitar-se impactos pragmáticos da possível parcialidade, render homenagem a práticas ilegais no seio de processos judiciais, com efeitos também deletérios à segurança jurídica e a credibilidade do Judiciário.

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