Por Dr. Carlos Augusto de Medeiros
Não é novidade que a exposição das nossas vidas pessoais cresceu de modo exponencial com a internet e, mais especificamente, com o advento das redes sociais. Muitas pessoas anônimas, pelo que expunham (seus corpos, receitas culinárias, vídeos de humor, tutoriais de maquiagem, avaliação de instrumentos musicais etc.), adquiriram status de celebridades ou de subcelebridades.
Pessoas que já eram celebridades, como músico(a)s, atore(rize)s ou modelos, passaram a utilizar as redes para se manterem em evidência. O que começou como uma brincadeira ou uma forma de exercer a vaidade, se tornou um aspecto da vida profissional dessas pessoas, com impactos gigantescos em suas carreias e em sua vida financeira. A máxima “quem não é visto não é lembrado” ganhou contornos de um mandamento bíblico. Sem citar que o número de visualizações, de curtidas, comentários e repostagens repercute financeiramente, não só por remuneração pelos anunciantes, como também, pelas plataformas em si.
Mas o que mostrar? O que queremos que vejam de nós? Qual face desejamos expor?
O antigo não tão antigo ditado “não tem feio no Facebook” foi substituído pelo “não tem feio no Instagram”; mas a lógica é a mesma. Tendemos a mostrar fotos de viagens e lugares maravilhosos, brindes com espumante em festas glamorosas, melhores ângulos em roupa de banho passeando em uma lancha etc. Além disso, vemos constantes declarações de amor exageradas. Do tipo “amor para a toda a vida”; “razão da minha existência”; “luz do meu ser” entre outras.
Os casais tendem a reportar as suas relações como perfeitas. Os parceiros se descrevem como perfeitos um para o outro. Fotos de viagens, jantares, cafés da manhã em camas suntuosas, passeios e beijos apaixonados. Essas vidas de contos de fadas de nosso(a)s herói(oína)s nos são encantadoras. Nos passam a impressão de que podemos e devemos ser felizes desse jeito. Desejamos aquilo para nós e aquela vida é um ideal para se buscar. Obviamente, esses contos de fada são explorados comercialmente de diversos modos. Pessoas mais atentas tenderão a ver com maior ceticismo as relações maravilhosas mostradas nas redes, o que não impede o desejo de viver o mesmo.
Uma implicação muito séria para a felicidade das pessoas de modo geral é estabelecimento de padrões de sucesso profissional e amoroso absolutamente irreais. A comparação é praticamente inevitável. Se a minha vida amorosa não é daquele jeito, então ela é fracassada. Não sou amado(a) suficiente ou não amo o suficiente. Se não tenho aquela aparência (geralmente modificada por uma alimentação incompatível com a vida cotidiana, por horas insanas na academia, por maquiagem, por filtros e por programas de edição de imagem) sou feio(a) e nunca vou arrumar alguém que me ame. E o pior, só terei valor como pessoa e serei feliz se tiver o sucesso que vejo nas redes.
Saiba mais
Padrões inalcançáveis = frustração
Recebo frequentemente em meu consultório pessoas que tentam atingir padrões inalcançáveis de sucesso profissional, amoroso e acadêmico e que sofrem demasiadamente por não atingi-los. E elas não os atingirão por duas razões. Em primeiro lugar, os resultados das nossas ações não dependem apenas de nós e sim de incontáveis aspectos sobre os quais não temos controle. Em segundo lugar, porque não existem, ou pelo menos, não existem do jeito que são mostrados.
Os ideais de sucesso amoroso e profissional mostrado nas redes sociais frequentemente são desmascarados, com histórias de traição, separação, demissões e falência. Nesse momento, somos confrontados com a realidade. O mais surpreendente é que as traições, separações e falências de celebridades também vende. Quanto acontecem, são expostos ao extremo, utilizando-se a desgraça para capitalizar do mesmo jeito que o sucesso. Mas não há o que temer, outra carreira meteórica ou outro casalzinho perfeito vão surgir e o nosso ideal de sucesso será mantido.
Como conclusão desse texto, fica a reflexão do que consumimos nas redes. Será que o que me é mostrado é real? Será que aquilo funcionaria para mim? Será que eu seria feliz daquele jeito? Principalmente, precisamos refletir sobre o significado de não termos aquela vida. Nos compararmos com os outros já nos atrapalha muito a sermos felizes, agora, a comparação com faz de contas é a receita para o sofrimento.