Menu
Fala, Torcida
Fala, Torcida

Manipulação

Casos de manipulação vêm chamando a atenção no futebol nacional, e a popularização das casas de apostas criam suspeitas a respeito

Thiago Henrique de Morais

24/03/2023 10h41

Foto: Pexels

Coincidência ou não, a chegada das casas de apostas em solo brasileiro tem aumentado de forma abrupta o número de casos de manipulação de resultados no futebol local. Durante esta semana, o Jornal de Brasília divulgou que o país lidera o ranking mundial de mais jogos suspeitos de venda de partidas no ano passado. A empresa Sportradar não informou se os casos envolvendo times da Série B do Brasileiro, que se tornaram uma ação penal após denúncia do Ministério Público de Goiás, estão entre os jogos suspeitos.

Em sua maioria, os apostadores utilizam os jogos de divisões inferiores ou de campeonatos estaduais com pouca visibilidade, como no Distrito Federal. Em 2021, o Samambaia foi alvo de uma investigação em meio a máfias de manipulação de resultados. Uma vitória por 6 a 1 sobre o Formosa e uma derrota por 8 a 1 para o Ceilândia, em um período de uma semana, chamaram a atenção das investigações. O time acabou rebaixado naquela temporada. No ano seguinte, os jogadores do Paranoá teriam sido assediados por parte de intermediários para entrar num esquema irregular semelhante.

O primeiro caso foi justamente no momento em que os torcedores estavam impedidos de ir ao estádio, em função da pandemia, o que abriu caminho para que poucos suspeitassem de casos de manipulação de resultados. Lembro-me de um caso referente a esse torneio. À época, enquanto esperava notícias de um familiar na porta de um hospital do Gama, ouvi dirigentes falando abertamente sobre o caso. Fiquei espantado. Quando um dos cartolas viu que eu estava ouvindo a conversa, eles mudaram de assunto. Como não trabalhava com esportes naquela época, nem dei muita atenção. Contudo, dias depois, o caso acabou vindo a público. Ainda assim, nada foi levado adiante.

Os campeonatos estaduais ajudam nisso, assim como as divisões de acesso regionais. Um caso recente que está na mira da Justiça e da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) ocorreu no Acre. Quatro times daquele estadual são suspeitos de articularem resultados, expulsões e até mesmo escanteios. São Francisco, Adesg, Atlético-AC e Andirá seriam os envolvidos. Um dos jogos, inclusive, aconteceu pela Copa Verde, no duelo entre Atlético-AC 3×6 São Francisco.

Voltemos aos números da Sportradar, que são assustadores. No Brasil, 152 partidas em todo o país estão na lista de suspeitos de manipulação. O Brasil está à frente da Rússia (92), República Tcheca (56), Cazaquistão (43), China (41), Grécia (40), Argentina (39), Filipinas (37), Polônia (36) e Tailândia (35). A grande maioria dos jogos envolvidos são de times da segunda divisão para baixo, já que não existe um forte apelo da mídia e do público, uma caixa de presentes para os apostadores.

Claro que as casas de apostas ajudam nesse cenário, mas não é culpa delas. Os casos de manipulações de resultados são algo antigo. No Brasil, em 2005, tivemos o maior escândalo da história, com 11 partidas suspensas após o escândalo da ‘Máfia do Apito’, que tinha como principal nome o árbitro Edilson Pereira de Carvalho. Mas perto dos arcabouços, isso é recente. O falecido jornalista inglês Andrew Jennings, em seu livro ‘Jogo Sujo’, revelou diversas histórias que envolviam a Fifa. Assim como a biografia de Wilson Raj Perumal, no título ‘O Submundo do Futebol’, em que um dos maiores manipuladores de resultados do mundo escreveu com diversos detalhes de como funcionavam os esquemas e a negociação com os jogadores, na época em que as apostas eram feitas apenas por telefone. Se naquele período era fácil contactar jogadores, imagine nos tempos da tecnologia da informação? Exemplo disso foi o assédio sofrido por um jogador do Paranoá, pelo Instagram, para participar do esquema.

Por mais que exista a ambição da regulamentação e taxação das casas de apostas, essa prática de manipulação não será coibida. Essa é apenas a ponta do iceberg. Até porque essas empresas de apostas são apenas uma forma mais fácil de articular o resultado das partidas. É importante que haja um trabalho conjunto entre as autoridades esportivas, as autoridades policiais e as próprias casas de apostas para combater a manipulação de resultados no futebol. Só assim será possível garantir a integridade do esporte e a confiança do público nos resultados das partidas.

    Você também pode gostar

    Assine nossa newsletter e
    mantenha-se bem informado