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Envelhecer é uma arte
Envelhecer é uma arte

Enfim, um novo ano. Viva!

Juliana Gai

08/01/2023 5h00

Atualizada 06/01/2023 21h41

Foto: Divulgação

Olá, leitores! Estou muito feliz de estar de volta ao Jornal de Brasília em 2023. A movimentação em minha vida profissional tem sido grande desde dezembro. Então fiquei em dívida com o cumprimento da minha coluna semanal, pela qual tenho muito carinho. Mas, as férias passaram, as coisas estão se organizando e eu estou aqui!

Ontem estava de papo na internet com alguns amigos e amigas com os quais ainda não tinha conversado após a virada do ano, desejando um ano incrível para todo o mundo e trocando sonhos e planos para 2023. Estas trocas são sempre muito grandiosas. A amizade é mesmo a melhor coisa da vida e ter amigos que nos conhecem e possam “levantar o nosso astral”, relembrando uma história engraçada do passado, não tem preço mesmo. Quanto mais anos de amizade, melhor. O tempo nos melhora! E a amizade verdadeira consegue mostrar, em histórias, o que nos recusamos a ver, tão imersos em padrões sociais e estéticos de “certo e errado”.

A cada virada de ano, nós somos confrontados com nós mesmos! Fato da vida. Algumas pessoas ficam até cabisbaixas nos últimos dias do ano porque refletem – até demais – e se cobram – até demais. Há até uma tal de “síndrome depressiva do final de ano”, ou “dezembrite”, como alguns profissionais de saúde mental costumam chamar. Não me lembro de isto ter um CID (o número no Código Internacional de Doenças), mas a síndrome é válida como entidade clínica.

Mas por que isto acontece? Vocês saberiam me dizer?

Acho que desta pergunta sairiam muitas e muitas respostas, inclusive uma que casa com o texto que publiquei em novembro, que é sobre encontrar familiares não tão amorosos e generosos quanto gostaríamos na festa de Natal [risos]. Mas isto não é a principal causa, eu apostaria que não.

Na minha opinião de estudiosa do envelhecimento humano, eu arriscaria em dizer que a causa é, justamente, a própria passagem do tempo! Não é mole confrontar o espelho todos os anos. Não é mole sentir o colágeno se esvaindo e muitos sonhos ficando para trás, muitas metas não atingidas, e a gente envelhecendo.

A maturidade é mágica. Mas também nos faz perceber mais profundamente as escolhas erradas que nós fazemos na vida. Todos nós! Seja porque cedemos às paixões humanas tão típicas da existência. Seja porque, sei lá o que acontece que, às vezes, tendemos à insensatez. Dessas escolhas que vem toda a angústia do final de ano: o encontro do resultado das escolhas com a figura cada vez mais enrugada no espelho!

Eu sofro com a angústia de ter deixado meu doutorado para cuidar da minha filha, nascida em 2013. Todos os anos eu olho no espelho e confronto aquela mãe, cada vez mais velha, que não terminou o doutorado. Sim, mesmo sendo terapeuta, eu tenho as minha próprias dores e frustrações. Eu as aceito. Mas, depois, eu as liberto, de boa. E dou graças ao meu caminho.

Vocês compreendem que nem tudo na vida da gente acontece da maneira que planejamos? Dá para entender que não temos tanto controle assim quanto imaginamos ter? Dá para se perdoar mais por ainda não ter absolutamente tudo o que sonhou? Dá para valorizar mais o ser do que o ter? Dá pra entender que a jornada é que vai nos aprimorando como seres humanos e não, diretamente, as conquistas? Dá para entender que conquista é uma palavra que pode ter múltiplos significados?

O significado que mais gosto está no Dicionário Michaelis: “Conquista: conjunto das manobras, estratégias, procedimentos etc. levados a efeito no processo de conquistar”. Ou seja, as manobras que vamos executando na vida vão, inevitavelmente, gerar um efeito, uma conquista. E vamos amadurecer com o efeito. E, em algum momento, vamos entender o real sentido de gratidão, outra palavra interessante.

Tenhamos paciência com os resultados das nossas manobras. A esperança de vida só cresce no mundo. E, se a gente se cuidar direitinho, há chances reais de a gente viver bem e por muito tempo. E, neste tempo, cometeremos mais erros, nos arrependeremos de alguns e outros vamos engolir mais facilmente. Também vamos aprender a escolher melhor e teremos mais chances de acerto. Não devemos desistir de conquistar, daí sim a vida perderá sentido.

A vida é feita de erros e acertos. Raramente um grande empresário, por exemplo, vai te contar que nunca faliu ou esteve a beira da falência porque cometeu algum erro. Pois bem, a vida é empreender o tempo inteiro! E, em alguma coisa no caminho entre o início e o fim, nós vamos acertar muito! Há, sim, quem não acerte nunca no amor idealizado, por exemplo. Mas vai viajar para aquela viagem dos sonhos. Vai, aos 44 minutos do segundo tempo de vida na terra, conhecer um companheiro interessante e viver os três meses que valerão a sua existência. Vai comprar a casinha no sítio em Minas Gerais e se mudar para o campo com seus livros, seus discos, seus gatos… Vai passar no vestibular com 50 anos e ser o melhor profissional…

Acho fundamental aprendermos a olhar para o conjunto de manobras mais do que para o resultado final. Dançar conforme a música é uma arte! Viver bem é manobrar bem o volante da vida. E as pessoas mais felizes são as que aprendem a “fazer limonada dos limões”, como diz o ditado. Elas são imparáveis, indestrutíveis, eternas.

Meu querido paciente Sr. Rivera, escritor, poeta, tradutor e professor, um dia, me ensinou uma preciosa lição. Ele sobreviveu inúmeras vezes a doenças e internações e costumava me contar suas histórias hospitalares sempre rindo, dizendo que curtia “o passeio pela vida”, enquanto fazíamos caminhadas pela asa sul para o exercício dele. Ele me ensinou que para fazer limonada dos limões basta a gente desejar fazer. E qualquer decisão é movimento. E movimento é vida! Ficar parado chorando com os braços cheios de limões não ajuda ninguém.

Se a limonada ficar tão azeda que você não consiga beber, terá valido o exercício físico de espremer os limões, que deixou seus braços mais fortes e mais preparados para caso de, em algum momento, caírem outros limões no seu colo. A pessoas idosas adoram contar suas histórias de superação porque elas gostam de saber que ajudam as pessoas mais jovens a entender que a vida não é um gráfico linear em constante ascensão. Há altos e baixos.

Que possamos andar mais e mais em 2023! Que possamos curtir a caminhada assim como eu curtia andar em torno da 305 sul acompanhando o Sr. Rivera. Quando eu sugiro que meus clientes idosos andem na rua, eu sempre reforço; “olhe para os lados, olhe para o chão, olhe para os pássaros voando, vire-se e olhe para trás, isto tudo é bom para o seu equilíbrio corporal”. Realmente fazer isto enquanto andamos exercita um pequeno órgão chamado labirinto, lá no interior do nosso ouvido, o qual dispara sinais elétricos para que o cérebro desencadeie a cascata de reflexos de equilíbrio que nos mantém em pé.

Mas vamos transferir isto para a vida? A língua portuguesa é muito rica. Olhar para os lados pode ser “olhar para o outro”: pense que aparências podem enganar e que todo mundo tem suas frustrações, não é só a gente. Olhar para baixo pode ser “olhar para o que tem de ruim” no mundo e tentar melhorar as coisas ou, pelo menos, melhorar a si mesmo. Olhar para cima e acompanhar os pássaros pode ser “olhar para o que tem de bom e seguir com os olhos, movimentar-se, acreditar, voar com o coração”. Olhar para trás já é aceito como “olhar o passado”, mas sempre para aprender e evoluir, nunca para julgar. Olhar para frente é “olhar para o futuro”: que tenhamos esperança sempre!

E, enquanto o colágeno vai se esvaindo do nosso corpo, a gente vai ficando cada vez mais esperto, inteligente e apto a resolver problemas ao longo do caminho. Eu sei que dá saudade daquele romantismo todo da juventude. Eu já tenho saudade disso. Mas ser mais racional é libertador também.

Um viva à maturidade e um imenso viva a 2023!

Texto dedicado aos queridos Naly e José Rivera.

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