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Torcida

‘Haverá prejuízo, mas não acredito que será grande’, diz presidente do COB

O presidente da entidade admite que a previsão de despesas com o evento será ajustada para cima e que seu maior adversário no momento é o dólar

Redação Jornal de Brasília

02/04/2020 15h21

Rio de Janeiro – O presidente do Comitê Olímpico do Brasil (COB), Paulo Wanderley, fala à imprensa após reunião extraordinária com as confederações brasileiras olímpicas (Tomaz Silva/Agência Brasil)

O adiamento dos Jogos Olímpicos de Tóquio-2020 para 2021 foi comemorado pelo COB (Comitê Olímpico do Brasil), mas vai custar caro. O presidente da entidade, Paulo Wanderley, admite que a previsão de despesas com o evento (R$ 40 milhões) inevitavelmente será ajustada para cima e que seu maior adversário no momento é o dólar, que não para de subir por causa da pandemia do novo coronavírus – a moeda norte-americana fechou a quarta-feira valendo R$ 5,26 na cotação comercial, um recorde

Apesar disso, o ex-presidente da Confederação Brasileira de Judô (CBJ), que comanda o COB desde 2017, está aliviado com a decisão do Comitê Olímpico Internacional (COI) e do governo japonês de mudar a data do evento. Segundo ele, o novo cenário vai dar tempo aos atletas para fazer uma preparação adequada para os Jogos e à sua entidade para buscar novos patrocinadores.

Essa procura por mais dinheiro, aliás, será mesmo necessária. Afinal de contas, mais de 95% da receita total do COB para 2020 (R$ 322 milhões) sairia das loterias da Caixa Econômica Federal e é certo que, por causa do novo coronavírus, o volume de apostas vai cair. Ainda assim, e apesar da disparada do dólar, Paulo Wanderley diz em entrevista exclusiva ao Estado que a entidade está preparada para enfrentar a crise e que ela não deverá afetar o desempenho dos atletas brasileiros em Tóquio.

O COB já contava com o adiamento dos Jogos Olímpicos de Tóquio para 2021 ou essa decisão foi uma surpresa?

Fomos uns dos primeiros a dar a sugestão do adiamento. Nas Américas, fomos os primeiros a sugerir e era só isso mesmo o que poderíamos fazer, dar uma sugestão. Pedimos também que, em 2021, os Jogos ocorressem na mesma época em que ocorreriam neste ano (ente julho e agosto) e foi o que aconteceu. Isso foi muito importante para minimizar os prejuízos causados pelo adiamento. Evidentemente, recebemos muito bem a notícia, e os atletas também, não vi nenhum deles reclamando. É claro que há várias questões a serem resolvidas, como no caso do futebol masculino, que tem o problema do limite de idade (até 23 anos), não sei se isso será ajustado. Mas esse assunto não deve ser decidido por nós, nem mesmo pelo COI, quem resolve isso é a Fifa.

Em algum momento foi cogitado fazer a Olimpíada em outra época do ano?

Houve especulações sobre a realização dos Jogos no primeiro semestre para evitar o problema do calor no Japão, que é forte em julho e agosto, mas não ouvi isso de ninguém da organização. Creio que eles sempre pensaram em realizar o evento na mesma época do ano e eu não tenho a mínima dúvida de que essa foi a melhor decisão.

A mudança de data vai causar grande prejuízo financeiro ao COB?

Nós já contratamos fornecedores para atender às delegações, já havíamos mandado pessoas de logística ao Japão para cuidar da preparação para os Jogos, portanto é dinheiro que já foi gasto. E que terá de ser gasto de novo, porque vamos ter de mandar gente para lá novamente no ano que vem. Haverá prejuízo, sim, embora no momento não seja possível medir o tamanho dele. Mas não creio que será grande, não será nada capaz de nos levar a uma situação de insolvência.

O que faz você acreditar nisso?

Uma das maiores rubricas de investimento do COB para os Jogos foram as passagens aéreas, afinal de contas levaremos a Tóquio uma delegação formada por mais de 500 pessoas. O pagamento dessas passagens já foi efetuado e conseguimos negociar com a companhia aérea contratada (Air Canada) a manutenção total do acordo, apenas com a mudança das datas. Foi um espetáculo, e é claro que o fato de o local e a época do ano dos Jogos terem sido mantidos foi fundamental.

O prejuízo pode até não ser grande, mas é certo que o mundo viverá uma grave crise financeira quando a pandemia do coronavírus acabar. Isso não lhe preocupa nem um pouco?

É claro que todo gestor se preocupa com a economia, não dá para esconder isso. Todas as economias do mundo estão preocupadas. A nossa maior preocupação é com a alta do dólar porque isso impacta diretamente em passagens, estadia, alimentação, tudo é em dólar. O câmbio é a grande dor de cabeça para nós. Eu estou na torcida para que, quando a pandemia acabar, o dólar volte pelo menos ao patamar em que estava em outubro do ano passado, quando fizemos nosso planejamento financeiro para os Jogos. Algo em torno de R$ 4,20.

Se isso não ocorrer, ou seja, se o dólar continuar em um patamar superior a R$ 5 após a atual crise, o COB terá problemas graves?

Quando eu assumi a presidência, em outubro de 2017, foram adotadas medidas de controle, de otimização de custos, e isso nos deu a chance de nos preparar para um momento ruim. Temos contingenciamento, podemos aguentar uma diminuição de recursos graças à austeridade que foi implantada na entidade, mas isso não quer dizer que estejamos num mar de tranquilidade, é claro que existe preocupação.

É certo que a crise derrubará o volume de apostas nas loterias da Caixa, fonte vital de recursos para o COB. Isso será um grande problema para a entidade?

Eu sempre digo que o grande patrocinador do esporte olímpico brasileiro é quem aposta nas loterias da Caixa. Como as pessoas estão em casa, é natural que a arrecadação caia. E é claro que haverá uma influência negativa. Ainda não temos uma dimensão do impacto desse problema, mas haverá uma diminuição, sim.

O adiamento dos Jogos terá alguma influência na busca do COB por patrocinadores?

A prospecção por recursos é diária, temos gente no COB que trabalha exclusivamente na busca de novas fontes de receita. É claro que não será fácil, mas não perdemos a expectativa de conseguir algo até os Jogos. Por incrível que pareça, nesse aspecto o adiamento da Olimpíada pode ter um efeito positivo, pois teremos mais tempo para prospectar, para sensibilizar mais empresas a nos apoiar.

Você garante que, apesar dos problemas financeiros causados pelo coronavírus, os atletas brasileiros terão em 2021 exatamente as mesmas condições que teriam neste ano?

Não posso garantir nada, mas a intenção é essa, manter todos os projetos de intercâmbio, de assistência aos atletas, enfim, tudo o que estava programado para este ano.

Os critérios de classificação para os atletas que ainda não garantiram vaga no evento serão mantidos?

Estamos todos trabalhando dia e noite nessa questão. Segundo o COI, 57% das vagas dos Jogos já estão preenchidas e os donos dessas vagas estão garantidos para 2021, isso é certo. E os atletas que ainda não conseguiram se garantir vão entrar em processos classificatórios que serão definidos pelas federações internacionais. O Brasil, por exemplo, tem 178 lugares já confirmados e nós deveremos levar a Tóquio um número de atletas entre 250 e 280. A forma de preenchimento das vagas restantes será objeto de muitas discussões nos próximos dias, ainda estamos estudando se os critérios serão mantidos ou se será necessário fazer alguma adaptação.

No que se refere ao rendimento dos atletas, o adiamento será bom ou ruim para os Jogos?

Agora nós temos mais de um ano até os Jogos e os estudiosos terão, portanto, um tempo mais do que suficiente para reprogramar os treinamentos dos competidores. Sendo assim, se o adiamento tiver alguma influência nesse campo, será positiva. Agora os atletas terão um pequeno período de férias e, na sequência, poderá ser feita com calma uma nova periodização de treinos.

A mudança de data pode provocar alguma alteração no equilíbrio de forças dos Jogos? Algum país será especialmente beneficiado ou prejudicado?

Não, eu acredito que as grandes forças serão mantidas. Já sabemos quais são elas: os Estados Unidos, o Japão, a China, algumas poucas nações da Europa… O impacto para elas tende a ser maior do que para os demais países, mas elas também têm mais recursos para lidar com o problema. E os países pequenos vão contar com a ajuda do Solidariedade Olímpica, programa do COI que socorre comitês com menos recursos, então a relação de forças em Tóquio deverá ser a mesma de sempre.

Você acredita que o mundo verá no ano que vem uma Olimpíada tão boa quanto seria em 2020?

Tenho certeza de que Tóquio-2020 (o nome do evento foi mantido, apesar do adiamento) vai dar um ippon (golpe perfeito do judô, que encerra a luta) no coronavírus. Será o primeiro grande evento mundial depois dessa crise e tenho certeza de que será sensacional.

 

Estadão Conteúdo

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