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Dois anos após incêndio no Ninho, famílias esperam indenização do Flamengo

Uma destas famílias, a do goleiro Christian Esmério, prepara documentação para acionar o Flamengo na Justiça

Redação Jornal de Brasília

08/02/2021 9h29

Centro de treinamento presidente George Helal, conhecido com Ninho do Urubu, é utilizado pela equipe de futebol do Flamengo. Foto da bandeira destruída depois de um incêndio.

Alexandre Araújo
Rio de Janeiro, RJ

O incêndio no CT Ninho do Urubu, do Flamengo, completa dois anos nesta segunda-feira (8), com familiares de dois jogadores mortos ainda esperando uma indenização.

Uma destas famílias, a do goleiro Christian Esmério, prepara documentação para acionar o Flamengo na Justiça. Rosana de Souza, mãe de Rykelmo, por sua vez, aguarda os próximos passos do processo, que foi ajuizado em agosto de 2019.

O clube rubro-negro fechou acordos recentemente e chegou a nove resoluções em 11 tratativas. Com a família de Esmério, porém, não houve um denominador comum e a defesa, com a denúncia feita pelo MP-RJ (Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro) em mãos, prepara a ação.

No último dia 15, o MP-RJ denunciou à Justiça 11 pessoas pelo crime de incêndio culposo qualificado pelos resultados de morte e lesão grave, todas elas apontadas como responsáveis pela tragédia que vitimou dez garotos. Na lista de acusados está Eduardo Bandeira de Mello, ex-presidente do clube da Gávea.

“Estávamos esperando o inquérito para estarmos totalmente embasados e darmos entrada na ação, já que, infelizmente, já se passaram dois anos e não houve êxito em fazer o acordo da forma que fosse melhor para ambas as partes. O Flamengo ficou irredutível, mas, agora, com a conclusão, estamos, com as informações que temos, pontuando capítulo por capítulo para dar entrada com essa ação”, disse Arley Carvalho, advogado que defende a família de Esmério.

Rosana de Souza, por sua vez, aguarda o julgamento da ação realizada em agosto de 2019, quando a tragédia ainda completava seis meses. À época, foi pedido o indiciamento de Rodolfo Landim, presidente em exercício do Flamengo, e Rogerio Caboclo, presidente da CBF.

“As coisas continuam da mesma forma. O Flamengo não nos procurou. Agora, a única coisa que achei incrível foi que o mandado de citação da CBF foi negativo. Estou esperando voltar, ver porque deu negativo, procurar entender e sanar isso, tentar citá-los. Mas continua a mesma coisa, o descaso do Flamengo continua o mesmo”, pontuou a advogada Gislaine Nunes.

Pai de Christian Esmério, Cristiano Esmério não esconde que o dia 8 de fevereiro é uma data marcada por lembranças ruins. Ele, inclusive, gostaria de tirá-la do calendário.

“Vai ficar marcado para sempre na gente, mas vamos levando. Tenho outros filhos, que tenho de estar ao lado, dando apoio. É isso que me suporta. [Dia 8 remete à] Lembranças que não são agradáveis. Se pudesse apagar do calendário e não ter esse dia 8, para a gente seria melhor, mas, infelizmente, temos de conviver com a saudade”, disse ele, que afirmou que a família nunca esteve fechada às conversas com o clube.

“Tivemos uma conversa no ano passado e nada mais. Nunca nos fechamos ao Flamengo para conversar. Estamos aí para conversar a todo momento. Nunca teve entrave para nada. Deixa as coisas acontecerem.”

A conclusão do inquérito, para Cristiano, mostra que pode haver punição aos culpados pelo incêndio. “É um sinal de que algo está acontecendo. Que não aconteça a mais ninguém, a mais nenhuma família, algo deste tipo, e que os culpados paguem pelo que eles fizeram.”

Rosana, mãe de Rykelmo, se diz aliviada com a finalização do inquérito sobre o incêndio, mas faz um apelo para que o caso não caia no esquecimento. “Foi um alívio. Nós sabemos que houve culpado, não foi uma tragédia. Houve culpado, porque, se eles tivessem regularizado tudo, isso não teria acontecido.

Agora, se vão pagar… Queria muito que pagassem, mas acho que não vai acontecer nada. Mas, uma coisa eu falo, que fique de alerta aos pais e que não deixem esse caso cair no esquecimento”, pediu.

Com a morte do filho prestes a completar dois anos, a ausência de Rykelmo ainda é muito sentida por ela, que deixa transparecer a emoção. “Quem perdeu não consegue expressar a dor, o sentimento. Parece que eu ando no mundo da lua. Eu sinto falta dele em todas as coisas, vejo ele em alguns meninos pequenos. No futebol, principalmente quando o Flamengo está jogando, penso que podia estar vendo meu filho. Não era isso que a gente sonhava, queria. É um embrulho no estômago que não dá para falar de tão grande que é a dor da perda.”

Rosana entrou com um processo acionando Landim e Rogerio Caboclo, mandatários do Flamengo e da CBF, respectivamente, na Justiça. O pai de Rykelmo foi um dos primeiros a fechar acordo com o clube rubro-negro, mas sem a presença de Rosana.

“O meu caso está na mão de advogada porque entramos com um processo. Estávamos quase fechando um acordo, não sei o que cargas d’água o Flamengo fez com o pai do Rykelmo, que ele foi lá e fez um acordo, sem a gente presente. Foi onde entramos com o processo. Agora, estamos esperando porque veio a pandemia. O Flamengo não tem nos procurado porque fomos a única família que entrou com um processo. Agora, só ficou eu e o pai do Christian para terminar o acordo”.

Um dos indiciados pelo MP-RJ foi Eduardo Bandeira de Mello, que foi presidente do Flamengo por dois mandatos, entre 2013 e 2018. Segundo o ex-mandatário, porém, a denúncia contra ele é “injusta, sem fundamento e incoerente”.

Bandeira aponta que o MP-RJ ignorou os esclarecimentos que ele prestou durante o período de investigação e informações publicadas na imprensa.

“Reitero minha total solidariedade às famílias das crianças. Conforme tenho afirmado, a denúncia contra mim é injusta, sem fundamento e incoerente com a atuação do próprio Ministério Público junto ao Clube desde 2012, além de ter ignorado todas as informações prestadas ao longo desses dois anos pela defesa e reveladas pela imprensa. Em juízo, apresentaremos elementos que restabelecerão a verdade”, disse à reportagem.

Além do ex-presidente, Antonio Marcio Garotti (ex-diretor financeiro do Flamengo), Carlos Renato Mamede Noval (atual diretor de transição do clube), Marcelo Maia de Sá (ex-diretor de obras rubro-negro), Luiz Felipe Almeida Pondé (ex-engenheiro do Fla), Claudia Pereira Rodrigues (diretora da NHJ, fabricante dos contêineres), Weslley Gimenes (engenheiro da NHJ), Danilo da Silva Duarte (engenheiro da NHJ) Fabio Hilário da Silva (engenheiro da NHJ), Edson Colman da Silva (técnico de refrigeração) e Marcus Vinicius Medeiros (monitor) são os demais nomes.

Na ação ajuizada, o MP descreve irregularidades cometidas e aponta desobediência a sanções administrativas impostas pelas autoridades e descumprimento de normas técnicas regulamentares.

O órgão verificou irregularidades como “ocultação das reais condições ante a fiscalização do Corpo de Bombeiros, contratação e instalação de contêiner em discordância com regras técnicas de engenharia e arquitetura para servirem de dormitório de adolescentes, inobservância do dever de manutenção adequada das estruturas elétricas que forneciam energia ao aludido contêiner, inexistência de plano de socorro e evacuação em caso de incêndio e, dentre outras, falta de atenção em atender manifestações feitas pelo MPRJ e o MPT a fim de preservar a integridade física dos adolescentes”.

O MP rechaçou também a existência de fatores externos como as causas pela tragédia, culpando exclusivamente os responsáveis pelo clube. Na noite da tragédia, uma tempestade caiu sobre o local do CT, o que foi apontado por muitos como a causa para um eventual curto-circuito nos aparelhos de ar condicionado do alojamento provisório.

O Flamengo realizou, até aqui, 9 acordos com 11 negociações. Houve um denominador comum com as famílias de Arthur Vinicius, Pablo Henrique, Samuel, Athila Paixão, Bernardo Piseta, Gedson Santos, o Gedinho, Jorge Eduardo, Vitor Isaias, e com o pai de Rykelmo.

As informações são da FolhaPress

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