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Ayrton Senna já correu em Brasília

O tricampeão de F1, morto há exatos 30 anos, participou do Campeonato Brasileiro de Kart no Kartódromo do Guará, em 1977

Vítor Mendonça

01/05/2024 6h26

Hoje, completam-se 30 anos da morte daquele que foi um dos maiores pilotos brasileiros e do mundo. No dia 1º de maio de 1994, Ayrton Senna morreu em um acidente durante a prova da Fórmula 1 no Grande Prêmio de San Marino, em Ímola, na Itália. Após uma forte colisão com uma parede de concreto, o automobilista sofreu uma grave lesão craniana, levando-o a óbito na pista, aos 34 anos de idade.

Em Brasília, o automobilista marca o nome e a primeira participação da cidade dentro do Campeonato Brasileiro de Kart. O Kartódromo Ayrton Senna do Guará, batizado com o nome do piloto após a morte dele, também hoje, completa 48 anos.

Entre os dias 12 e 13 de fevereiro de 1977 – um ano após a inauguração do então apenas Kartódromo do Guará –, quando ainda não era o piloto mundialmente conhecido, Ayrton correu nas curvas do primeiro kartódromo de Brasília. A corrida de Senna no Guará foi a única passagem do piloto competindo na capital e o Jornal de Brasília documentou a presença do tricampeão da F1 na Região Administrativa, com publicação na edição de 15 de fevereiro daquele ano.

Segundo o relato dos mais antigos kartistas de Brasília, Ayrton se adaptou muito bem à pista quando chegou ao Guará para competir. Ele teria chegado com uma gama de motores e com o apoio do preparador, o espanhol Lucio Pascual Gascón, conhecido como “Tchê”. Senna era um dos favoritos ao título brasileiro de 1977 e chegou pressionando os demais competidores, mas não levou a melhor na capital.

Ayrton chegou em segundo, atrás do campeão do Campeonato Brasileiro de Kart daquele ano, Walter Travaglini Filho. Apesar do vice-campeonato no Guará, Senna fez a melhor volta de toda a competição, completando o circuito em 40,33 segundos na categoria de 100 cilindradas (CC) – mais rápido até que os karts mais potentes, de 125 cilindradas (CC). A segunda volta mais rápida foi um segundo mais lenta que a de Ayrton.

“Foi uma honra para nós ele ter passado por aqui, um dos nossos tricampeões”, afirmou Dibo Moisés, treinador de pilotos e presidente da Associação dos Pilotos de Kart e Associados de Brasília (Askart), que administra o espaço do kartódromo atualmente, amparado pela Secretaria de Esporte e Lazer do Distrito Federal.

Quem viu a corrida de 1977 de perto e chegou a competir em duas provas da segunda categoria do kart à época foi Raymundo Gurgel – atualmente um dos treinadores e instrutores do local. Gurgel foi o único no brasileiro a se classificar entre os seis primeiros competidores em duas categorias: 100 CC e 125 CC.

Segundo Gurgel, Senna já era um excelente piloto, mas agia e se comportava durante a competição como os demais automobilistas.

Raymundo Gurgel

“O espírito naquela época era de muito amor ao esporte. O automobilismo sempre foi muito forte em Brasília, desde a inauguração – o primeiro evento esportivo da capital foi uma corrida de carros”, afirmou. “O Guará nos presenteou com essa joia, que ainda não se imaginava o quanto seria importante para a história do kart e do automobilismo do Brasil.”

Pista técnica e reveladora

O Kartódromo Ayrton Senna do Guará revelou pilotos de destaque no cenário nacional e internacional, seja de kart, Fórmulas 1 a 4, Stock Car, Fórmula Indy ou outras competições renomadas. Alguns deles passaram pelo treinamento e supervisão do presidente da Askart, Dibo Moisés.

Nomes como os de Felipe Nasr, Nelsinho Piquet, Fernando Dias Ribeiro, Alex Dias Ribeiro, Roberto Pupo Moreno, Vítor Meira, Lucas Foresti, Gustavo Lima, Enzo Elias, Rafael Reis e Pedro Clerot – o mais recente destaque do automobilismo brasileiro – estão entre os que começaram e desenvolveram a carreira nos karts e nas curvas da pista brasiliense.

A razão para Brasília revelar talentos vem da performance que a pista exige dos pilotos que correm nela. Desenhada por Claudio Blois Duarte, arquiteto e designer industrial da cidade, a pista puxa os pilotos à concentração máxima em todos os momentos da corrida, sem grandes retas para economizar energia. “Ela tem curvas de inclinação, curvas de raio fechado, raio longo. […] O esforço e os reflexos [da pista], guardadas as devidas proporções, são comparáveis à F1”, disse.

“Tem uma entrevista do Senna falando sobre o kart, sobre como é importante o treinamento para o condicionamento do piloto com o kart. O primeiro piloto atleta foi ele, porque os outros não se dedicavam ao preparo físico, aos reflexos, como o Senna à época – focavam muito na mecânica”, destacou Dibo.

Para ele, o kartódromo é um patrimônio de Brasília. “Faz parte da minha vida. […] Esse kartódromo é fundamental pela formação de vários pilotos, tanto a nível de Brasil quanto mundial. Brasília está muito bem representada”, destacou Dibo. “Os mais novos que chegam aqui se inspiram com o Ayrton Senna, mas também com o Nelson Piquet, que foi fundamental para o kartismo aqui”, complementou.

“Quem corre aqui, corre em qualquer lugar”, acrescentou Raymundo Gurgel. “O Kartódromo do Guará é uma referência de pilotos, que crescem e que têm uma condição técnica muito elevada em relação às outras pistas, porque tem uma pista extremamente exigente em termos de concentração e de esforço físico. Aqui tem uma história fabulosa dentro do automobilismo brasileiro. É um formador de pilotos.”

Um esporte honroso

Para Tadeu Santos, piloto de kart em Brasília, a paixão pelo automobilismo começou no início dos anos 90 com o início dos karts indoor (praticados em ambientes fechados) após o convite de um amigo para conhecer a modalidade. “Eu vi aquele carrinho, dei umas voltas e a partir daquele momento fui pego pelo bichinho da cadeira elétrica do kart”, brincou.

Um outro amigo falou do Kartódromo do Guará, com karts de competição. “Eu vim dar uma volta e estou aqui há 20 anos desde então”, afirmou. “O kart é um esporte muito competitivo e como o próprio Senna falava – que era um grande incentivador do kart –, é uma mini Fórmula 1, uma coisa fantástica de se guiar. A gente vê as crianças de 6, 7 e 8 anos andando como gente grande, os pais vibrando e a renovação da própria categoria através desses meninos. Muitos saíram daqui para a Fórmula 1.”

Conforme relatou, ainda hoje nos bastidores das corridas o nome de Senna é levantado – até mesmo pelas crianças e adultos que não tiveram a oportunidade de ver o tricampeão correr na F1. “Pegando filmagens da época de crianças, todas queriam ser ele. Então o Ayrton foi realmente um impulsionador do esporte a motor no Brasil e em Brasília também”, acrescentou Tadeu.

O esporte competitivo, cuja disputa dos competidores é pelos décimos de segundo, continua inspirando o competidor, que ainda corre nas categorias de altas cilindradas. De acordo com ele, a pista é realmente cansativa, em razão dos ângulos das curvas. “É preciso saber realmente guiar [o carro] nela para tirar o melhor do kart.”.

“Teve uma corrida de uma determinada época que fiz em que eu larguei em décimo lugar. Entre eu e o primeiro lugar, eram nove pilotos, e a nossa diferença era de um segundo. Dentro de um segundo tinham nove carros, para se ver o quanto que é competitivo. Em um piscar de olhos, tem 10 carros na sua frente. É fora de série”, comentou.

O treinador Dibo destaca ainda a necessidade de valorização do Kartódromo, que está quase completando 50 anos. De acordo com o presidente da Askart, o que é ensinado no kart vai além das técnicas para correr mais rápido nas competições. Ele defende que há ainda um papel educador no esporte, uma vez que lida também com as emoções e com a responsabilidade individual e coletiva dos pilotos.

“O Kartódromo Ayrton Senna representa para muita gente a formação do piloto, com caráter, personalidade, disciplina, determinação. Tira a garotada do mundo das drogas e cria um outro regramento de vida, uma nova perspectiva. E há valores de saber ganhar, saber perder, respeitar regras, cumprir horários. Isso é fundamental e eu acho que na formação de hoje, nos tempos em que estamos vivendo, tudo isso agrega muito”, finalizou.

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