Menu
Política & Poder

Presidente do BC vai a ministros do governo Lula para pedir reajuste a servidores

As reuniões foram incluídas na agenda pública de Campos Neto, que esteve de férias de 11 a 27 de janeiro. Procurado, o BC não quis comentar

FolhaPress

03/02/2023 22h38

Foto: Sergio Lima / AFP

Idiana Tomazzelli e Nathalia Garcia
Brasília, DF

No mesmo dia em que o Banco Central subiu o tom dos alertas sobre riscos fiscais, em um duro recado à gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o presidente da instituição, Roberto Campos Neto, encontrou-se com membros do primeiro escalão do governo para defender reajustes salariais aos servidores do BC.

Pouco depois do término da reunião do Copom (Comitê de Política Monetária), que decidiu manter os juros básicos em 13,75% ao ano, Campos Neto esteve, separadamente, com as ministras Esther Dweck (Gestão e Inovação) e Simone Tebet (Planejamento e Orçamento) para debater o tema. Os encontros ocorreram na noite de quarta-feira (1º).

Segundo relatos colhidos pela reportagem, a concessão de reajustes e a realização de novos concursos para carreiras do BC foram os principais assuntos da reunião com o Ministério da Gestão. No Planejamento, o tópico também foi abordado dentro de um cardápio mais amplo de temas.

As reuniões foram incluídas na agenda pública de Campos Neto, que esteve de férias de 11 a 27 de janeiro. Procurado, o BC não quis comentar.

De acordo com fontes do governo, Campos Neto elencou uma série de entregas do BC, entre elas o Pix, sistema de pagamentos instantâneos lançado em novembro de 2020 e que teve rápida adesão da população, para valorizar a categoria.

O presidente da autoridade monetária citou ainda recentes aumentos concedidos a carreiras do Legislativo e do Judiciário, além da existência de um bônus para servidores da Receita Federal e de honorários de sucumbência a advogados da União —penduricalhos que turbinam os salários dessas categorias.

A remuneração da diretoria do BC também foi alvo da discussão colocada por Campos Neto.

Segundo os relatos, o presidente da instituição disse enfrentar dificuldades para recrutar novos nomes para repor a saída de diretores, pois o salário é considerado baixo para um mandato de quatro anos.

Como mostrou a Folha de S.Paulo, Campos Neto iniciou conversas com agentes do mercado financeiro em busca de um novo nome para o cargo de diretor de política monetária. O mandato do atual titular, Bruno Serra Fernandes, termina em 28 de fevereiro. Ele poderia ser reconduzido por mais quatro anos, mas não deve permanecer.

O presidente e os diretores do BC têm hoje um salário de R$ 17.327,65 mensais. Antes da autonomia formal da instituição, sancionada em fevereiro de 2021, Campos Neto tinha status de ministro e ganhava quase o dobro: R$ 30.934,70 por mês.

Desde 1º de janeiro de 2023, ministros de Estado recebem R$ 39.293,32 mensais, graças ao aumento do teto remuneratório federal e a um decreto legislativo estendendo a medida ao alto escalão do Executivo.

Segundo fontes do governo, o presidente do BC não chegou a apresentar uma proposta concreta de reajuste durante as conversas com as ministras.

Em maio do ano passado, a instituição causou mal-estar ao enviar ao Ministério da Economia, então comandado pelo ex-ministro Paulo Guedes, uma proposta de MP (medida provisória) para conceder reajuste salarial de 22% aos servidores a partir do mês seguinte e incluindo uma reestruturação de carreira.

A proposta também previa aumentos de 78,5% no salário de Campos Neto, voltando aos R$ 30.934,70, e de 69,6% na remuneração dos diretores, para R$ 29.387,96.

Uma MP tem validade imediata, ou seja, os reajustes seriam aplicados antes mesmo do aval do Congresso Nacional. A praxe na discussão de reajustes de carreiras é encaminhar o tema via projeto de lei.

Na época, o envio da minuta irritou a equipe de Guedes, pois o governo anterior avaliava uma proposta de reajuste linear de 5% a todos os servidores —que acabou nem saindo do papel. Mas a proposta do BC jogou mais lenha na fogueira das discussões.

Diante da má repercussão, a autoridade monetária retirou a minuta do sistema no mesmo dia do envio, alegando “inconsistências”.

“O Banco Central detectou inconsistências no texto de minuta de medida provisória para a reestruturação das carreiras e a modernização da gestão de pessoas nesta autarquia. Por isso, fez sua retirada do Sistema de Geração e Tramitação de Documentos Oficiais do Governo Federal (Sidof)”, comunicou na ocasião.

O tema não voltou a ser discutido e, no segundo semestre, cedeu espaço para outras duas propostas relacionadas a pautas não salariais.

A reportagem questionou o BC para saber se essa proposta será mantida ou modificada, mas não obteve resposta sobre este ponto.

Na primeira reunião do Copom sob o governo Lula, a instituição elevou o tom dos alertas sobre as incertezas fiscais. O BC relatou ver piora nas expectativas de inflação, que estão se distanciando da meta em prazos mais longos, e sinalizou manutenção dos juros no patamar atual por mais tempo —o mercado prevê o início do afrouxamento monetário em setembro.

Uma das principais fontes de incerteza é o desenho da nova regra fiscal que balizará o rumo das contas públicas brasileiras, ainda em gestação no Ministério da Fazenda. O formato será decisivo para ditar a trajetória futura da dívida pública e sua sustentabilidade.

Por outro lado, Campos Neto também é pressionado pela corporação de servidores do BC.

Na tarde desta sexta (3), ele se reuniu com membros das entidades sindicais –Sinal (Sindicato Nacional dos Funcionários do Banco Central do Brasil), ANBCB (Associação Nacional dos Analistas do Banco Central do Brasil), e SinTBacen (Sindicato Nacional dos Técnicos do Banco Central do Brasil).

De acordo com participantes da reunião com os sindicatos ouvidos pela reportagem, o presidente do BC disse ter defendido no encontro com a ministra da Gestão duas propostas de MP, uma sobre reestruturação de carreira e outra sobre bônus por produtividade institucional, e ter ficado com uma boa impressão das conversas com o novo governo.

Na próxima terça-feira (7), haverá uma assembleia dos servidores organizada pelo Sinal para transmitir as informações do encontro para a categoria e decidir os próximos passos.

Segundo relatos, Campos Neto não é a primeira autoridade a buscar o Ministério da Gestão em defesa de reajustes.

O aumento salarial a servidores públicos é uma das promessas de campanha de Lula, que pretende abrir mesas de negociação com as categorias. Até o momento, porém, o Orçamento reserva apenas R$ 11,6 bilhões para reajustes a servidores do Executivo.

Em janeiro, o petista sancionou um aumento parcelado de 18% nos salários de ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), o que eleva o teto remuneratório do funcionalismo dos atuais R$ 39.293,32 para R$ 41.650,92 a partir de 1º de abril de 2023, R$ 44.008,52 em 1º de fevereiro de 2024 e R$ 46.366,19 em 1º de fevereiro de 2025.

No BC, as reivindicações por recomposição salarial e reestruturação de carreira interferiram na rotina da autoridade monetária em 2022. A insatisfação levou a categoria a cruzar os braços de abril a julho, com uma trégua na greve de duas semanas.

A principal demanda da categoria era um reajuste salarial de 27%. No BC, analistas recebem um salário bruto mensal em torno de R$ 19 mil a R$ 27 mil, enquanto a remuneração de técnicos varia aproximadamente de R$ 7.500 a R$ 12,5 mil.

Quanto à pauta não salarial, os funcionários pleiteavam mudança na nomenclatura de cargos –de analista para auditor, por exemplo– e exigência de nível superior para ingresso como técnico do BC, entre outras prerrogativas.

Também estava entre os pedidos a criação de um bônus por produtividade institucional, cuja regulamentação depende da diretoria do BC, e a correção no valor de benefícios, como auxílio-alimentação.

A greve chegou ao fim com a negativa do governo federal de reajuste ao funcionalismo público no ano passado.

    Você também pode gostar

    Assine nossa newsletter e
    mantenha-se bem informado