Menu
Política & Poder

Passagem de comando no Exército ignora 8 de janeiro e cúpula tenta mostrar união após princípio de crise

O sinal foi repassado durante a passagem de comando do Exército, cerimônia em que Arruda repassou a chefia da Força Terrestre

FolhaPress

07/02/2023 16h19

TEN. FERRENTINI / COMANDO MILITAR DO LESTE

O Exército usou a passagem de comando nesta terça-feira (7) para tentar demonstrar internamente que a coesão e o espírito de corpo do generalato não foram afetados, apesar do princípio de crise iniciado com a demissão do general Júlio César de Arruda e as críticas que o Alto Comando da Força tem recebido pela relação dos militares com o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

O sinal foi repassado durante a passagem de comando do Exército, cerimônia em que Arruda repassou simbolicamente a chefia da Força Terrestre ao general Tomás Paiva –escolhido pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para mudar as orientações aos militares e punir aqueles que participaram dos ataques de 8 de janeiro.

Além de todo o Alto Comando do Exército, participaram da cerimônia ex-comandantes e generais da reserva, como Villas Bôas e Hamilton Mourão, eleito senador pelo Republicanos do Rio Grande do Sul.

O ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira também participou da cerimônia, em sua primeira participação em eventos oficiais do Exército após a condução considerada por generais como errática na fiscalização das Forças Armadas no processo eleitoral.

No evento, a invasão às sedes dos Três Poderes e a forma como o Exército conduziu os acampamentos golpistas em frente aos quartéis-generais não foram citadas nos discursos, segundo relatos de quatro generais consultados pela reportagem.

Uma das principais dúvidas no governo seria o tom que Arruda daria em seu discurso. Após sua demissão, em janeiro, o general convocou uma reunião extraordinária do Alto Comando do Exército –ação entendida entre assessores palacianos como uma tentativa de Arruda de buscar apoio entre os pares, além de embutir uma ameaça velada.

Arruda, porém, fez longo discurso destacando a trajetória de 48 anos no Exército, com elogios ao ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, que o demitiu. Generais disseram que o ex-comandante saiu pela porta da frente, diferente do que ocorreu na Marinha, quando o almirante Almir Garnier deixou o comando da Força Naval sem entregar o cargo.

A cerimônia de passagem de comando foi mais restrita que o comum. A justificativa apresentada internamente é que o general Júlio César de Arruda ainda se recupera de uma cirurgia realizada no fim de janeiro, o que o impediria de participar de evento que o exigiria maior interação física.

A troca foi realizada no quartel-general do Exército, em Brasília, com a tradicional passagem da réplica da espada de Duque de Caxias, o patrono da Força.

Arruda foi demitido do comando do Exército após protagonizar uma série de desentendimentos com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e sua equipe. Os casos geraram uma “crise de confiança”, segundo o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro.
As críticas a Arruda começaram antes mesmo de sua escolha. Durante a transição, quando Múcio decidiu promover os oficiais-generais mais antigos ao comando das Forças Armadas, petistas reclamaram a Lula sobre o perfil do general.

Ele é formado como forças especiais, a tropa de elite do Exército, uma das áreas mais influentes na carreira militar, conhecida pela rigidez de suas posições.

Antes de ser empossado, Lula já era aconselhado por aliados a escolher o segundo ou o terceiro mais antigo do Exército, Valério Stumpf ou Tomás Paiva, respectivamente. O segundo também é forças especiais, mas tem traquejo político conhecido por interlocutores do PT.

Tomás era chefe de gabinete do comandante Villas Bôas quando o general publicou um tuíte dizendo, na véspera do julgamento do habeas corpus impetrado por Lula no STF (Supremo Tribunal Federal), que repudiava a “impunidade”.

Também pesava contra ele o fato de ter sido o comandante da Aman (Academia Militar das Agulhas Negras) em 2014, quando Bolsonaro aproveitou o fim de uma formatura para fazer campanha política aos cadetes.

Apesar das partes consideradas pelo PT pouco atrativas no currículo, o general construiu boa relação com Fernando Henrique Cardoso quando foi seu ajudante de ordens na Presidência, o que ajudou a quebrar resistências. Ainda é reconhecido por interlocutores petistas como legalista e moderado.

Desde que assumiu o comando, Tomás adotou postura diferente do antecessor. Sua primeira decisão foi negociar com o ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), tenente-coronel Mauro Cid, a suspensão de sua nomeação para o comando de uma tropa de elite do Exército em Goiânia (GO).

A resistência de Arruda a encontrar uma solução para a situação de Cid, investigado pela PF (Polícia Federal) e indiciado em dois inquéritos, foi a gota d’água para sua exoneração.

Tomás ainda articulou para antecipar a troca no comando do BGP (Batalhão da Guarda Presidencial), que ocorreu no fim de janeiro, e a chefia do Comando Militar do Planalto.

As duas funções lidam diretamente com a segurança do Palácio do Planalto, e seus comandantes sofreram críticas de Lula e ministros pelos ataques contra as sedes dos Poderes em 8 de janeiro.

Ao assumir a função, Tomás também se comprometeu a avançar com as investigações contra militares que tenham participado dos atos golpistas e buscar a responsabilização.

Neste sentido, o comandante teve agenda com uma série de figuras importantes do Judiciário e Ministério Público Militar nas últimas semanas, como a presidente do STF, ministra Rosa Weber, o ministro Mauro Campbell (Superior Tribunal de Justiça), o ministro Paulo Dias de Moura Ribeiro (STJ), o subprocurador Marcelo Weitzel Rabello de Souza (Ministério Público Militar) e o procurador-geral da Justiça Militar, Antônio Pereira Duarte.

Tomás também deu ordem para os generais que compõem o Alto Comando do Exército reforçarem a comunicação com as tropas, para manter o controle sobre toda a cadeia de comando e expurgar possíveis ideias que promovam insubordinação de oficiais em meio à politização e às sucessivas trocas de comando.

    Você também pode gostar

    Assine nossa newsletter e
    mantenha-se bem informado