Eric Zambon
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O cálculo feito para decidir os 24 deputados distritais que ocuparão a Câmara Legislativa é complexo e o modelo cria distorções. No último pleito, a parlamentar Luzia de Paula, eleita pelo Patriotas (ex-PEN) e hoje no PSB, conquistou uma cadeira com pouco mais de 7 mil votos. Ela não só foi a menos votada entre os colegas de plenário, como recebeu menos votos do que 24 outros candidatos das eleições de 2014. Daria para eleger uma nova Câmara só com eles.
Como ter uma boa base não é suficiente, 16 destes 24 mudaram de partido em busca de composições favoráveis. Para ter pelo menos uma vaga, o partido precisa atingir um número mínimo de votos, somando todos os seus candidatos. Em 2014, esse número mínimo foi de 63.549 votos por coalizão.
Portanto, de nada adianta o candidato ter 20 mil votos para distrital, resultado parecido com o do mais votado nas últimas eleições, Júlio César (PRB), se na sua coligação houver três ou quatro com 21 mil ou 22 mil. Um postulante do grupo vizinho com 10 mil votos pode se eleger se na chapa dele os votos estiverem mais pulverizados e sua colocação interna for boa.
O campeão dos sem-mandato do último pleito, Guarda Jânio, saiu do PRTB para o PROS justamente por este motivo. O ex-policial de trânsito recebeu 14,9 mil votos em 2014, ficando à frente de 11 nomes eleitos, mas foi prejudicado por integrar uma nominata em que Liliane Roriz e Juarezão, ambos do PRTB à época, puxaram a preferência do eleitorado com 16,7 mil e 15,9 mil votos respectivamente.
Este ano, o PROS não coligou para distrital e Jânio acredita ter mais chances de levar uma cadeira na disputa com os outros dois nomes fortes da legenda: Delegado Fernando Fernandes e a candidata à reeleição Telma Rufino. Ambos tiveram cerca de 3 mil votos a menos do que Jânio nas eleições passadas. “A mudança foi favorável no sentido de ser o mais votado. Não tem coligação, não tem tubarão e entendo que o partido quer que eu seja eleito. Me sinto muito mais confortável do que no PRTB”, alivia-se.
O distrital Cláudio Abrantes foi o sexto nome mais votado da chapa PP/PT em 2014 e assumiu como suplente de Dr. Michel (PP) em 2017. Superado pelo próprio Michel e pelos petistas Wasny, Chico Vigilante, Chico Leite e Ricardo Vale, ele se filiou ao PDT para o pleito de 2018. No atual partido, compete com o candidato à reeleição Reginaldo Veras, que teve cerca de 12 mil votos há quatro anos, número parecido com o de Abrantes, e com o ex-PT Patrício pela vaga da coalizão. A composição é bem mais favorável.
Outras manobras deixaram candidatos em situações parecidas com as anteriores. Dr. Gutemberg, que saiu do PSB para se juntar ao PR, por exemplo, ficou como suplente dos eleitos do PDT em 2014, com 8,8 mil votos, e agora integra a nominata própria do PR. De cara, precisa superar três candidatos à reeleição, Agaciel Maia, Bispo Renato e Sandra Faraj, todos com melhor retrospecto do que ele e os útlimos dois com apoio forte de correntes evangélicas.
“Política é uma coisa dinâmica. O imponderável acontece”, aposta Gutemberg, que admite, porém, ter acabado em uma furada na nominata própria para distrital do seu partido depois de Frejat ter desistido de tentar o Buriti. “Fui convidado pelo Frejat para vir ao PR, para ser o cara da saúde para ele. Quando ele desistiu, continuei no partido até pela questão legal. Mas temos esperanças porque nossa campanha é enorme”, ameniza.
Da mesma forma, Dirsomar, ex-PT, e Claudeci Luart, ex-PRB, se filiaram ao PSD e ao Podemos, respectivamente, e hoje os dois partidos estão coligados na disputa para distrital. O ex-petista teve cerca de 10 mil votos enquanto Luart conseguiu 9 mil em 2014. Ambos, porém, estão em maus lençóis em uma nominata que conta com as tentativas de reeleição de Robério Negreiros, segundo mais votado das últimas eleições, com 25, 6 mil votos, e Cristiano Araújo, que teve 14,6 mil votos e tenta emplacar um terceiro mandato.
Sistema é confuso, mas democrático
O presidente licenciado da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-DF, Bruno Rangel, defende o sistema atual por entender que ele, em tese, é o mais democrático. “Esse modelo faz um cálculo de proporcionalidade e isso guarda alguma complexidade. Mas esse modelo existe por conta de um princípio, que é de dar representatividade a minorias”, explica.
“A fórmula mais simples, mais compreensível, seria a que elege os mais votados. Mas isso impediria que minorias tivessem representatividade e só os grupos que são majoritários na sociedade teriam chance”, complementa. Ele reconhece, no entanto, que esse ideal se perdeu parcialmente ao longo dos anos e precisa ser revisto do ponto de vista sociológico.
Tramita na Câmara dos Deputados um projeto já aprovado pelo Senado que institui o voto distrital misto. Esse sistema consiste em criar distritos eleitorais em cada região para eleger metade das cadeiras disponíveis para aquela Unidade da Federação e escolher a outra metade por meio de uma lista elaborada pelos partidos vencedores.
Essa ideia já acontece nos EUA, por exemplo, onde não é necessário vencer na quantidade absoluta de votos, apenas na maioria dos distritos eleitorais.
Saiba mais
Em 2014, o DF registrou 1.525.175 votos válidos para deputado distrital, com 24 cadeiras em disputa. Como 1.525.175 dividido por 24 é igual a 63.549, essa foi a quantidade mínima de votos que cada coalizão ou partido teve de atingir para ter direito a pelo menos uma vaga. Esse é o quociente eleitoral (QE). Para saber quantas vagas cada partido tem direito, precisa-se encontrar, ainda, o quociente partidário (QP), que é obtido a partir da divisão entre o número de votos válidos recebidos pela coligação ou partido e o QE.
Nas últimas eleições, a chapa PDT/PSB/SD, por exemplo, teve 205,7 mil votos. Quando se divide 205,7 mil por 63.549 (QE) , obtemos 3,2, que é o QP daquela coalização. Na teoria, esse grupo teria direito a três cadeiras na Câmara, mas aí vem outra pegadinha. Para ser eleito diretamente, candidato ainda precisa atingir 10% de todos os votos do QE.
Como nem todos os grupos ou legendas atingem o QE, é preciso distribuir, então, as sobras, e aí entra o cálculo que elege os deputados por média. Foi dessa maneira que sete parlamentares ocuparam a Casa em 2014, de Professor Reginaldo Veras (PDT), que foi menos votado do que os colegas Celina Leão e Joe Valle, mas foi beneficiado pelo QE de 3,2 que sua coligação atingiu. No cálculo das sobras, divide-se o número de votos do partido ou coligação pelo número de vagas conquistadas na primeira fase, mais o número 1.