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Política & Poder

Crise diplomática entre Brasil e Israel não interfere na economia, explica especialista

O especialista ainda acrescentou que, se houver uma ruptura diplomática, não necessariamente haverá uma ruptura comercial

Redação Jornal de Brasília

14/03/2024 15h42

Atualizada 15/03/2024 8h27

Foto: Governo do Brasil/ Divulgação

Por Paloma Castro, Ágata Vaz e Dina Braga
Agência de Notícias do Ceub/Jornal de Brasília

Após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ter comparado a operação militar israelense na Faixa de Gaza com o extermínio do povo judeu por Adolf Hitler durante a Alemanha Nazista, uma crise diplomática entre Brasil e Israel foi gerada com uma sensação de possíveis consequências aos acordos econômicos entre os dois países. Mas, para especialistas, discordâncias entre governos não interferem na economia.

Para o historiador Carlos Eduardo Vidigal, professor da Universidade de Brasília, por mais que as falas do presidente Lula provocaram atritos diplomáticos, não significa que esses atritos afetarão o comércio e os investimentos entre Brasil e Israel.
“Ainda é cedo para avaliar, pois não transcorreu tempo suficiente para perceber eventuais impactos nesses setores”, afirmou.

O especialista ainda acrescentou que, se houver uma ruptura diplomática, não necessariamente haverá uma ruptura comercial. “Os negócios demandam previsibilidade e respeito às regras internacionais, até porque contratos comerciais e financeiros são trabalhados para períodos mais longos”, explicou.

Comércio

Segundo o pesquisador, o Brasil vende óleos brutos de petróleo, soja, carne bovina, açúcar, cereais e café para Israel. O país do Oriente Médio, por outro lado, vende para o Brasil adubos e fertilizantes químicos, inseticidas e similares, materiais têxteis e produtos manufaturados como aeronaves.

A Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil) publicou em setembro de 2023 um perfil sobre comércio e investimentos entre Brasil e Israel, indicando que de 2021 a 2022 a corrente comercial entre os dois países cresceu cerca 130%, com uma projeção de 327 oportunidades de ampliação.

Ainda conforme o estudo, cerca de 85% das exportações brasileiras para Israel correspondem principalmente a petróleo, carne bovina, milho e soja. A venda de petróleo é o que se destaca, uma vez que se iniciou em 2021 e já se tornou o principal item da pauta exportadora. Ao mesmo tempo que o principal produto vendido por Israel ao Brasil se concentra no grupo de de adubos ou fertilizantes químicos.

No que diz respeito aos investimentos, os dados do Banco Central do Brasil revelaram que o capital israelense no Brasil cresceu mais de 650% até 2021, ocupando a 38a posição no ranking dos principais países investidores no Brasil.

Ajuda humanitária bloqueada

Na última terça-feira (5), 400 pacotes de ajuda humanitária aos palestinos foram bloqueados pelo governo de Israel na região de Al-Arish, a cerca de 20 quilômetros da passagem de Rafah, que separa Gaza do Egito.

A denúncia foi feita pelo deputado italiano Angelo Bonelli nas redes sociais. O parlamentar faz parte de uma delegação da Itália que monitora a entrega de ajuda humanitária à região da Faixa de Gaza.

Desses 400 pacotes enviados por vários países para o povo palestino, 30 deles são do governo brasileiro em parceria com empresas privadas. Um deles contém filtros de água portáteis da startup brasileira Pwtech, capazes de purificar até 5.000 litros por dia.

No geral, dentro das caixas estão medicamentos, incubadoras, refrigeradores, cilindros de oxigênio, muletas, barracas, painéis solares e outros itens destinados principalmente a profissionais de saúde que estão no local.

Em nota, a Cruz Vermelha se manifestou dizendo que toda a assistência humanitária aos necessitados em Gaza deve ser facilitada.

“Temos defendido consistentemente o fluxo regular e desimpedido de assistência humanitária para Gaza. Israel, como potência ocupante, tem a obrigação, no âmbito da guerra humanitária internacional, de garantir que a ajuda chegue aos civis em Gaza. Além disso, todas as partes devem garantir que os civis tenham acesso a bens essenciais, como alimentos, água e abrigo”.

Crime de guerra

Para o professor e diretor de Relações Internacionais da Universidade de Brasília, Antônio Jorge da Rocha, essa restrição imposta por Israel se caracteriza como um crime de guerra e um crime contra a humanidade de acordo com o Estatuto de Roma nos Artigos 6 a 8.

Segundo fontes do governo ouvidas pela reportagem, o Brasil tem feito doações à região da Faixa da Gaza, mas recentemente foi a primeira vez que por conta de um trâmite burocrático entre Israel e Egito, alguns purificadores de ar doados foram retidos por Israel. O Brasil doou 150, e 30 deles foram bloqueados. Até o momento desta publicação, o bloqueio permanece. E segundo essas fontes, as embaixadas brasileiras nas regiões de Gaza, Israel e Egito estão acompanhando o caso para que se houver possíveis mudanças avisar o Brasil.

Entenda a crise

Durante viagem à Etiópia para a 37ª Cúpula da União Africana, o presidente Lula afirmou que o governo de Israel não está fazendo uma guerra na Faixa de Gaza, e sim um genocídio, matando mulheres e crianças. Ele comparou o cenário atual com o Holocausto, dizendo: “O que está acontecendo na Faixa de Gaza, com o povo palestino, não existiu em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu quando Hitler decidiu matar os judeus”.

O ministro das Relações Exteriores de Israel, Israel Katz, reagiu negativamente à afirmação de Lula nas redes sociais: “A comparação do presidente brasileiro Lula entre a guerra justa de Israel contra o Hamas e as acções de Hitler e dos nazis, que destruíram 6 milhões de judeus, constitui um grave ataque anti-semita que profana a memória daqueles que morreram no Holocausto”.

O governo de Benjamin Netanyahu classificou Lula como “persona non grata”, que significa literalmente “pessoa que não é bem vinda”. Antônio Jorge da Rocha explicou que essa designação significa o não reconhecimento do Brasil como representante legítimo em Israel e que esse tipo de medida é raramente aplicada a chefes de Estado e sim a diplomatas, mas que neste caso específico foi designado ao presidente brasileiro. “Lula não será bem recebido no país, um claro sinal de que ele não deve sequer tentar uma aproximação”.

As falas de Lula seguida da comparação entre o Holocausto e as mortes em Gaza incomodoram o governo de Israel, e a aproximação que havia entre os dois países se transformou em uma crise diplomática.

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