Menu
Política & Poder

Conversas citam repasses de até R$ 250 mil em esquema de venda de sentenças no STJ

Os diálogos estão na decisão sigilosa do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Cristiano Zanin, que autorizou a operação da PF de terça-feira (26) sobre venda de sentenças

Redação Jornal de Brasília

27/11/2024 22h16

stj 1908200977 0

Foto: Agência Brasil

CONSTANÇA REZENDE
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)

Trocas de mensagens por celular obtidas pela Polícia Federal entre lobistas e advogados mostram supostos repasses de até R$ 250 mil para servidores do Judiciário com o objetivo de obter informações sobre processos sigilosos e conseguir decisões favoráveis no STJ (Superior Tribunal de Justiça) e em outros tribunais.

Os diálogos estão na decisão sigilosa do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Cristiano Zanin, que autorizou a operação da PF de terça-feira (26) sobre venda de sentenças. A polícia prendeu um lobista e realizou buscas em endereços de dois chefes de gabinetes do STJ, além de um terceiro servidor.

De acordo com Zanin, o material descortinou um suposto esquema em que lobistas estabeleceram uma rede de contatos com magistrados e assessores de ministros do STJ para benefícios derivados de decisões judiciais e informações privilegiadas.

As conversas usadas na representação são entre o advogado Roberto Zampieri, vítima de homicídio em dezembro do ano passado em Mato Grosso, e o empresário Andreson de Oliveira Gonçalves, que foi preso durante a operação.

Os diálogos entre Andreson e Zampieri, no dia 2 de janeiro de 2020, citam cobranças de dinheiro que estariam sendo feitas por Daimler Alberto de Campos, que exercia o cargo de chefe de gabinete da ministra Isabel Galotti, na ocasião.

“Zamp, o Daimler me ligou agora perguntando dos R$ 50.000,00 que faltam daquele caso da Cátia lá né… e se tá tudo certo pra no dia 14 o cara pagar os outros 150. Como que tá isso aí? E no final do mês aqueles outros 250 seu hein, não esquece também não”, diz.

A reportagem apurou que os investigadores entendem que as citações 150 e 250 se referiam aos valores de R$ 150 mil e R$ 250 mil.

As cobranças se repetiram no dia 8 daquele mês e em 7 de fevereiro, quando o nome de Daimler foi citado novamente em outro diálogo, também sobre cobranças de dinheiro.

Zanin ressaltou que as movimentações processuais, conferidas pela presidência do STJ, confirmaram que, de fato, o servidor Daimler participou ativamente da tramitação interna de uma ação de reintegração de posse de Mato Grosso, de relatoria de Galotti e de interesse dos investigados.

Ele foi citado no contexto de outra ação, também oriunda de Mato Grosso, em que se contestava a negociação feita por um banco.

Na conversa, Andreson diz em três mensagens seguidas: “Pessoal mando essa petição no e-mail do gabinete”. “O amigo me falou agora”. “Damiller”.

Segundo as investigações, o arquivo enviado nesta ocasião correspondeu à decisão da ministra Isabel Gallotti, cujo resultado satisfez os interesses de Roberto Zampieri, o que teria sido observado pelos interlocutores.

Andreson diz: “Feito zamp”. “Pelo amor de Deus.” “Veja o dinheiro.” “Aqui resolve Zamp.”

Zampieri afirma: “Acabei de ler tudo”. “Parabéns, meu amigo.” “Isso não é o qualquer um.” “Parabéns.”
Em seguida, Andreson diz: “Até a vírgula é igual”. Andreson: “kkkk”.

O nome de Daimler ainda surgiu durante tratativas entre Andreson e Roberto Zampieri em outra ação, também da relatoria da ministra Isabel Gallotti.

Zampieri diz: “Você consegue a decisão da Noirumbá até sexta? Abraços”.

Andreson responde: “Já te ligo aí”. “Tô falando com DM.”
Zampieri, então, afirma: “Amanhã te transfiro mais uma parte”. “Já estou cansado de ficar sem fazer a nossa correria”.

Em seguida, Andreson completa: “Eu também amigo”. “Hoje falei ao damalir. Tô agoniado”.

Em diálogo no dia 12 de fevereiro de 2021, Andreson encaminhou a Zampieri o julgamento do recurso deste caso movido por uma das partes do processo. A PF destacou que a consulta do andamento processual mostrou que a decisão alcançou o resultado previsto por Andreson.

“Entendo que os indícios revelados até aqui se qualificam como suficientes para permitir o aprofundamento das investigações quanto ao narrado envolvimento de Daimler Alberto de Campos na empreitada criminosa”, afirmou Zanin.

A decisão de Zanin também citou Rodrigo Falcão de Oliveira Andrade, então chefe de gabinete do ministro Og Fernandes, como em diálogo entre Andreson e Zampieri no dia 24 de março de 2020.

Segundo a representação, os dois pareciam conversar sobre a deflagração de uma operação da PF que atingia um suposto esquema de venda de sentenças no Tribunal de Justiça da Bahia (Operação Faroeste).

Andreson informou, no diálogo, que a busca e apreensão realizada teria sido noticiada pelo “amigo do og”, possível alusão a um contato de influência no gabinete do ministro Og Fernandes, do STJ.

Na mesma data, ele encaminhou para o advogado decisão proferida pelo ministro no pedido de busca e apreensão do caso, embora o procedimento estivesse sob segredo de justiça.

Segundo a PF, Andreson estabelecia uma relação consideravelmente próxima com um “amigo” lotado naquele gabinete e que estaria repassando informações sigilosas do processo.

Andreson diz: “O amigo vai me passar, são 3 procedimentos. Um INQ (inquérito) Uma PET (petição) e um PBAC (pedido de busca e apreensão criminal)”. “O pedido de bloqueio de bens e a prisão dele está em um expediente avulso. Uma QBSING. Quando fechar o amigo lá vai manda da forma que temos que fazer”.

Zanin afirmou que há indícios de que se trata de Rodrigo Falcão de Oliveira Andrade.

A PF também solicitou à presidência do STJ informações sobre o acesso interno à movimentação processual do caso, e foi constatado registro de Oliveira Andrade, sobretudo em 23 de março de 2020, véspera do encaminhamento por Andreson da decisão de Og Fernandes da medida pleiteada.

“Entendo que os indícios revelados até aqui se qualificam como suficientes para permitir o aprofundamento das investigações quanto ao narrado no envolvimento do investigado Rodrigo Falcão de Oliveira Andrade na empreitada criminosa”, disse Zanin.

Os funcionários foram procurados por meio da assessoria do STJ para falar sobre o caso, mas o órgão respondeu que não irá se manifestar, “pois se trata de uma investigação que tramita sob sigilo no STF”. Todos já foram afastados de suas funções no tribunal.

    Você também pode gostar

    Assine nossa newsletter e
    mantenha-se bem informado