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Política & Poder

Audiência sobre Brasil nos EUA tem ataques a Lula e Moraes e comparação entre Bolsonaro e Trump

Três das quatro pessoas ouvidas apontaram supostas violações de liberdade de expressão cometidas por autoridades brasileiras

Redação Jornal de Brasília

07/05/2024 17h40

Foto: Agência Brasil

Fernanda Perrin
Washington, EUA (Folhapress)

Uma audiência sobre o Brasil no Congresso dos EUA nesta terça-feira (7) se transformou em um embate entre bolsonaristas e aliados, que alegam sofrer perseguição e censura, e democratas, que veem nas denúncias paralelos com o discurso do ex-presidente Donald Trump e seus apoiadores.

Três das quatro pessoas ouvidas apontaram supostas violações de liberdade de expressão cometidas por autoridades brasileiras, sobretudo pelo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes: o ex-apresentador da Jovem Pan Paulo Figueiredo, o CEO da rede social conservadora Rumble, Chris Pavlovski e o jornalista americano Michael Shellenberger, que divulgou os arquivos do Twitter relacionados ao Brasil, em abril.

O quarto integrante do painel, indicado por democratas, foi o professor de estudos brasileiros da Universidade de Oklahoma, Fábio de Sá e Silva, que assumiu a função de rebater as acusações e incluir no debate ameaças atribuídas ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), citando por exemplo as investigações em curso em torno da trama golpista para reverter a derrota na eleição de 2022.

A sala lotou com nomes da direita brasileira, entre eles o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), o blogueiro Allan dos Santos, o ex-comentarista da Jovem Pan Rodrigo Constantino e o deputado federal cassado e ex-procurador da Lava Jato Deltan Dallagnol. O público se aglomerou no corredor antes do início da audiência, com muitos fazendo vídeos e selfies para as redes sociais.

No entanto, do lado americano, apenas seis deputados participaram, sendo que somente dois permaneceram o tempo todo na audiência: o republicano Chris Smith, presidente do subcomitê de Saúde Global, Direitos Humanos Globais e Organizações Internacionais, no qual o evento foi realizado, e a democrata Susan Wild, o principal nome do partido no órgão.

Mesmo sendo minoria, mais democratas do que republicanos participaram: Jonathan Jackson, Joaquin Castro e a presidente da bancada brasileira, Sydney Kamlager-Dove. Foi ela quem adotou a postura mais incisiva, afirmando que os ataques de 8 de janeiro e teorias conspiratórias são a verdadeira ameaça à democracia no Brasil.

“Esta audiência é uma tentativa de minar a democracia brasileira ao dar uma plataforma para os mesmos indivíduos que espalharam mentiras sobre as eleições”, afirmou.

Kamlager-Dove comparou a estratégia com a da direita americana, que, segundo ela, está usando o debate brasileiro para se vitimizar em face das acusações que sofre nos EUA por seu papel na invasão do Capitólio em 6 de janeiro de 2021.

Na mesma linha, Wild disse que aquela não era a audiência que ela acreditava que deveria estar acontecendo e questionou os republicanos por não terem promovido uma audiência sobre a democracia brasileira quando informações sobre a trama golpista sob investigação se tornaram públicas, ou sobre o 8 de janeiro.

“Colocando de modo simplificado, o ataque de 8 de janeiro foi claramente inspirado pelo 6 de janeiro. Acredito que precisamos de mais investigação dos dois eventos e do papel que os EUA podem ter desempenhado, incluindo de elementos de extrema direita que no mínimo expressaram apoio a essa tentativa de golpe [no Brasil]”, disse a deputada.

Do lado republicano, a participação de Maria Salazar foi breve, mas também incisiva. A deputada, que também preside o subcomitê de Hemisfério Ocidental, chamou o presidente Lula (PT) de socialista e questionou se Moraes não seria uma espécie de fantoche do petista ou se haveria algum tipo de conluio antigo entre eles.

Ela defendeu que Elon Musk, dono do X (ex-Twitter), faça do “modelo brasileiro”, ao travar um embate contra as ordens de derrubada de contas do STF, “um exemplo para os EUA e o resto do hemisfério”. “Você não mexe com liberdade de expressão. Você tem direito a dizer o que quiser, desde que não gere violência, ponto afinal”, afirmou, sob aplausos.

Smith, que propôs a realização da audiência, elencou por sua vez uma série de supostas violações de direitos no Brasil. “Vamos hoje restaurar [a liberdade de expressão] de nossas testemunhas, que reuniram uma constelação de evidências de censura generalizada e perseguição politicamente motivada no Brasil”, afirmou.

O deputado, que se tornou um dos principais aliados de bolsonaristas no Congresso americano, afirmou que vai apresentar um projeto de lei com foco no Brasil, prevendo sanções ao país em caso de violações de direitos.

“Eu vou elaborar uma legislação semelhante ao que fiz com Belarus, chamada Lei da Democracia de Belarus. Eu já fiz isso quatro vezes, começando em 2004, com o Azerbaijão, o Vietnã, todas pedindo respeito aos direitos fundamentais”, disse o deputado à Folha de S.Paulo após a audiência.

“Vamos prever sanções no sistema generalizado de preferências [GSP, na sigla em inglês]”, completou, em referência ao sistema americano de benefícios tarifários a certas importações.

Smith aproveitou a audiência para relembrar um histórico antigo com o Brasil. O deputado recordou que foi ao país duas vezes durante a crise diplomática entre os governos Lula e Barack Obama em torno da guarda de Sean Goldman, filho de mãe brasileira e pai americano que voltou para os Estados Unidos em 2009.

“A única razão que David Goldman conseguiu seu filho de volta foi quando introduzi legislação para dizer ‘chega, vamos retirar o GSP, condicioná-lo a Sean ser permitido se reunir com seu pai’. Foi ultrajante. Fui a Brasília ao tribunal”, afirmou.

Questionado pela reportagem sobre sua opinião sobre Bolsonaro, Smith afirmou que não comentaria porque esse não era o foco da audiência, e ele não gostaria de repetir o que seus colegas democratas fizeram ao fazer denúncias ao ex-presidente. “Isso é uma ação minha”, respondeu, ao ser perguntado sobre a instrumentação do evento por grupos políticos brasileiros.

“Eu fui lá quando Lula era presidente e fiquei chocado e consternado com sua falta de preocupação [no caso Sean Goldman]. Nós o procuramos quando ele veio às Nações Unidas. Obama estava lá e eu Lula. Constantemente tivemos audiências bem aqui e apelamos para ele, assim como para a embaixada. E não tivemos resposta. Não conseguimos nada até começarmos a dizer que haveria sanções econômicas”, justificou.

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