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Opinião

Neuralink e a aprovação do FDA: reflexões e perguntas para o futuro

O fascínio com o potencial da tecnologia não deve ofuscar a necessidade de um debate público robusto sobre suas implicações

Redação Jornal de Brasília

20/06/2023 14h54

Foto: Cristiano Costa/CR Press

*Marco Tulio

Em 25 de maio, a Neuralink, empresa de neurotecnologia co-fundada por Elon Musk, recebeu a aprovação do FDA, agência reguladora ligada ao departamento de saúde do governo norte-americano, para iniciar testes clínicos em humanos com a tecnologia de implante cerebral. A ideia é tratar distúrbios neurológicos por meio de um chip implantado no cérebro.

Para muitos, a aprovação poderia ser apenas mais um passo no avanço tecnológico, mas como presidente do Sindicato das Empresas de Serviço de Informática do Distrito Federal (Sindesei-DF), vejo-a como uma convocação para um debate mais aprofundado. É um momento decisivo que nos faz questionar como a humanidade e a tecnologia estão convergindo de maneiras antes imaginadas apenas na ficção científica.

A Neuralink abre um novo universo de possibilidades – desde controlar dispositivos eletrônicos com o pensamento, até potencialmente curar doenças neurodegenerativas -. Porém, o fascínio com o potencial da tecnologia não deve ofuscar a necessidade de um debate público robusto sobre suas implicações.

Para começar, as preocupações de saúde física – apesar de reais – não são as mais complexas. A medicina já avançou o suficiente para tornar a ideia de implantes cerebrais algo factível e relativamente seguro. No entanto, a complexidade aumenta quando começamos a olhar para além da superfície.

Por exemplo, em uma era em que a privacidade é cada vez mais valorizada, como garantimos a segurança de nossos pensamentos mais íntimos, agora que poderiam ser acessados por uma máquina? Quais salvaguardas devem ser implementadas para prevenir o uso indevido dessas informações? As leis e os regulamentos existentes estão preparados para essa nova realidade?

Da mesma forma, como saberemos se uma memória que estamos “lembrando” realmente aconteceu ou se foi implantada por algum dispositivo? Até que ponto podemos confiar em nossa própria mente quando a linha entre a realidade e a virtualidade se torna cada vez mais turva?

Essas questões se estendem também à esfera comercial e governamental. Como saber se uma empresa não está usando as informações do nosso cérebro para nos vender um produto? Quão vulneráveis estamos à manipulação direta de nossas preferências e comportamentos? E o que dizer dos governos? Estamos preparados para uma possível era em que os pensamentos podem ser monitorados ou mesmo controlados?

O acesso a essa tecnologia é outra questão importante. Quem terá direito a essa nova ferramenta de potencial imenso? Existe o risco real de que a Neuralink e as tecnologias semelhantes aprofundem ainda mais a divisão digital e socioeconômica, criando uma nova classe de “Quem Tem” e “Quem Não Tem”? Como garantimos que todos se beneficiem de tal avanço?

Esses questionamentos não são simples, mas é nosso dever enfrentá-los de frente. Compreender o que está em jogo e tomar decisões informadas são desafios que a sociedade precisa enfrentar coletivamente. Devemos lembrar que as decisões que tomamos hoje irão moldar o mundo de amanhã. E a nossa responsabilidade é garantir que o futuro seja moldado da maneira mais inclusiva, segura e benéfica possível.

O futuro está se desdobrando diante de nós a uma velocidade impressionante. Com a linha entre a humanidade e a tecnologia se tornando cada vez mais tênue, estamos nos aproximando rapidamente de um momento de redefinição. Cada um desses avanços que hoje parecem quase surreais, como a interface cérebro-computador da Neuralink, estão, na verdade, reformulando nosso modo de vida e a maneira como percebemos a realidade.

A aprovação do FDA para os testes em humanos da Neuralink é apenas uma indicação do que está por vir e se preparem, virá muito mais. E enquanto encaramos esses avanços com admiração e antecipação, também devemos abordá-los com cautela e conscientes das implicações que podem surgir.

É importante, então, manter um debate constante e aberto sobre essas questões. Precisamos estar atentos às maneiras como tais tecnologias podem ser usadas, tanto para o bem quanto para o mal. Precisamos desenvolver um marco regulatório robusto que possa acompanhar a velocidade do progresso tecnológico e garantir que ele seja usado de maneira responsável e ética.

Além disso, também devemos considerar as implicações psicológicas e sociais dessas tecnologias. Como elas afetarão nossas interações sociais? Como afetarão nossos empregos e nossa vida cotidiana? E, talvez mais importante, como elas afetarão nossos sensos de identidade e de humanidade?

Estamos entrando em território desconhecido e as perguntas são muitas. Mas, como líderes na vanguarda da tecnologia e da inovação, temos a responsabilidade de fazer essas perguntas difíceis. Temos a responsabilidade de guiar a sociedade por meio dessas mudanças e garantir que estamos preparados para o futuro que está se desdobrando.

Como presidente do Sindesei DF, acredito firmemente no potencial das novas tecnologias para melhorar a vida das pessoas. No entanto, também acredito na importância de uma abordagem considerada e cuidadosa. Devemos olhar para o futuro com entusiasmo, mas também com um senso agudo de responsabilidade.

O futuro da tecnologia é emocionante e repleto de possibilidades. Mas cabe a nós garantir que essa excitação não ofusque o dever que temos de questionar, aprender e preparar-nos para o que está por vir. Juntos, podemos navegar com confiança para o futuro, moldando-o de maneira a beneficiar a todos.

*Marco Tulio Chaparro é o presidente do Sindesei DF, o Sindicato das Empresas de Serviço de Informática do Distrito Federal, representando 12.000 empresas no Distrito Federal.

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