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Um mês após vulcão e tsunami, ‘besuntado de Tonga’ alerta para lenta recuperação do país

A erupção durou oito minutos e foi tão forte que foi ouvida “como um trovão distante” a mais de 800 km de distância, disseram autoridades das ilhas Fiji na ocasião

FolhaPress

14/02/2022 19h16

Foto: Reprodução

Um mês depois de um tsunami ter destruído boa parte de Tonga, o país ainda contabiliza seus danos. Há gargalos no fornecimento de água e itens de socorro, a comunicação ainda opera em níveis insuficientes, parte da população perdeu a fonte de renda e a chegada da Covid-19 motivou um severo lockdown.

O cenário é consequência da erupção do vulcão Hunga Tonga-Hunga Ha’apai, em 15 de janeiro, localizado a cerca de 65 km ao norte da capital, Nukualofa, que provocou um tsunami de 1,2 metro, segundo o Escritório de Meteorologia australiano. A erupção durou oito minutos e foi tão forte que foi ouvida “como um trovão distante” a mais de 800 km de distância, disseram autoridades das ilhas Fiji na ocasião.

A ilha de Hunga Tonga-Hunga Ha’apai praticamente desapareceu após a explosão, de acordo com as imagens de satélite capturadas cerca de 12 horas depois da erupção, tornando difícil para os vulcanologistas monitorar a atividade em andamento.

Foram três vítimas em Tonga: uma mulher de 65 anos em Mango, um homem de 49 em Nomuka e uma britânica de 50 anos que morreu tentando salvar seu cachorro. As altas ondas do tsunami impactaram ainda as comunidades pesqueiras de Japão, Estados Unidos e Peru -onde duas pessoas morreram.

Pita Taufatofua, atleta de taekwondo que ficou conhecido nas Olimpíadas de Rio-2016 e Tóquio-2020 como “besuntado de Tonga” e realizou uma campanha para angariar fundos destinados à recuperação do país, diz à Folha, por mensagem, ser “um milagre absoluto” o número de mortes ser relativamente baixo.

Filho do governador das ilhas Ha’apai, ele estava na Austrália no momento da erupção -o atleta se reveza entre os dois países. Sua família mora em regiões menos impactadas pelo tsunami e sofreu apenas danos materiais. Até agora, sua campanha já arrecadou 833,5 mil dólares australianos (R$ 3,1 milhões) da meta de 1 milhão.

Taufatofua relata que o país vem se recuperando muito lentamente, com as telecomunicações operando em níveis básicos, pois o cabo submarino ainda está danificado, e áreas atingidas, principalmente as ilhas Ha’apai e parte de Tongatapu, estão destruídas. “As outras áreas onde o tsunami não atingiu apenas foram danificadas pelas cinzas, e as chuvas recentes começaram lentamente a limpar isso.”

Essas cinzas têm impedido ainda a operação de voos de repatriação de e para Tonga, que devem ser retomados nesta terça-feira (15), de acordo com o Escritório Nacional de Gerenciamento de Emergências (Nemo, na sigla em inglês).
Nas regiões mais impactadas, comunidades enfrentam ainda dificuldades para obter renda, segundo o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (Ocha, na sigla em inglês). Pescadores como Fangupo Latu, 74, tiveram seus barcos destruídos pelo tsunami, assim como a maioria das pessoas em sua aldeia, relata a agência da ONU.

A comunidade vivia da venda diária de peixes e hoje, mesmo quem conseguiu manter seus instrumentos de trabalho não tem ido pescar devido aos avisos de toxicidade, conta Latu, em referência a temores relacionados às cinzas do vulcão.

Para auxiliar nessa questão, cerca de US$ 354 mil (R$ 1,8 milhão) do Fundo Especial para Atividades de Emergência e Reabilitação foram destinados para Tonga por meio da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO). O Comitê Nacional de Gerenciamento de Emergências de Tonga também aprovou um financiamento para apoiar uma redução no custo das licenças de pesca em alto mar.

A Ocha, no entanto, aponta ainda desafios de médio e longo prazo em recuperação e segurança alimentar, além de uma preocupação sobre o retorno às aulas. À medida que os esforços de limpeza avançarem, as escolas serão reabertas, mas há o risco de muitas famílias não poderem pagar as taxas exigidas.

Mesmo assim, a entidade diz que a maioria das necessidades de emergência foram ou estão sendo atendidas, embora ainda existam alguns gargalos no fornecimento de água e outros itens de socorro, principalmente em ilhas periféricas e outras áreas remotas -Tonga é um arquipélago formado por 170 ilhas, 36 das quais inabitadas.

Outra dificuldade já presente no país da Oceania é a chegada da Covid-19. Segundo dados do Our World in Data, de 2 a 13 de fevereiro, Tonga contabilizou 72 casos de Covid-19. Antes disso, o arquipélago havia registrado apenas um caso confirmado, em 29 de outubro do ano passado. O maior salto no número de infecções seu deu nos últimos sete dias, quando os pacientes com coronavírus saltaram de 7 para 73.

A chegada da Covid levou a um severo lockdown, até o dia 20 de fevereiro, na ilha principal Tongatapu, que inclui a capital, e em Vava’u –outros lugares já suspenderam a medida. Sob o bloqueio, lojas e serviços essenciais só podem abrir às terças e sextas-feiras, das 6h às 18h, para as pessoas reabastecerem suas casas.

“O povo já passou por muita coisa e agora a Covid está por todas as ilhas”, afirma Taufatofua. “O número de pessoas infectadas cresceu massivamente, o que é muito triste em um país tão pequeno, e os líderes estão fazendo o melhor que podem, apesar das circunstâncias difíceis.”

As amostras do vírus testadas na Austrália confirmaram a disseminação no país da variante ômicron, mais contagiosa. Apesar do aumento de casos, há uma boa cobertura de imunização: 60,6,% da população está com esquema vacinal completo, de acordo com o Our World in Data.

Há ainda, no entanto, um desafio maior e de longo prazo para Tonga. O país ocupa o terceiro lugar no WorldRiskIndex 2021 entre aqueles com o maior risco de desastres naturais em todo o mundo, atrás apenas de Vanuatu e Ilhas Salomão.

Com os eventos climáticos extremos se multiplicando por cinco nos últimos 50 anos, o arquipélago fica em situação ainda mais vulnerável. “Eu vi o nível do mar subir ao longo dos anos… é muito triste”, relata o “besuntado”. “Estamos tentando conscientizar, mas infelizmente grande parte da mentalidade ao redor do mundo é: ‘nós só vamos nos preocupar com isso quando acontecer conosco’. Bem, está acontecendo.”

Em vista da calamidade, a Austrália prometeu gastar US$ 500 milhões (R$ 2,6 bi) até 2025 para fortalecer as mudanças climáticas e a resiliência a desastres no Pacífico, com foco especial nas ilhas de Tonga. Para Taufatofua, porém, as medidas adotadas por líderes mundiais não têm sido suficientes.

“É difícil para nós estarmos na linha de frente dos impactos, mesmo sem contribuir com quase nada para os danos climáticos”, diz o atleta. “A mudança climática induzida pelo homem é real. Já chegou e afetará a todos.”

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