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Com Putin, Dilma defende transações sem dólar e nega dinheiro à Rússia

Dilma, contudo, rejeitou a noção especulada de que o banco dos Brics pudesse fazer novos empréstimos à Rússia

Redação Jornal de Brasília

26/07/2023 15h52

Foto: AFP

Igor Gielow
São Paulo, SP (Folhapress)

A presidente do banco dos Brics, a ex-mandatária brasileira Dilma Rousseff (PT), voltou a atacar a hegemonia do dólar nas transações internacionais durante reunião com o líder russo Valdimir Putin nesta quarta (26).

Tocando em dueto com o presidente em São Petersburgo, ela defendeu o uso de moedas locais, como o yuan chinês, em trocas entre países emergentes -termo genérico que inclui o Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, cujas iniciais formam o acrônimo Brics.

Antes do encontro, às margens de uma cúpula entre Rússia e países africanos que começa de fato na quinta (27), Dilma, contudo, rejeitou a noção especulada de que o banco dos Brics pudesse fazer novos empréstimos à Rússia, acossada pelas sanções internacionais lideradas pelo Ocidente devido à invasão da Ucrânia em 2022.

“O NDB [Novo Banco de Desenvolvimento, na sigla inglesa do órgão] reiterou que não está considerando novos projetos na Rússia e que opera em conformidade com as restrições aplicáveis nos mercados internacionais”, afirmou ela na plataforma X, ex-Twitter.

O discurso contrário ao dólar, denunciado como “arma geopolítica” pela mesma Dilma em palestra em Pequim no começo do mês, é uma frequente entre países rivais dos Estados Unidos na Guerra Fria 2.0, como China e Rússia, e entre os que buscam não ser alinhados automaticamente, como o Brasil.

As motivações variam. Putin tem o exemplo caseiro: cerca de US$ 300 bilhões (R$ 1,5 trilhão) em reservas internacionais da Rússia foram congelados em bancos no exterior devido às sanções. Já o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) visa uma posição de maior autonomia ante Washington, o que é visto pelo governo de Joe Biden como ingratidão após o apoio dado à transição de governo no Brasil.

Putin, visivelmente enfastiado durante a declaração que deu com Dilma após o encontro, foi econômico. Criticou mais abertamente o uso do dólar como moeda internacional, mas não entrou nos detalhes da conversa com a brasileira.

“Sabemos que há dúvidas sobre a liquidez do banco, que há algumas ideias de seu pessoal sobre isso, e vamos apoiá-los”, afirmou Putin, sobre uma preocupação corrente no mercado. “As relações dos países do Brics estão se desenvolvendo em moedas nacionais, parece-me que o banco pode desempenhar um papel significativo”, disse.

Ela foi mais eloquente. Lembrou que o NDB tem como meta de 2022 a 2026 fazer 30% de suas captações em moedas locais. “Não há justificativa para que países em desenvolvimento não possam estabelecer trocas em moedas locais”, afirmou.

Defendeu outra bandeira de Putin, um “mundo mais multilateral e multipolar”, e elogiou a Rússia como “grande parceira no Brics e no NDB”. Também saudou a reunião com os países africanos. “É muito importante para todos que têm compromisso com o desenvolvimento do Sul Global”, afirmou, usando o jargão mais recente para os ditos emergentes.

A viagem de Dilma, que participará da cúpula de Putin com 17 chefes de Estado africanos, não foi comunicada ao governo brasileiro. No Itamaraty, isso foi visto como normal, dado que ela pode estar alinhada com Lula e dever a ele sua indicação ao NDB, mas não trabalha para o petista.

Para diplomatas, melhor assim: a relação de Lula com a Rússia tem dado muita dor de cabeça externa ao país, devido aos termos com que o presidente brasileiro se refere à Guerra da Ucrânia. Lula vê Kiev tão culpada como Moscou pelo conflito, e já foi criticado por ucranianos, europeus e americanos por isso.

Na prática, é a posição tradicional brasileira de não alinhamento, que não dispensou a crítica à invasão em duas votações da ONU, embora em termos econômicos Brasília só tenha elevado sua relação com Moscou desde então. Parceiros sul-americanos de Lula, como o chileno Gabriel Boric, entraram em colisão com o brasileiro por isso.

Para o russo, mesmo sem dinheiro novo, a presença de Dilma amplia a sensação reduzida de apoio da cúpula. Na sua primeira edição, em 2019, havia 43 chefes de Estado. Um deles, presente nas duas reuniões, é o sul-africano Cyrill Ramaphosa, que sediará no mês que vem reunião do Brics. Nela Putin só vai aparecer em vídeo, dado que a ordem de prisão por supostos crimes de guerra negados pelo Kremlin, emitida pelo Tribunal Penal Internacional, vale na África do Sul.

Dilma falou sobre a cúpula, dizendo ser a favor da expansão tanto do bloco, como do NDB -esse um órgão que já tem membros de fora do Brics, como o Egito. Nenhuma palavra, contudo, sobre pretensão de Belarus, ditadura aliada da Rússia, de entrar no grupo.

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