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Colômbia não sabe mais o que fazer com os hipopótamos de Escobar

O animal de presas enormes e mais de duas toneladas caminha à vontade e agora se tornou uma atração para milhares de turistas

Redação Jornal de Brasília

02/05/2023 13h32

Foto: Raul ARBOLEDA / AFP

Um dos animais mais perigosos da África passa em frente a curiosos em Doradal, na Colômbia, onde os hipopótamos chegaram por capricho do narcotraficante Pablo Escobar.

Esterilização, transferências internacionais, caça: todas as possíveis soluções estão sobre a mesa diante da perigosa “invasão” de cerca de 160 animais que se reproduzem sem controle nesta região do departamento de Antioquia, noroeste do país.

O animal de presas enormes e mais de duas toneladas caminha à vontade e agora se tornou uma atração para milhares de turistas que chegam seduzidos pela a extravagante fazenda que foi do barão da cocaína.

Após a morte de Escobar nas mãos da polícia durante uma tentativa de fuga em 1993, a pequena manada de hipopótamos que havia levado a seu zoológico particular ficou abandonada à própria sorte em uma área com alimentação abundante e sem grandes predadores.

Hoje, são dezenas de exemplares, temidos e adorados na região.

Figuras de hipopótamos decoram o parque central da cidade, a fachada de muitas empresas e outras são vendidas como suvenires. Existe ainda um tráfico de filhotes, ofertados como mascotes, indicam rumores entre a população.

Diante do que pode ser a maior manada de hipopótamos fora da África, uma “tragédia” é iminente, advertem especialistas.

Há alguns meses, um deles invadiu um encontro de pais e filhos no jardim da escola Balsora, em uma zona rural de Doradal.

“As mães se assustaram ao ver um animal deste tamanho (…) percebemos o perigo e entramos” para as salas de aula, relata à AFP a professora Dunia Arango, habituada a dar aulas com o ruído gutural dos hipopótamos ao fundo.

Desta vez, o animal se alimentou nas árvores frutíferas que contornam a escola e logo seguiu seu caminho rumo a um mercado.

Ferozes e imprevisíveis

Uma nova manada está se formando em um pequeno lago a uns 20 metros da escola, explicou David Echeverri, funcionário da autoridade ambiental local (Cornare).

“Há em torno de 35 crianças brincando, que podem se aproximar demais e gerar uma tragédia”, adverte o especialista.

Atrás dele, uma família de três hipopótamos se move pacificamente na água sem nenhum tipo de obstáculo.

“Apesar de os vermos muito tranquilos, a qualquer momento, com seu comportamento tão imprevisível, podem atacar, como já aconteceu”, agrega.

De seu lado, o pescador John Aristides (33 anos)lembra muito bem daquela tarde de outubro de 2021 quando lançou sua vara à beira de um riacho:

“Ele pulou em cima de mim e me bateu na cabeça com os lábios”, lembra Aristides, que caiu em sua fuga e não conseguiu evitar que o animal mordesse seu braço esquerdo.

“Me mordeu e me lançou a cerca de dois metros (…) não arrancou meu braço porque tem os dentes muito largos”, afirma o sobrevivente que passou quase um mês hospitalizado.

Este foi o mais perto de um encontro fatal na Colômbia, mas “se não fizermos nada, o que nos espera são milhares de hipopótamos perambulando”, antecipa Echeverri, que há algumas semanas enterrou um deles, atropelado por um motorista.

Caça a tiros?

Outro pescador, Álvaro Díaz (40), oferece passeios turísticos para quem deseja apreciar o pesado mamífero no Magdalena, o maior rio da Colômbia e onde o número de  hipopótamos aumenta.

Quando percebe que estão “chateados” se mantém a cerca de 30 metros, apesar de, às vezes, ficar a dez.

“Os vemos com muita frequência (…) convivemos com eles pacificamente”, afirma Díaz em sua canoa.

O pescador defende um “controle populacional” como solução, com castrações e contraceptivos.

A Cornare já tentou as duas estratégias, mas, segundo Echeverri, resultaram “caras e pouco efetivas”.

No ano passado, o Ministério do Meio Ambiente declarou os hipopótamos como “espécie invasora”, abrindo as portas para eventuais caças ao animal.

Echeverri destaca que sacrificá-los “sem dor, com uma metodologia tecnicamente correta, também não é fácil”, já que implica capturá-los e sedá-los para realizar uma espécie de eutanásia.

Uma pesquisa da estatal Universidade Nacional estima que, até 2035, a população pode chegar a mil hipopótamos e levanta a possibilidade de uma eliminação com armas de fogo, mas Echeverri e moradores rejeitam.

Transferidos para zoológicos

Em um esforço para “salvar sua vida”, o governo de Antioquia revelou no início do ano um plano para transferir cerca de 70 hipopótamos para santuários de fauna no México e Índia. Só falta a confirmação de autoridades da Colômbia e demais países.

Echeverri já liderou a captura e envio de sete exemplares a zoológicos do país e disse que o plano é “possível e necessário”.

Biólogos também advertem que a invasão destes animais desloca a fauna local, incluindo a vaca-marinha, um mamífero herbívoro que está na lista de espécies ameaçadas da União Internacional para a Conservação da Natureza.

Os fazendeiros reclamam dos estragos que causam, mas os outros moradores se afeiçoaram:

“Não levem todos. Já faz parte da nossa cultura conviver com eles e ter a companhia desta população é interessante”, justifica a professora Arango, com os olhos em seus alunos.

© Agence France-Presse

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