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Além de crise na Ucrânia, mundo tem 28 conflitos ativos e teme novas guerras

Quem lidera a lista com a maior quantidade de eventos registrados é a própria Ucrânia, segundo levantamento realizado entre 1º de janeiro e 11 de fevereiro pelo Projeto de Dados de Localização e Eventos de Conflitos Armados (Acled, na sigla em inglês)

FolhaPress

16/02/2022 18h08

Foto: AFP

Enquanto uma potencial guerra na Ucrânia dá sinais de arrefecimento com o recuo de tropas russas, ao menos outros 28 países passam por conflitos ou registram combates armados entre forças do governo e grupos rebeldes neste início de 2022. Neste cenário, uma pesquisa de opinião aponta que quase metade da população global diz ter medo de que seu país se envolva em uma guerra.

Quem lidera a lista com a maior quantidade de eventos registrados é a própria Ucrânia, segundo levantamento realizado entre 1º de janeiro e 11 de fevereiro pelo Projeto de Dados de Localização e Eventos de Conflitos Armados (Acled, na sigla em inglês) –foram considerados conflitos armados entre forças do governo, entre governo e rebeldes, e entre rebeldes, conforme metodologia do instituto.

Há países que figuram na base de dados, mas tiveram menos de dez eventos neste ano, como Burundi, Líbia, Azerbaijão e Venezuela. A Ucrânia, por sua vez, lidera a lista com 187 registros e se vê à beira de uma guerra desde a chegada de tropas russas em suas fronteiras, ainda no fim de 2021. Diante da ameaça, o ano de 2022 começou com diversas iniciativas diplomáticas visando uma desescalada nas tensões entre Ocidente e Rússia.

Os Estados Unidos e diversos países europeus acusam Moscou de querer invadir a Ucrânia –Washington inclusive deu repetidos alertas de que uma ação militar contundente dos russos poderia acontecer a qualquer momento. O Kremlin, por sua vez, segue negando a acusação e insiste em dizer que não quer guerra, apesar de manter um contingente de tropas próximo à fronteira. Sob o pretexto de passar um sinal de sua boa intenção, o presidente Vladimir Putin anunciou a retirada de parte de seus soldados.

O conflito na Ucrânia, no entanto, não vem de agora. Em 2014, uma guerra civil de separatistas pró-Kremlin eclodiu na região do Donbass, que está no centro da confusão. Desse conflito, o total de mortos já chega a 14 mil.

A tensão no país colabora para a impressão de que o mundo se tornou um lugar mais perigoso. Ou pelo menos essa é a percepção de, em média, 82% das pessoas entrevistadas pelo instituto Ipsos em 28 países entre setembro e outubro de 2021 –portanto, antes mesmo da atual crise entre Rússia, Ucrânia e Ocidente.

A pesquisa também avaliou o medo dos entrevistados acerca da possibilidade de que seus respectivos países se envolvam em conflitos bélicos. Os mais temerosos estão na Turquia, onde 76% expressaram receios sobre uma possível guerra. Os Estados Unidos aparecem na segunda posição, com 74%, e a Rússia, uma das protagonistas da crise mais recente, é o quinto país da lista, com 64%. Na média dos 26 países –a pergunta não foi feita na China e na Arábia Saudita–, o índice é de 46%.

Esse conceito de combate entre países, no entanto, é algo que ficou no século 20, explica Leticia Rizzotti, doutoranda em paz, defesa e segurança no programa de relações internacionais San Tiago Dantas. “O que se vê desde o fim dos anos 1980 e início dos 1990 é uma nova forma de conflito, muito letal e violento especialmente para civis.”

Nesse cenário, diz a pesquisadora, o alvo são grupos espalhados dentro do próprio país, que visam em sua maioria populações vulneráveis, e o Estado tem uma atuação de repressão.

É o caso visto nos cinco países que registram a maior violência entre os 29 da lista. Iêmen, Nigéria, Síria, Mianmar e Somália respondem por 44,6% dos eventos e 55% das mortes. “Todos esses são conflitos que vêm dessa onda mais forte dos anos 1990, especialmente de grupos armados. Todos eles têm uma característica muito forte, que é essa oposição [ao governo] e o controle do território, que o Estado não consegue fazer”, explica Rizzotti.

A especialista destaca ainda que esses países têm conflitos e grandes picos de violência há pelo menos 40 anos, com Iêmen e Síria ganhando um grau maior de periculosidade após a Primavera Árabe. É o Iêmen justamente que encabeça a lista do Acled, com 95 conflitos (ou seja, metade dos registros da Ucrânia) que somam ao menos 408 vítimas.

Para a ONU, a guerra esquecida no país é a mais grave crise humanitária do mundo. O conflito, que dura cerca de sete anos, já deixou mais de 10 mil crianças iemenitas mortas ou mutiladas, segundo o Unicef (fundo das Nações Unidas para a infância). Ao todo, 11 milhões de crianças –ou quatro a cada cinco no país– precisam de ajuda humanitária, 2 milhões estão fora da escola e 400 mil sofrem de má-nutrição severa.

Ainda no Oriente Médio, a guerra na Síria, que começou em meio à Primavera Árabe em 2011 para derrubar o ditador Bashar al-Assad, dura até hoje –assim como a permanência de seu líder no poder.

Também lá a Rússia tem seu papel apoiando a ditadura e, mais uma vez, fica do lado oposto aos EUA. Moscou dá suporte com ataques aéreos, o núcleo de sua presença militar na Síria, mas também têm tropas espalhadas em pontos da região norte do país. Washington diminuiu seu contingente, mas ainda há unidades no país do Oriente Médio.

No caso dos países africanos, há disputas contra grupos fundamentalistas islâmicos. Na Nigéria, o Boko Haram é uma das principais forças, apesar de haver dissidentes que também são atores da violência.

A Somália, por sua vez, enfrenta uma guerra civil que já dura 30 anos, mas o conflito também gira em torno do Al-Shabaab. Assim como na Nigéria, há outros grupos, como o Ahlu Sunnah Wal Jama, na região de Guriel (a 450 km da capital, Mogadíscio), que vem sendo palco de uma escalada de tensões com forças do governo.

O mais recente conflito entre esses países é o de Mianmar, alvo de um golpe de Estado em 1º de fevereiro de 2021. Já havia registros no ano passado, mas eram poucos: 29 eventos com 15 mortes. Os números saltaram para 117 e 252, respectivamente, neste ano.

No país asiático, as forças da junta militar que agora controla o país têm sufocado os protestos contra o golpe, ao mesmo tempo em que prometem devolver o comando aos civis em uma eleição “livre e justa” em agosto de 2023. A ex-líder civil, Aung San Suu Kyi, 76, porém, está sendo julgada por mais de uma dúzia de crimes, que podem somar até 150 anos de prisão –acusações que críticos dizem ter como objetivo garantir que ela nunca mais retome a atividade política.

Para Rizzotti, uma das principais dificuldades da resposta a esses conflitos é a maneira com a qual eles são fragmentados. “Não há um front de batalha, não há uma linha óbvia onde exércitos vão se encontrar. A guerra ocorre com grupos espalhados e com táticas variadas.”

Atos de terrorismo são outra característica destacada pela pesquisadora. “Exércitos regulares deveriam cumprir algum tipo de protocolo, como a Convenção de Genebra. Não é o caso desses conflitos, que registram violações de direitos humanos.”

Assim, países que apresentam conflitos com essas características, com grupos vulneráveis sem proteção e sem infraestrutura estatal, tornam-se mais perigosos do que os que registram “guerras clássicas”, como exércitos mobilizados.

29 países registram conflitos ativos em 2022:

Ucrânia
Somália
Síria
Mianmar
Iêmen
Afeganistão
Iraque
Burkina Fasso
Etiópia
Mali
Nigéria
Paquistão
Colômbia
Índia
Sudão do Sul
Filipinas
Rep. Democrática do Congo
Camarões
Venezuela
Egito
Quênia
Tailândia
Indonésia
Níger
Azerbaijão
Líbia
Senegal
Costa do Marfim
Burundi

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