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Economia

Ponto para Haddad: arcabouço fiscal poderia ser pior

Manter as despesas crescendo abaixo do ritmo do aumento das receitas pode ter um impacto mais forte do que se imagina

Redação Jornal de Brasília

08/05/2023 6h12

Foto: José Cruz/ Agência Brasil

Se a simplicidade é o estágio superior da sofisticação, a engenhoca que dá forma ao novo marco fiscal pode ser vista como uma peça rudimentar. As regras propostas remetem a um labirinto tão complexo que sugerem algo proposital.

O trabalho de equilibrista do ministro Fernando Haddad foi o de satisfazer (ou desagradar igualmente) dois polos antagônicos. De um lado, o núcleo duro do PT, ao qual parece ter aderido o presidente Lula da Silva, para quem cogitar o controle de gastos públicos representa um atentado à dignidade humana. Eles acreditam que gastos públicos geram crescimento e aumentam a arrecadação de impostos, fechando logo adiante o círculo do autofinanciamento.

A esse desvario se contrapõe o fundamentalismo primitivo de boa parte dos analistas do mercado, que embarcaram na falácia do teto de gastos e para quem apenas um crudelíssimo corte de despesas equaciona o crescimento da dívida. Ignoram que as condições políticas para uma reforma administrativa não estão colocadas e que a lei do teto, de resto impraticável, apenas sucateou os serviços públicos. Portanto, se a intenção foi embaralhar as cartas e confundir, o novo marco já cumpre o seu papel.

Manter as despesas crescendo abaixo do ritmo do aumento das receitas pode ter um impacto mais forte do que se imagina. Olhemos para trás: as variações em 12 meses da despesa total do governo central entre janeiro de 2000 e março de 2023 (279 observações) registram uma média de 12,2% ao ano, acima da variação anual média das receitas administradas pela Receita Federal, da ordem de 11,5%.

Se as despesas tivessem crescido a um ritmo de 70% do aumento dos impostos, como agora se propõe, teríamos hoje um quadro bem mais favorável para a dívida pública. Também é positivo que o crescimento real das despesas esteja limitado a um máximo de 2,5% ao ano, bem menos que os 5,4% de crescimento real registrado nesse período.

A relação dívida/PIB, por sua vez, poderá ter uma trajetória digerível se o governo for capaz de gerar superávits primários e, após o dadivoso beneplácito do Banco Central, os juros forem mais baixos. Nesse período de janeiro de 2000 a março de 2023, o crescimento médio anual do PIB nominal (tomando como referência a estimativa mensal do Banco Central) foi de 10,2%, bem acima dos 70% do crescimento da receita, cerca de 8% ao ano. Os números são muitos e as simulações, infinitas, o que desautoriza previsões fatalistas.

A nova regra não é boa, mas poderia ser pior. Sua complexidade anestesiou a virulência petista e mesmo o mercado não se contorceu em convulsões. É o que temos. Ponto para o ministro.

Estadão Conteúdo

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