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Economia

Ibovespa cai 2,15%, a 116,1 mil pontos, em maior queda desde 2 de maio

A quinta-feira pós-Copom alinhou a decepção quanto ao fechamento da porta, no curto prazo, para aceleração do ritmo de queda da Selic

Redação Jornal de Brasília

21/09/2023 19h00

Foto: Reprodução/ Flickr

A quinta-feira pós-Copom alinhou a decepção quanto ao fechamento da porta, no curto prazo, para aceleração do ritmo de queda da Selic com o sinal do Federal Reserve, emitido no mesmo dia, de que os juros americanos permanecerão altos por mais tempo – o que contribui para alimentar a percepção de que o BC americano talvez não consiga levar a maior economia do mundo a um pouso suave. Assim, desde a manhã, o dia foi de aversão a risco, com dólar e curva de juros em alta, e queda para o Ibovespa e demais índices de ações, da Ásia à Europa e aos Estados Unidos.

Aqui, a referência da B3 acentuou mínima em direção ao fechamento da sessão, com piora também nas ações de Petrobras (ON -1,44%, PN -1,55%), que até o meio da tarde mostravam ajuste mais comportado. Assim, com desempenhos ruins de outros carros-chefes – como Vale (ON -2,61%, mínima do dia no fechamento) e, entre os grandes bancos, Bradesco (ON -4,29%, PN -3,71%) -, o Ibovespa encerrou em baixa de 2,15%, aos 116.145,05 pontos, entre mínima de 116.012,92, às 16h35, e máxima de 118 695,09 pontos, correspondente à abertura do dia.

O giro financeiro subiu a R$ 26,1 bilhões nesta quinta-feira, o que não costuma ser bom sinal em dias bem negativos como hoje. Na semana, o Ibovespa acumula perda de 2,20%, limitando o avanço a apenas 0,35% no mês e a 5,84% no ano. Foi a maior queda para o Ibovespa desde 2 de maio, quando havia recuado 2,40%, com o índice retrocedendo agora a nível não muito distante do fechamento de 8 de setembro, então aos 115,3 mil pontos.

“O Copom reconheceu uma piora no cenário externo, que se mostrou ‘mais incerto’ – como no comunicado de agosto. O comitê mostrou preocupação diante da alta das taxas de juros americanas”, observa em nota Alexandre Lohmann, economista-chefe da Constância Investimentos, em que destaca também o “uso do plural” no comunicado do Copom da noite passada, em que o comitê, faltando apenas as reuniões de novembro e dezembro para a conclusão do ano, sinaliza estar “fechando a porta para aceleração do ritmo de corte” da Selic ainda em 2023. 

Até a reunião desta semana, parte minoritária do mercado considerava que poderia haver espaço para um corte maior, de 0,75 ponto porcentual, em dezembro – perspectiva frustrada pelo comunicado da quarta-feira, que ancora a visão de que a Selic fechará 2023 a 11,75%, com cortes de meio ponto, cada, nessas últimas duas reuniões do ano. Ontem, conforme esperado, o Copom reduziu a taxa básica de juros em meio ponto porcentual, de 13,25% para 12,75% – foi o segundo corte consecutivo da Selic, ambos de meio ponto, partindo de 13,75%.

“Avaliamos o comunicado como neutro”, aponta em nota Sérgio Goldenstein, estrategista-chefe da Warren Rena. “Pelo lado mais hawkish, nota-se um aumento da preocupação com o ambiente externo e com a execução das metas fiscais”, acrescenta o economista. Acelerar o ritmo de redução da Selic neste momento, argumenta Goldenstein, não seria um sinal positivo para a ancoragem de expectativas, na medida em que, desde a reunião anterior, “não se materializaram surpresas positivas substanciais que elevem ainda mais a confiança na dinâmica desinflacionária prospectiva”.

“Para termos uma leitura mais sólida dos próximos passos do BC, será preciso ver como vai se desenrolar toda essa questão de meta de déficit e arrecadação do governo”, diz Felipe Moura, sócio e analista da Finacap Investimentos. Para 2024, o governo se comprometeu com uma meta de déficit zero, que o mercado tem consumido com muitas pitadas de sal ante as dificuldades evidentes pelo lado da receita, sem cortes de despesa. Nesse contexto, a arrecadação em agosto, divulgada hoje de manhã pela Receita Federal, teve queda real de 4,14% ante o mesmo mês do ano passado e de 14,59% em relação a julho. 

Após a divulgação desses dados, o chefe do Centro de Estudos Tributários e Aduaneiros da Receita Federal, Claudemir Malaquias, comentou que, depois de arrecadação recorde ao longo de 2022, os tributos ligados às empresas estão ditando o desempenho da arrecadação no ano em curso. Dessa forma, o recolhimento do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) caiu 23,30% na comparação entre agosto de 2023 e o mesmo mês do ano passado. 

Compondo esta cautela maior com relação ao caminho dos juros vis-à-vis inflação e ritmo de atividade, aqui e no exterior, o tom geral do Federal Reserve, na tarde de ontem, foi recebido como hawkish, ou seja, ainda duro e restritivo com relação ao viés para a política monetária dos Estados Unidos. 

Assim, a manutenção da taxa de juros de referência do Reino Unido, nesta quinta-feira, não fez muito efeito nem menos em Londres, onde o índice FTSE 100 fechou o dia em baixa de 0,69%. Na Europa, destaque hoje para queda de 1,59% no índice de ações de Paris (CAC 40); na Ásia, para baixa de 1,37% em Tóquio (Nikkei 225); e em Nova York, para queda de 1,82% no Nasdaq, índice de tecnologia que reúne as ações de crescimento, mais expostas à perspectiva de curto prazo para os juros americanos.

Na avaliação de James Briggs, gestor de portfólio na equipe de crédito corporativo da Janus Henderson, o Fed entregou ontem “mensagem hawkish, mantendo a orientação de que ainda é esperado um novo aumento de taxa de juros nos últimos meses do ano”. 

“O Resumo de Projeções Econômicas foi atualizado para refletir uma economia mais resiliente do que a antecipada, com os mercados de trabalho e o consumo, em particular, tendo surpreendido positivamente nos últimos meses”, acrescenta o gestor, em nota. “O presidente Jerome Powell, do BC dos EUA reconheceu que a incerteza em torno dessas previsões permanece alta, continuando a destacar que o Fed permanece dependente dos dados, e que a totalidade dos dados recebidos será instrumental na evolução das taxas de juros daqui para frente.”

Com a aversão global a risco que se impôs nesta quinta-feira, as ações de maior peso e liquidez na B3 operaram em bloco no negativo, com destaque para Vale, afetada também pelo ajuste do minério de ferro na China, que caiu hoje quase 2% em Dalian. No setor metálico, além de Vale, destaque também para a retração em Gerdau (PN -2,32%) e Usiminas (PNA -2,66%). Entre os grandes bancos, as ações do Bradesco voltaram a estar entre as mais pressionadas, mas o dia foi ruim também para nomes como Itaú (PN -2,28%), BB (ON -2,29%) e Santander (Unit -1,77%, na mínima do dia no fechamento).

Petrobras – que hoje acentuou correção em direção ao fechamento, contribuindo para a piora do Ibovespa – vira para baixo na semana (ON -0,08%, PN -0,38%), com desempenho também negativo do petróleo no intervalo: no mês, as ações da petroleira ainda sobem 6,75% e 5,70%, respectivamente. Na ponta negativa do Ibovespa na sessão, destaque para Magazine Luiza (-6,75%), Soma (-6,71%) e Arezzo (-5,71%). No lado oposto, Suzano (+2,04%), Sabesp (+2,03%, Natura (+1,95%) e CSN Mineração (+1,54%). Apenas sete ações do Ibovespa conseguiram fechar o dia com ganhos.

Dólar

O dólar à vista encerrou a sessão desta quinta-feira, 21, em alta de 1,13%, cotado a R$ 4,9352, perto da máxima, a R$ 4,9362, registrada na reta final dos negócios com o aprofundamento da baixa do Ibovespa. A perda de força do real ocorreu em meio a uma onda de fortalecimento da moeda americana no exterior e à alta das taxas longas dos Treasuries, ainda sob o impacto da decisão de ontem do Federal Reserve. Embora tenha mantido a taxa básica no intervalo entre 5,25% e 5,50%, o banco central americano deixou a porta aberta para uma alta adicional dos juros e sinalizou manutenção de política monetária restritiva por período prolongado.

Como é de praxe em episódios de ajuste global de portfólios motivados por aversão ao risco, o real amargou as piores perdas entre as principais moedas emergentes e de países exportadores de commodities. Operadores explicam que é mais fácil para os investidores reduzirem posições em real, dado que a divisa brasileira é mais líquida e, portanto, oferece opção de saída com custos menores. Apesar do escorregão hoje, o real e as demais divisas latino-americanas de países com juros altos, mas chamadas “moedas de carrego”, seguem liderando os ganhos em relação ao dólar em 2023. Destaque para os pesos colombiano e chileno, com valorização de dois dígitos. 

Por aqui, analistas afirmam que decisão do Banco Central brasileiro, ontem à noite, de cortar a taxa Selic em 0,50 ponto porcentual, para 12,75% ao ano, e indicar novas reduções de igual magnitude nos próximos meses ainda não tira a atratividade do real. Apesar do estreitamento do diferencial entre juros interno e externo, o Brasil segue oferecendo taxas reais elevadas para os estrangeiros.

A economista-chefe da Armor Capital, Andrea Damico, classificou o comunicado do Copom como “um pouco mais duro na margem”. Além de um recado de que é necessário cumprir as metas fiscais para ancoragem das expectativas de inflação, o comitê sinalizou que pretende manter o atual ritmo de cortes “nas próximas reuniões”, o que tende a reduzir as apostas em redução da Selic em 0,75 ponto porcentual em dezembro.

“A rigor, o Copom ter sido um pouco mais duro deveria, em tese, contribuir para um desempenho melhor do real, mas o ambiente externo está preponderando hoje. A reação adicional ao Fed está levando a abertura dos Treasuries e ao fortalecimento do dólar”, afirma Damico, ressaltando que as projeções dos integrantes do BC americano para juros e indicadores econômicos em 2024 e 2025, incluídas no chamado ‘gráfico de pontos’, trouxeram uma mensagem “bastante dura” para o mercado. “E o Powell, que costumava suavizar o comunicado, desta vez manteve um tom firme, reforçando a confiança de que a atividade está resiliente, o que demanda mais juros”, acrescenta a economista, em referência a declarações do presidente do Fed, Jerome Powell, em entrevista coletiva.

Juros

Os juros futuros fecharam em alta firme, vista desde a abertura, amparada nos ajustes aos comunicados do Federal Reserve e do Copom. Enquanto a mensagem do Copom tentou esfriar as apostas na aceleração do ritmo de queda da Selic, o Fed sugeriu juros elevados por mais tempo nos EUA e manteve na mesa a possibilidade de novos aumentos ainda este ano.

A ponta curta subiu menos do que a longa, com ganho de inclinação atribuído especialmente ao ambiente internacional, marcado pelo avanço dos retornos dos Treasuries e do dólar. Nesse ambiente de cautela, o Tesouro optou por não adicionar pressão à curva, trazendo lotes menores no leilão de prefixados

A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2025 fechou em 10,56%, de 10,48% ontem no ajuste. O DI para janeiro de 2027 tinha taxa de 10,55%, de 10,39% ontem, e a do DI para janeiro de 2029 cruzou novamente a linha dos 11%, marcando 11,10%, de 10,93% ontem.

Não fosse o “efeito Fed”, a curva teria perdido inclinação considerando o comunicado do Copom considerado “hakwish”, que buscou colocar um freio à ideia de ampliação na magnitude dos cortes da taxa básica para 0,75 ponto ao menos no curto prazo.

A decisão de reduzir a Selic para 12,75% estava precificada, mas o mercado alimentava esperanças de que se a melhora da inflação subjacente vista nos últimos índices de preços se consolidasse haveria espaço para doses maiores de corte, na medida em que também se espera que a atividade responda mais fortemente ao aperto monetário.

Mas os diretores relativizaram o alívio da inflação subjacente, destacaram a resiliência da atividade e o ambiente externo incerto, com aumento dos juros longos nos EUA e perspectiva de menor crescimento na China. De quebra, reforçaram a importância da firme persecução das metas fiscais, o que foi lido como um recado à Fazenda e ao Congresso.

“O Comitê reconhece que a conjuntura atual segue sendo marcada por um estágio do processo desinflacionário que tende a ser mais lento e por expectativas de inflação que apresentam apenas uma reancoragem parcial”, avaliam os economistas da Genial Investimentos. Para os profissionais, este cenário demanda serenidade e moderação na condução da política monetária, reforçando a necessidade de perseverar em nível contracionista até que se consolidem o processo de desinflação e a ancoragem das expectativas.

Contudo, o economista-chefe do Banco Bmg, Flávio Serrano, afirma que o impacto na precificação de Selic nos DIs foi pequeno. “A chance de corte de 75 pontos está entre 10% e 20% nas próximas duas reuniões. Não está muito diferente de ontem. Para o fim do ano, ontem estava entre 11,50% e 11,75% e hoje está mais para 11,75%”, explicou.

As taxas longas, que deveriam ceder com o “corte hawkish” do Copom, avançaram mais de 15 pontos-base, com a curva local espelhando a americana, que também ganhou inclinação. No fim da tarde, o yield da T-Note de dez anos avançava a 4,48%, no pico ainda desde 2007.

Na gestão da dívida, diante do estresse na curva, o Tesouro diminuiu a oferta de LTN para 3 milhões, ante 11 milhões na semana passada, no leilão de prefixados. O volume de NTN-F, que no leilão anterior foi de 1,050 milhão, hoje foi de apenas 300 mil. “O Tesouro acertadamente segurou os lotes, mas mesmo assim o mercado não melhorou”, comentou o estrategista de renda fixa da BGC Liquidez Daniel Leal, reiterando que a redução se deu mais por opção da instituição do que pela falta de demanda.

Estadão Conteúdo

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