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Economia

Dólar sobe 0,38% e fecha a R$ 5,0545 com estresse dos Treasuries e guerra

O real, que costuma apanhar mais em períodos de aversão ao risco, nesta quarta apresentou o melhor desempenho entre pares latino-americanos

Redação Jornal de Brasília

18/10/2023 18h31

O dólar à vista encerrou a sessão desta quarta-feira, 18, em alta no mercado doméstico de câmbio, em dia marcado por valorização da moeda americana no exterior e avanço firme das taxas dos Treasuries mais longos. Com mínima a R$ 5,0302 e máxima a R$ 5,0759, a divisa fechou cotada a R$ 5,0545, valorização de 0,38%. Na semana, a moeda ainda acumula baixa de 0,67%, graças ao tombo de 1,01% na segunda-feira, 16. O real, que costuma apanhar mais em períodos de aversão ao risco, nesta quarta apresentou o melhor desempenho entre pares latino-americanos. Pesos colombiano e mexicano amargaram perdas superiores a 1%. 

Segundo operadores, mais uma vez a formação da taxa de câmbio foi ditada pelo quadro externo, com as questões fiscais domésticas sendo apenas monitoradas. Aos temores relacionados aos desdobramentos geopolítico da guerra entre Israel e o grupo palestino Hamas se somam preocupações com a situação fiscal dos EUA, em meio ao ressurgimento do fantasma de paralisação da máquina pública (shutdown). Há risco de aumento de gastos com ajuda militar americana a Israel e, em um pior cenário, envolvimento direto dos EUA no conflito. O governo do Irã pediu aos países muçulmanos que lancem um embargo petrolífero a Israel em retaliação à explosão de um hospital na Faixa de Gaza. As cotações do petróleo voltaram a subir, com o contrato do tipo Brent para dezembro acima de US$ 91 o barril. 

A força do dólar no exterior também deriva da perspectiva de que, após uma esperada pausa no aperto monetário em novembro, o Federal Reserve possa promover uma alta adicional dos juros em dezembro. Mesmo com integrantes do BC americano argumentando que a alta das taxas dos Treasuries representa aperto das condições financeiras e pode fazer o “trabalho sujo da política monetária”, é mantido o discurso de juros elevados por período prolongado. 

Divulgado à tarde, o livro Bege – sumário das condições econômicas elaborado pelo Fed – mostrou pouca ou nenhuma mudança no quadro da atividade. 

O economista chefe da Western Asset, Adauto Lima, observa que dados recentes mais fortes de atividade nos EUA, que enfrentam déficit fiscal crescente, e questões técnicas de oferta e demanda de títulos estão por trás do estresse das taxas dos Treasuries. E a alta dos juros longos dos EUA, por sua vez, é a principal responsável pela depreciação das divisas emergentes. “Isso tem dominado o cenário. Ao contrário do que se poderia imaginar em momentos de aversão ao risco, quando há alocação em Treasuries e as taxas caem, vemos um movimento contrário”, diz Lima, observado que o avanço dos yields dos títulos americanos, que começou entre meados de julho e início de agosto, se intensificou em outubro. 

Segundo Lima, diferentemente do que se observou na primeira onda de alta dos juros longos nos EUA, desta vez as moedas emergentes não apresentam o mesmo grau de depreciação. “Não é um movimento tão coordenado como foi lá trás. O real tem tido um desempenho na margem melhor, ajudado pela alta do petróleo e de outras commodities”, diz Lima, que ainda vê riscos de piora do humor lá fora, dada a “inconsistência fiscal” nos EUA, que pode se acentuar com “esforços de guerra”, e as incertezas sobre onde as taxas americanas vão se acomodar. 

O presidente dos EUA, Joe Biden, afirmou nesta quarta, em discurso em Tel-Aviv, que vai pedir ao Congresso americano que aprove um “pacote de defesa sem precedentes a Israel”, e enfatizou que os EUA vão apoiar o país até o fim da guerra. Resolução sugerida pelo Brasil no Conselho de Segurança da ONU que propunha “pausa humanitária” em Gaza para socorrer civis foi vetada pelos EUA. Em meio a impasse em torno da eleição de um novo presidente para a Câmara dos Representantes, o Congresso americano tem de aprovar o Orçamento Federal dos EUA até novembro para evitar uma paralisação parcial da máquina pública

Taxas de juros

Os juros futuros tiveram uma sessão volátil, mas o sinal de alta prevaleceu na maior parte do dia sobre as taxas, que chegaram a testar um alívio em parte da tarde. De maneira geral, o estresse do mercado internacional, sobretudo vindo da curva americana, continuou conduzindo os negócios, nesta quarta-feira agravado pelo noticiário sobre a guerra entre Israel e Hamas.

A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2025 fechou em 11,12%, de 11,03% no ajuste anterior, e a do DI para janeiro de 2026 passou de 10,89% para 11,03%. O DI para janeiro de 2027 projetava no fechamento taxa de 11,18% (11,07% na terça) e a do DI para janeiro de 2029 subiu de 11,50% para 11,55%.

A melhora da curva entre o começo até o meio da tarde, segundo profissionais da renda fixa, não teve gatilho específico, atribuída a ajustes técnicos relacionados aos prêmios elevados embutidos nos vencimentos, especialmente os de longo prazo. A ponta curta também chegou a virar para baixo, com alguns players destacando a fala do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.

Durante evento promovido pelo Credit Suisse, ele negou ter afirmado que, em reunião fechada com investidores no último dia 11, ser maior a probabilidade de uma desaceleração do que uma aceleração no ritmo de cortes da Selic. “Eu em nenhum momento falei nada nem remotamente parecido com o que foi interpretado, de que a probabilidade de uma coisa era maior do que a outra”, disse. Campos Neto ainda aproveitou para reforçar que o BC entende que o ritmo de cortes de 0,5 ponto porcentual é adequado

A economista-chefe do TC, Marianna Costa, acredita que o Copom “vai mesmo de 0,5 em 0,5”, até porque os dados recentes de atividade no Brasil dão margem para a manutenção do ritmo ao mostrarem menor impulso, sugerindo estagnação da economia ou até PIB negativo no terceiro trimestre. Nesta quarta, as vendas do varejo restrito mostraram queda de 0,2% em agosto ante julho, melhor do que a mediana das estimativas coletadas pelo Projeções Broadcast de -0,8%, mas no conceito ampliado houve redução de 1,3%, maior do que o consenso que também era de -0,8%. “Mas há dúvida sobre até onde é possível chegar com o ciclo de cortes”, pondera.

Assim como visto na terça após a divulgação da Pesquisa Mensal de Serviços (PMS), nesta quarta o mercado mal teve tempo de repercutir as vendas do varejo. O aumento da pressão dos Treasuries se sobrepôs, com os yields renovando máximas após o presidente dos EUA ter reiterado apoio a Israel. Num momento em que as preocupações fiscais no país já são crescentes, Biden disse que pedirá ao Congresso um pacote “sem precedentes” para envio de equipamento de defesa e ajuda humanitária. Nas máximas, a taxa da T-Note de dez anos, referência para ativo livre de risco, chegou a 4,93%.

Uma das ameaças inflacionárias globais vem do petróleo, que nesta quarta voltou a superar US$ 90 no caso do Brent, em meio às incertezas no Oriente Médio.

Marianna Costa, do TC, afirma que ainda não há clareza sobre os efeitos da guerra sobre os ativos, ao menos enquanto o conflito estiver restrito à região. “Se houver impacto no petróleo, traz risco inflacionário, mas se este for mais duradouro, de longo prazo, contaminará a atividade global”, afirma.

Bolsa

O Ibovespa registrou nesta quarta-feira seu menor nível de fechamento desde 5 de outubro, antes do ataque sem precedentes do Hamas a Israel no dia 7, encerrando a sessão desta quarta-feira em baixa de 1,60%, a 114.059,64 pontos. Em porcentual, foi a pior queda do índice desde 21 de setembro, quando cedeu 2,15%. 

A princípio, o spike do petróleo havia contribuído para algum equilíbrio ao Ibovespa nesse intervalo de incerteza global, mas nesta quarta o avanço de Petrobras (ON +2,34%, PN +2,26%), com o Brent acima de US$ 91 por barril, foi contraponto insuficiente para a queda de 3,67% em Vale (ON) e de até 2,09% (Itaú PN) entre os grandes bancos.

Nesta quarta, oscilou entre mínima de 113.952,11, no fim da tarde, e máxima de 115.907,04 pontos, correspondente ao nível de abertura. Com o Ibovespa no negativo ao longo de toda a sessão, e acentuando perda do meio para o fim do dia, o giro financeiro desta quarta-feira, a R$ 49,2 bilhões, foi fortalecido pelo vencimento de opções sobre o índice. Na semana, o Ibovespa passou nesta quarta para o negativo (-1,46%), ampliando a 2,15% a perda acumulada no mês. No ano, ainda avança 3,94%.

“Há um cenário de incerteza global profunda, em que se acrescenta um conflito no Oriente Médio às dúvidas sobre o nível de juros nos Estados Unidos. De duas semanas para cá, ficou bem menos claro se o Federal Reserve poderá fazer ou não uma pausa em dezembro no ciclo de elevação dos juros de referência. Está bem mais difícil para o investidor montar posição ante o grau geral de incerteza. E isso num contexto de redução significativa da liquidez, do ano passado para cá, o que amplifica o efeito de cada movimento sobre as ações”, diz Adriano Yamamoto, diretor comercial da corretora do C6 Bank.

Se no ano passado, o volume diário na B3 estava na faixa de R$ 32 bilhões a R$ 33 bilhões, em 2023 tem ficado entre R$ 20 bilhões e R$ 21 bilhões, aponta Yamamoto – e quando se expurga a participação aproximada de operações de alta frequência, a presença relativa de assets e dos investidores institucionais pode ter se suavizado ainda mais do que o número agregado sugere Além disso, há a retração do investidor estrangeiro, que chegou a comprar quando os institucionais e os de varejo já buscavam acomodação na Selic.

O cenário de juros longos em torno de 5% nos Estados Unidos drena fluxo antes destinado em parte a emergentes, onde a renda fixa vinha se mostrando muito atrativa também em países como o Brasil, com a Selic em dois dígitos, mesmo quando se considera pontos de entrada favoráveis, em termos de fundamento das empresas e de análise do Ibovespa, vis-à-vis os preços disponíveis. Ou seja, está bem difícil oferecer Bolsa aos investidores como alternativa aos juros, em cenário macro ainda pautado por elevado nível de incerteza e de aversão a risco, apesar dos descontos que vão se acumulando em certos papéis. 

Nesta quarta-feira, em evento promovido pelo Credit Suisse, o presidente do Banco Central apontou que o spike global observado nos juros de mercado tem um componente que reflete a piora na percepção fiscal – ou seja, os investidores estão exigindo taxas maiores para financiar os governos, ante o ritmo dos gastos públicos. Campos Neto observou também que o Credit Default Swap (CDS) dos Estados Unidos, usado como métrica de risco-país, tem mostrado piora relevante que, segundo ele, parece estar relacionada ao risco fiscal, reportam os jornalistas Cícero Cotrim e Eduardo Rodrigues, do Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado.

Nesse contexto, “a única notícia positiva para o mercado financeiro, nesta quarta, foi o PIB da China no terceiro trimestre, acima do esperado, com a injeção de dinheiro na economia para tentar alcançar a meta de crescimento do ano, de 5%. Por outro lado, quando se vê as leituras combinadas dos dados do varejo e do setor de construção nos Estados Unidos, ressurge a preocupação sobre a inflação americana, que colocou nesta quarta os juros de 10 anos a 4,90% no país, em nível muito alto”, diz Marco Prado, CIO da BullSide Capital.

Ele acrescenta que o movimento nos juros de mercado nos EUA mais uma vez estressou as bolsas em todo o mundo. “Só não foi pior na B3 porque Petrobras voltou a subir nesta quarta, em máxima histórica para a ação, contrariando a tudo e a todos”, acrescenta Prado, em referência à percepção dos que acreditavam que a precificação do ativo pioraria sob o novo governo.

Na ponta ganhadora do Ibovespa nesta quarta-feira, além de Petrobras, destaque também para Magazine Luiza (+2,37%), JBS (+1,05%) e BB Seguridade (+0,89%) – na sessão, 14 dos 86 papéis da carteira do índice conseguiram evitar perdas. No lado oposto, MRV (-10,08%), Gol (-7,18%) e Assai (-6,48%).

Estadão Conteúdo

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