RAQUEL LOPES
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS)
O Ministério da Saúde exonerou o coordenador do Dsei (Distrito Sanitário Especial Indígena) Médio Rio Purus, Antônio Cícero Santana da Silva Apurinã, por suspeita de assédio sexual contra servidoras. A unidade do Dsei fica no município de Lábrea, no interior do Amazonas.
A exoneração definitiva foi publicada em 11 de setembro, após denúncias feitas à pasta por subordinados do então coordenador. Ele havia sido nomeado para o cargo em fevereiro do ano passado.
Ao menos quatro casos foram denunciados às autoridades. Há também denúncias de assédio moral envolvendo homens e mulheres.
As acusações foram também enviadas ao Ministério Público Federal em Rondônia e no Amazonas.
Acionaram também a Polícia Federal nos dois estados, além da Polícia Civil do Amazonas. A PF em Rondônia abriu uma apuração e já colheu depoimentos. O assunto mobilizou a Comissão de Saúde da Câmara Municipal do Lábrea.
É mais um caso de acusação de assédio sexual envolvendo servidores do governo Lula (PT). No mês passado, Silvio Almeida foi demitido do Ministério dos Direitos Humanos após ser alvo de denúncia feita à organização Me Too Brasil.
São atribuídas a Apurinã propostas de sexo a servidoras que, ao resistirem, passavam a sofrer de assédio moral, transferidas para áreas isoladas da região amazônica. Em casos mais extremos, essas servidoras teriam sido dispensadas de seus postos.
Apurinã tem sido procurado pela reportagem por ligação e por mensagem desde sexta-feira (27), mas não retornou os contatos até a publicação deste texto. O Ministério da Saúde disse, por nota, que o Dsei irá colaborar com as autoridades no processo investigativo.
Vítimas relataram os abusos à reportagem sob a condição de anonimato. Elas expressaram medo de represálias e perseguições, caso tenham suas identidades expostas.
Uma delas relatou o padrão de comportamento do suspeito durante viagens a trabalho. Afirmou que era frequentemente escalada para missões aos territórios sob a responsabilidade do Dsei, em jornadas que duravam até 20 dias em um barco em que todos os servidores dormiam em redes.
Por ser o chefe, narrou a servidora, o coordenador ficava no “camarote”, em uma área privativa do barco.
Ela contou que era frequentemente chamada ao local e que as conversas eram marcadas por excesso de elogios, toques invasivos, mãos nos cabelos e promessas de promoções ou cargos melhores.
Mesmo sem êxito nas investidas, disse a servidora, o coordenador comentava abertamente com indígenas que ainda manteria relações sexuais com ela. Ela afirmou que foi demitida e hoje precisa fazer tratamento psicológico.
No Dsei Médio Rio Purus, a maioria dos trabalhadores é terceirizada, o que segundo as denúncias cria uma dinâmica de vulnerabilidade para os funcionários e funcionárias. Essa precarização facilitaria a prática de ameaças, demissões arbitrárias e favorecimentos em troca de favores pessoais.
A reportagem ouviu o relato de outras vítimas, incluindo uma jovem que enviou seu currículo ao Dsei na esperança de conseguir uma vaga de trabalho.
O que começou como tentativa legítima de emprego acabaria por se transformar em uma perseguição por quase dois meses, de acordo com ela. O coordenador teria pedido “paciência” e dito que a contratação seria feita, mas logo iniciou o assédio sexual.
A vítima disse que recebia do coordenador mensagens elogiosas, pedidos para que comparecesse ao Dsei fora do horário de funcionamento. Em certo ponto, ele teria sugerido, caso ela cedesse aos seus desejos, que o processo de contratação seria facilitado.
O Dsei fica no município de Lábrea, que pertence ao estado do Amazonas. Entretanto, as denúncias foram feitas nos dois estados porque a cidade fica mais próxima de Porto Velho, Rondônia. O distrito atende uma população de 12.357 indígenas, entre aldeados e urbanos, em 128 aldeias.
A Polícia Civil do Amazonas informa que todos os procedimentos instaurados sobre o caso foram remetidos à Polícia Federal para apuração.
A PF em Rondônia, por sua vez, disse por nota que não se manifesta sobre eventuais investigações em andamento. A corporação policial no Amazonas e o Ministério Público Federal nos dois estados foram procurados, mas não se manifestaram.