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Música

Patrimônio dos chorões e choronas do Brasil

O choro – gênero popular instrumental – conquistou o registro como Patrimônio Cultural do Brasil no livro das formas de expressão.

Amanda Karolyne

29/02/2024 23h02

Leandro Grass, presidente do Iphan, junto com Reco do Bandolim, presidente do Clube do Choro, comemoram a aprovação do registro do Choro como patrimônio cultural do Brasil. Foto: Amanda Karolyne/ Jornal de Brasília

Leandro Grass e Reco do Bandolim comemoram. Foto: Amanda Karolyne/ Jornal de Brasília

Primeiro gênero popular e instrumental brasileiro, o choro conquistou o registro como Patrimônio Cultural do Brasil no livro das formas de expressão. O reconhecimento foi aprovado por unanimidade na 103ª Reunião do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, realizada nesta quinta-feira (29) no Instituto do Patrimônio Cultural e Artístico Nacional (Iphan). Este que é um dos principais ritmos do país veio para Brasília em 1960, onde criou raízes com a fundação do Clube do Choro, patrimônio imaterial da cultura do Distrito Federal.

Esse é um momento importante para todos os chorões e choronas do país, segundo o presidente do Clube do Choro, Reco do Bandolim, que aguardava essa conquista desde 2011, quando foi feito o pedido para o reconhecimento do gênero como patrimônio cultural do Brasil. “É uma iniciativa que beneficia todo o Brasil”, resume o feito. A Casa de Choro do Rio de Janeiro, a Casa do Choro de Santos, juntamente a outros coletivos de choro, também foram responsáveis pelo pedido.

Reco destaca que um bem cultural é um testemunho da tradição artística e histórica desse bem. Reconhecer essa importância demonstra como funciona a dinâmica cultural de um povo. “Então, isso coloca o Clube do Choro em um patamar que ele realmente merece”, acrescenta. O choro é um gênero que existe desde o século 19 e está enraizado na música popular, representando uma síntese cultural da dinâmica de todas as raças que contribuíram e continuam participando da construção do Brasil. Pessoalmente, Reco dedicou sua vida ao choro. Foi Brasília, em 1998, o lugar escolhido para fundar a primeira escola de Choro, a Escola de Choro Raphael Rabello.

Em razão disso, devido ao trabalho da escola e do clube, Reco descreve um momento histórico envolvendo Oscar Niemeyer em 2004. Segundo ele, a TV Senado e a TV Câmara transmitiam os shows do Clube do Choro para todo o Brasil, e na época, Niemeyer viu a programação e entrou em contato com Reco. “Tive a honra de ter um encontro maravilhoso com o doutor Oscar. Ele queria saber a história do choro, como funcionava”, recorda-se. Segundo Reco, Niemeyer até começou a aprender a tocar cavaquinho aos noventa e quatro anos. Assim, o Clube do Choro de Brasília ganhou um projeto arquitetônico elaborado por ele.

Reco ressalta a importância da cultura do Choro de Brasília para todo o Brasil. “A imprensa costumava dizer que Brasília era a capital do rock, mas depois passou a classificá-la como a capital do choro”. Ele  considera incrível como o gênero foi capaz de se desenvolver em uma cidade tão modernista. “Realizamos um festival internacional de choro e pessoas de todo o mundo vieram. Hoje, ficamos muito satisfeitos em ver estrangeiros se dedicando ao choro, e Brasília desempenha um papel muito importante nesse cenário”.

A roda dos chorões

Valerinho Xavier, produtor musical e pandeirista do grupo brasiliense Choro Livre, considera importante preservar o que é mais relevante na história do Brasil, o que é feito por meio da preservação da memória da música. “Esta é a primeira música urbana das Américas e a primeira música brasileira, é de suma importância ter algo que preserve isso para as próximas gerações”, defende.

Uma das características mais marcantes do choro é a Roda de Choro, onde os chorões, os músicos dedicados a esse estilo, reúnem-se para tocar, aprimorar suas habilidades e transmitir o conhecimento para as próximas gerações. É um momento de troca de informações por meio da música, que permite a  continuidade geracional. “Foi assim que aprendi com meu pai e também é como pretendo passar para meu filho”.

Atualmente, Valerinho já percebe que a cultura do choro na capital do Brasil está entre os mais jovens, fruto de muitos anos de trabalho da Escola de Choro e do Clube do Choro de Brasília. “Hoje, por exemplo, você encontra várias rodas de choro em diferentes locais da cidade, e todos os dias há encontros de rodas, a maioria com participação jovem”, conta.

O que vem depois do registro

Para o presidente do Iphan, Leandro Grass, 29 de fevereiro de 2024  se tornou um marco para a música brasileira. “Hoje estamos reunindo todos aqueles que amam nossa cultura e o choro brasileiro para reconhecer esse gênero musical como Patrimônio Cultural Brasileiro. Essa expressão, esse bem cultural carrega a história do Brasil e nos conecta às nossas origens, à força da cultura de matriz africana”, declarou, durante presença na celebração no Clube do Choro.

Grass considera esse registro do choro uma estratégia para promover a base cultural do Brasil, uma forma de “descolonização”, entendendo que nosso país não é europeu. “E esse Brasil é diverso, plural, fundamentalmente africano e indígena”, destacou.

Ele reconhece que as influências culturais europeias também estão presentes, mas, acima de tudo, esse registro é uma iniciativa para olhar para o futuro, com o choro sendo um instrumento de cidadania, informação e educação. A questão agora vai além do resgate histórico, visando também promover a cultura do choro. “Queremos levá-lo para as escolas, para os espaços públicos. Agora, vamos desenvolver um plano de salvaguarda, de forma que a população possa não apenas se conectar mais com esse importante bem cultural, mas também torná-lo ainda mais conhecido”, planeja.

Ele reforça que todo patrimônio, seja ele imaterial, como no caso do choro, ou material, é uma ferramenta de cidadania que pode gerar oportunidades, envolver as pessoas e inspirar projetos de vida. Agora, técnicos do Iphan e detentores culturais desenvolverão políticas públicas e criarão editais para a aquisição de instrumentos e a promoção de rodas de choro em locais públicos.

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